Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Passadismos do jornal do futuro

O Estado de S.Paulo fez uma reforma gráfica e editorial há menos de três meses e agora o jornalão parece velho. No domingo (23/5) foi a vez da Folha: mudou o visual, chamou novos colunistas, trocou cadernos, badalou e até adotou um heterônimo – jornal do futuro. Sinceras congratulações!


No meio de tantas novidades e trepidações, o texto mais forte, mais inquietante, provocador e, por isso, mais corajoso está numa coluna antiga, a do ombudsman, agora ocupada por Suzana Singer.


Já na primeira linha, a ouvidora, revela de forma clara e inequívoca a preocupação dos leitores com a renovação do time de colunistas, a indignação causada pela ‘execução sumária’ do economista Paulo Nogueira Batista Jr. e o repúdio à manutenção do senador José Sarney no quadro de colaboradores do jornal. É o que se espera da defensora do leitor e representante do interesse público.


O título da coluna é antológico: ‘Algumas coisas mudam; outras não’. Antológica e também surpreendente é a justificativa da Secretaria da Redação para manter o senador: ‘Interromper os seus artigos durante o tiroteio político mais intenso que sofria em 2009 poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços que Sarney tinha para expressar-se livremente’.


Pelo avesso


Lógica espantosa na estréia do jornal do futuro. Se for válida será preciso arrumar espaços para que José Roberto Arruda ou Tuma Jr. se defendam livremente. Eles também estão sob tiroteio intenso e até agora o jornal não lhes ofereceu coluna alguma.


Acusados defendem-se por meio de reportagens ou em tribunais. Oferecer-lhes colunas permanentes é uma aberração arcaica. Cumplicidade.


Há evidentemente outros bons textos na edição inaugural da nova fase da Folha, mas é preciso não esquecer que um dos ingredientes mais importantes do jornal do futuro é o metajornalismo, o noticiário questionado, a cobertura virada pelo avesso, cética.


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Nota da Folha de S.Paulo


Marcos Strecker, Editor de Mídias Sociais (25/5/2010, às 14h30)


Caro Dines,


Queríamos apontar uma imprecisão em na sua coluna ‘Passadismos do jornal do futuro’, no Observatório da Imprensa de hoje.


Nela, você afirma: ‘Antológica e também surpreendente é a justificativa da Secretaria da Redação para manter o senador: `Interromper os seus artigos durante o tiroteio político mais intenso que sofria em 2009 poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços que Sarney tinha para expressar-se livremente´.’


Ocorre que a Secretaria de Redação nunca fez essa afirmação. Na coluna de 23/5/2010 da ombudsman, Suzana Singer, ela mesma faz essa afirmação (‘Interromper seus artigos durante o tiroteio político mais intenso que ele sofria em 2009 poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços que Sarney tinha para expressar-se livremente.’).


A liberdade da ombudsman se expressar está garantida durante seu mandato, é um valor que o jornal preza. Mas é importante separar a afirmação do ombudsman da posição expressa pelo jornal. Como o seu texto acaba atribuindo à Secretaria de Redação a declaração, termina por inferir que o jornal também poderia chamar José Roberto Arruda ou Tuma Jr. Mas a Secretaria de Redação não fez a primeira declaração.


Sabemos que seus leitores prezam o cuidado nos seus textos, será que não cabia a correção?


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Nota do OI (em 25/5, às 19h07): Estão assim redigidos os cinco últimos parágrafos da coluna de 23/5 da ombudsman da Folha, dados em um bloco de oito parágrafos sob o subtítulo ‘José Sarney’, no qual são referidas ‘338 mensagens pedindo seu afastamento do jornal, sem contar as encaminhadas ao `Painel do Leitor´’:




‘A Secretaria de Redação afirma que `José Sarney continua sendo uma pessoa muito influente no Congresso e na política nacional´.


É justo lembrar que o fato de tê-lo como colunista não impediu a Folha de publicar as denúncias contra o senador. O jornal não o poupou.


Interromper seus artigos durante o tiroteio político mais intenso que ele sofria em 2009 poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços que Sarney tinha para expressar-se livremente.


O difícil de entender é por que agora, no jornal do futuro, não se atendeu o apelo dos leitores. Como diz a campanha publicitária, `a Folha podia perfeitamente não mudar, mas aí não seria a Folha´.’


Como a fonte da primeira declaração é a Secretaria de Redação, a formulação do texto que se segue dá a entender ser também da Secretaria a avaliação de que a interrupção dos artigos do senador ‘poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços’ de que ele dispõe para se expressar. (Alberto Dines)