Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Para conhecer o leitor do OI

Artigo publicado na edição nº 413 do Observatório da Imprensa me fez decidir escrever um texto que já tinha na cabeça, mas que ainda não tinha certeza da necessidade de escrevê-lo. Refiro-me ao artigo ‘Mídia Geni faz mea-culpa onde não deve‘, de Silvia Chiabai, que se apresenta como jornalista, pesquisadora do CNPq, professora da Ufes e integrante da Rede Nacional de Observatórios da Imprensa.

O texto de Chiabai incorre no mesmo tipo de mentalidade elitista e arrogante que colocou o Brasil na situação política ridícula em que está, em que sua imprensa teima em desqualificar toda uma sociedade que votou contra o que essa mesma imprensa pregou por mais de um ano e meio. E isso porque a articulista começa atacando o leitorado do OI ao afirmar que…

‘A fúria da malhação generalizada, desencadeada pelo suposto complô (que poderia ser mera afinidade ideológica) da mídia contra Lula nas eleições, encontrou no jornalista Alberto Dines seu réu preferencial quando este alertou para a demonização dos meios de comunicação privados. Na realidade, os internautas viveram a euforia de supor que influíram nos resultados da eleição, ao reverberarem entre si a notícia do tal complô’.

O trecho acima é de uma arrogância digna de nota. ‘Os internautas viveram a euforia de supor que influíram nos resultados da eleição’?! Como, ‘supor’?! Será que a autora não está informada de que universidades, sociólogos, historiadores e até muitos jornalistas estão se debruçando sobre o peso inédito – e, até então, desconhecido – que a internet teve na última eleição? E, malhação de Alberto Dines? Bem, de fato houve críticas. Muitas. Algumas até desrespeitosas, mas a reação do observador não ficou muito aquém e tratou de acirrar a desavença. ‘Petistas’, ‘membros da Ku-Klux-Klan’ e ‘nazistas’ foram alguns dos mimos com que os críticos da postura de Dines foram brindados. Inclusive os críticos respeitosos, que meramente divergiram de sua opinião.

Manipulação do noticiário 

Deixando de lado a postura olímpica do artigo que ora comento, quero explicar por que escrevi este. Escrevi por conta de informação contida no artigo da professora Chiabai e que foi de encontro a texto que eu pretendia escrever. A professora informa que o Observatório da Imprensa está promovendo uma pesquisa, ‘ainda embrionária’, que pretende conhecer ‘o perfil do leitor que comenta’ os artigos que o veículo publica. Segundo Chiabai, há ‘hipóteses’ de o Observatório ‘ter atraído um público muito diversificado, fora e além do circuito de estudantes de Jornalismo e jornalistas, principalmente advogados, escritores e professores’.

Não há ‘hipóteses’, há fatos. O Observatório, há muito, deixou de atrair apenas ‘estudantes de jornalismo e jornalistas’. E, além de ‘advogados, escritores e professores’, tem recebido grande afluência de profissionais de todas as áreas. No que tange o leitorado que se manifesta majoritariamente no OI de forma crítica à postura de seu principal observador, Alberto Dines, e que ultrapassou, em número de integrantes, a casa das quatro centenas de críticos de um único artigo do mesmo Dines, impressiona que o Observatório precise fazer pesquisa para conhecê-lo. [Nota do OI: O Observatório não está produzindo pesquisa alguma nesse sentido. A professora Silvia Chiabai postou o seguinte comentário (27/12/2006, às 19h16) ao texto objeto do presente artigo: ‘A pesquisa em questão não foi iniciativa deste Observatório; o fenômeno da participação da internet nos eventos políticos, de intervenção midiática , é mundial e objeto de estudo em várias universidades. Não há, portanto, motivo para alarme, e o autor da pesquisa aceitará de bom grado contribuições de qq natureza. Afinal, o cientista é quem deve manter-se lúcido.’]

Esse leitorado é composto por centenas e centenas (talvez até milhares) de leitores de ‘Vejas’, ‘Folhas’, ‘Estadões’, ‘Globos’ e de telespectadores da Globo, do SBT, da Bandeirantes e de ouvintes da CBN etc., inconformados com a manipulação do noticiário político e do estupro ideológico que a mídia vem praticando desde sempre no Brasil.

Poder descomunal

Há uma demanda reprimida por imprensa plural e equilibrada. Com o advento da internet e sua popularização, explodiram a fama de um espaço em que seria possível fazer críticas à mídia que a mídia nunca permitiu, e as notícias sobre a possibilidade de essas críticas poderem ser conhecidas por um grande número de pessoas. Isso foi o que atraiu gente de todas as camadas sociais, de todas as profissões, de todas as idades para manifestarem o inconformismo gerado pela censura a críticas a si que a mídia sempre praticou.

Ninguém satisfeito com a mídia vem a um Observatório da Imprensa. Ninguém que não se preocupe que um poder como o da mídia seja exercido de forma discricionária e sem qualquer controle ou limite viria a um Observatório da Imprensa. Quem vem ao OI o faz em busca de espaço para saber e dizer tudo o que a mídia não permite, por isso fica inconformado quando chega ao Observatório e depara com defesa de um poder que tem a quase exclusividade dos meios de expor massivamente pontos de vista.

Quero concluir manifestando minha preocupação com uma hipótese levantada pela professora Chiabai. Refiro-me à possibilidade de que o OI tenha sido criado fundamentalmente para ‘estudantes de jornalismo e jornalistas’, o que tornaria um mero acidente a importância que o espaço adquiriu através dos anos. Tomara que a criação do OI, diferentemente do que disse Chiabai, tenha objetivado permitir a toda a sociedade manifestar-se sobre o poder descomunal da mídia, um poder que esta vem exercendo de forma cada vez mais discricionária, e que, por isso, precisa ser combatido por todo democrata deste país. [Ver aqui os Objetivos deste Observatório, e aqui a página onde estão disponíveis todas as edições, desde abril de 1996.]

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Comerciante, São Paulo, SP