Os principais jornais brasileiros entram na onda de espetacularizar a notícia e anunciam que o ser humano acaba de criar a vida.O Globo é o mais enfático: ‘Criada vida artificial’, diz a manchete do jornal carioca. A Folha de S.Paulo vai na mesma linha e apregoa: ‘Ciência cria primeira célula sintética’. O Estado de S.Paulo, mais comedido, informa que ‘Cientistas anunciam ter criado forma `sintética´ de vida’.
No interior dos jornais, logo após os textos explicativos fornecidos por agências internacionais a partir de artigo publicado na revista Science, alguns especialistas reduzem o impacto das manchetes.
A rigor, segundo especialistas citados pelos jornais, os cientistas financiados pela empresa americana Synthetic Genomics não criaram vida a partir do nada. O que eles fizeram foi mapear rigorosamente o DNA de uma bactéria, guardar essas informações em um computador e depois introduzi-las em uma célula de uma bactéria de outra espécie ‘esvaziada’ de material genético.
Reativada com as informações armazenadas no computador, a bactéria que estava inativa voltou à vida e suas células se reproduziram, replicando as características impressas pelos pesquisadores.
Vida inteligente
Trata-se, segundo alguns especialistas citados pelos jornais, de uma espetacular façanha técnica, mas não de uma revolução científica, como fazem crer as manchetes.
O líder da equipe de pesquisadores é o geneticista americano James Craig Venter, um dos autores do projeto Genoma e também dono da empresa que irá se beneficiar da patente gerada pelo projeto, o que pode contaminar sua avaliação científica.
Mesmo com sua enorme importância para o conhecimento humano, a proeza dos cientistas da Synthetic Genomics ainda não significa, como dão a entender os jornais, a criação sintética de vida – o que remete a certo vício da imprensa.
Seja em relação à ciência, à economia ou à política, os jornais seguem mapeando a história a partir de fatos espetaculosos, como se coubesse à imprensa determinar onde devam se situar os grandes eventos da humanidade.
Talvez seja mesmo mais fácil criar vida sintética nas páginas do jornal do que encontrar vida inteligente no mundo real.