Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O mea-culpa de Warren Buffett

Imagine que o terceiro homem mais rico do mundo conta quanto pagou de imposto de renda, reconhece que esse valor é pouco e pede para que o governo taxe mais os bilionários como ele.

Não, não é ficção científica nem exigência de algum desorientado marxista pós União Soviética. Basta ler no site do jornal The New York Times de segunda-feira (15/8, ver aqui). O homem é Warren Buffett, disse que em 2010 recolheu pouco menos de US$ 7 milhões de imposto de renda e propõe que os assalariados e a classe média paguem menos do que hoje. Quem tiver renda tributável anual acima de US$ 1 milhão contribuiria mais do que atualmente.

Quem lê jornais brasileiros pela internet, teve de clicar e clicar até achar esta notícia. Os sites dos principais veículos brasileiros deram pouco ou nenhum destaque a esta inédita postura. A Folha de S.Paulo e o site G1, da Rede Globo, publicaram o mesmo telegrama da France Presse, que minimiza a denúncia de Buffett sobre a injustiça tributária nos Estados Unidos. O Globo saiu-se um pouco melhor, informando o valor do imposto de renda pago por Buffett em 2010. O Estado S. Paulo nada divulgou.

Perdedores contumazes

Entre mortos e feridos, tem-se a impressão de que nada aconteceu. Simplesmente porque as notícias veiculadas nos sites brasileiros foram publicadas sem contextualização. O artigo de Buffett “Parem de mimar os super-ricos” foi um tapa nos políticos republicanos e um apoio direto ao presidente democrata Barack Obama. Este quer taxar mais os ricos e aliviar um pouco os assalariados. É justamente a proposta do dono de uma fortuna pessoal de US$ 50 bilhões, conforme avaliação da revista norte-americana Forbes.

O mega investidor-especulador revela o que políticos e economistas já sabem: quem investe no setor financeiro paga menos imposto do que quem aplica dinheiro em empresas produtoras de bens e serviços – e muitíssimo menos de quem recebe salário. Fundamental para isso não são apenas os percentuais de taxação, mas também as isenções fiscais dadas. Isso explica como é que o detentor de uma fortuna de US$ 50 bilhões pague apenas quase US$ 7 milhões de IR. Ele demole também o surrado discurso de políticos e economistas favoráveis ao capital, de que alta taxação espanta investimentos. Mas, como agora é Buffett quem coloca o dedo na ferida, talvez mude alguma coisa nos Estados Unidos.

O artigo de Buffett, contextualizando para o Brasil, seria como se Eike Batista tomasse atitude parecida. Afinal, ele é o oitavo homem mais rico do mundo, com patrimônio de US$ 30 bilhões, segundo a Forbes. Independente disso acontecer um dia, os jornalistas deveriam dissecar a filosofia do sistema tributário brasileiro. Talvez descubram grupos de contumazes ganhadores e de tradicionais perdedores, mesmo em tempos de crescimento econômico.

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[Salvador Pane Baruja é jornalista, em Bochum (Alemanha)]