O novo adiamento do programa de compra de jatos militares, denominado FX-2, mostra que o governo do Brasil tem uma parca visão da importância estratégica do país no cenário mundial e da necessidade de defender seu território. Isto é resultante de uma falha no conceito e no exercício da soberania nacional. Por sua vez, a imprensa brasileira tem um baixíssimo nível de reflexão sobre a importância deste processo e está longe de formar uma massa crítica de pressão sobre as esferas do Estado para reverter esse quadro.
Neste país desarmado, perigosamente desprotegido, temos visto nos últimos 30 anos o desmonte da indústria de defesa nacional. Algo muito próximo ao crime de lesa-pátria. Neste período desapareceram empresas de tecnologia nacional como a Tecsat, Tecnasa, Engesa e diversas outras que caminham muito mal das pernas, como a Imbel e a Avibras. E a imprensa, comodamente leiga e sob a viseira da estupidez, tem tratado esses casos de falência e de depauperização do setor apenas como algo para as páginas de economia, sem levar em conta que esse é um segmento industrial de imensos valores agregados em tecnologia de ponta.
Desde os primórdios das civilizações, o homem guerreou para atacar ou para se defender. Isto é história e, pelo visto, algo inerente à condição do homem, esse ser territorialista e de fortíssimos sentimentos de conservação dos espaços ocupados. A propósito, foram esses os maiores estímulos da humanidade desde Roma, passando pela Idade Média europeia, as ocupações no Oriente árabe ou na África fratricida, os sangrentos embates asiáticos até a primeira e segunda grandes guerras. Isto é inconteste.
Carnaval de inconsequentes
Algo também comum a quase todos esses eventos e pela história reconhecida: sempre houve um estandarte, uma bandeira que significasse não só a união de um povo ou de um exército diante de uma situação. Independe de onde ela era fincada ou quem a empunhava: a verdade é que a imprensa brasileira perdeu a empunhadura para sustentar uma bandeira. Desconhece isso desde a deposição do governo Collor, perdeu o valor do que significa erguer e manter uma posição, tal quais as bandeiras e estandartes.
E como imprensa, em seu papel social, fazemos ainda pior. Pois quando não transformamos o esfacelamento da indústria de defesa em simples números, acabamos por saudar o ingresso de empresas estrangeiras no setor com o frenesi dos entreguistas – outro fenômeno recorrente na história dos embates da humanidade.
Nos últimos meses houve uma sacudidela no setor, pequena, mas para um segmento moribundo algo até para se recuperar a esperança. A empresa nacional Mectron se associou à Odebrecht e a parceria Embraer, Atech e Orbisat possibilitou a criação da Embraer Defesa e Segurança. Entretanto, a Avibras passa por uma terrível crise econômica justamente por ter como seu parceiro o BNDES. Um processo de estrangulamento burocrático difícil de a empresa superar e manter-se no mercado.
Enquanto isto, o sucateamento das forças armadas nacionais já vagou desorientado por gabinetes de políticos, por falastrões de intenção duvidosa, pela chacota, e despencou no penhasco da insegurança. Basta dizer que os narcotraficantes possuem hoje armamentos leves mais novos e eficientes que os das forças armadas.
Os recursos naturais do Brasil, particularmente a água, já ultrapassaram a barreira do discurso ambiental. Com a escassez hídrica no horizonte dos cenários criados pelo aquecimento global, é mais que necessário uma tomada de atitude por parte dos governos e da imprensa. Soma-se a isso o alto risco sobre as reservas de petróleo, que alimentam o vício econômico de todo capitalismo industrial praticado no mundo. E que a cada pingo extraído no Brasil é motivo de alarde e festejos, como um carnaval de inconsequentes, tendo a imprensa como mestre-sala.
******
Jornalista, pós-graduado em jornalismo científico