Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O vencedor é… o anonimato!

Ferve o ambiente político mas o caso policial está rigorosamente na estaca zero. Paradas há quase três semanas as investigações em torno do vídeo divulgado pela revista Época com a conversa do assessor da Presidência Waldomiro Diniz com o contraventor Carlinhos Cachoeira.

Os depoimentos marcados para esta semana na Polícia Federal não prometem grandes novidades porque os acusados vão preferir manifestar-se em juízo.

A culpa da paralisia não pode ser atribuída ao governo; para ele, quanto mais rápido o desenlace, menos malefícios provocará. A culpa do governo é outra: olhou na direção errada, atrapalhou-se nas avaliações, perdeu o pé nas providências.

Quem não está interessado em produzir ‘fatos novos’ são os mesmos que acionaram o escândalo – os grandes delinqüentes.

O ‘Waldogate’ está sendo controlado pelo crime organizado desde o início: o vídeo foi divulgado quando interessava divulgá-lo e seus desdobramentos só serão conhecidos quando a rede na qual envolveu-se Waldomiro Diniz julgar conveniente lançar outra bacia de lama no ventilador.

Este é um escândalo comandado por controle remoto, por isso é ingênuo acreditar que envolve apenas dois personagens e um par isolado de episódios de corrupção. Erram as autoridades e erra a imprensa ao circunscrever o ‘Waldogate’ à esfera política, à queda de um superministro e/ou à questão dos bingos.

Às avessas

O crime organizado não é figura de retórica. É organizado mesmo: tem recursos, conexões, opera em rede – amplo sistema de vasos comunicantes entre o lícito e o ilícito, entre a delinqüência política e a delinqüência comum. O narcotráfico, hoje, trafica narcóticos mas também trafica armas, gente, fortunas, idéias e influência. O narcotráfico manipula partidos e derruba governos. E isto, aparentemente, não está preocupando o governo nem a imprensa.

A prova é que a bomba explodiu mas ninguém se mostra interessado em saber quem a detonou. A imprensa vai se movimentar quando alguém lhe entregar o próximo petardo – grampo, fita, vídeo ou dossiê. E o governo vai se mexer quando finalmente capacitar-se de que o problema está na esfera oposta daquela onde opera.

É errada, diversionista e sensacionalista a fixação das atenções no ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. O braço direito (ou esquerdo) do presidente Lula pode até ser castigado como relapso, desatento no tocante aos seus relacionamentos pessoais e políticos. Mas Dirceu não é o problema.

Quando gravaram a conversa do assessor com o contraventor os delinqüentes não estavam interessados em desestabilizar o governo Lula ou queimar um de seus apoios, mas, sim, forçar qualquer governo eleito em 2002 a curvar-se às suas imposições. Apostavam, faziam o seu jogo na sombra.

Por ironia, nesta semana de premiação do Oscar, evidenciou-se que o cerne da maior crise política dos últimos anos está contido num vídeo precário, fora de foco, com banda sonora prejudicada porém de efeito devastador.

Em Hollywood, os prêmios foram para profissionais reconhecidos e renomados. Aqui, o prêmio irá para quem descobrir os torpes profissionais que financiaram, produziram, filmaram e distribuíram a primeira aparição da grande delinqüência em nosso país.

Neste Oscar às avessas a imprensa não dá as cartas. Recebe. [Texto fechado às 22h10 de 1/3/04]