A Folha de S.Paulo pisou fortemente no escorregadio tomate da divulgação de pesquisas, nas edições de 2 e 3 de março – só pode ser ressaca do carnaval. O tema da pesquisa, por assim dizer, era avaliar os danos à imagem do governo devido ao escândalo Waldomiro Diniz.
Os dados vieram de uma ‘pesquisa Datafolha da última segunda-feira (1/3), em que foram ouvidas 2.306 pessoas em 132 cidades do país – mais de duas semanas após o caso Waldomiro ganhar jornais e TVs. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos’. Até aí, tudo bem. Daí para frente, só ‘lenha’, a começar pela manchete ‘Maioria quer afastamento de Dirceu, mas poupa Lula’. Maioria de que, ou de quem? Abrindo o jornal, ficamos sabendo que:
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A maioria, aí sim, de 53% dos entrevistados nunca ouviu falar de Waldomiro Diniz (quem?). Dos restantes 47% – conforme a confusa página A 8, edição da quarta, 3/3 – , 44% já ouviram falar, mas não sabem o que (deve ser o cara que bateu com o carro da Gaviões da Fiel no Sambódromo paulistano…).Continuamos sem entender: são 44% de 47% ou 44% do total de entrevistados? Faz continha daqui e dali, notamos que os percentuais dos que já ouviram falar somam 110%! Impressionante, a soma das partes é maior do que o todo… deve ser a tal da percentagem inflacionada sinergética. Na mesma página, assombra a sinistra e penumbrosa foto de Waldomiro (quem?), o ‘que detonou crise no Planalto’. Ora, se a crise foi detonada, não há mais crise; então, para que fazer pesquisa?
Vovó Maria Conga
Voltando ao assunto, como é que a maioria nunca ouviu falar de Waldomiro (quem?) e mesmo assim o envolve (no sentido penal) ao ministro José Dirceu e, além disso, quer seu afastamento? Mistérios, mistérios… passamos o resto da semana a meditar sobre esta transcendentalidade metafísica, e nada.
E não é que no domingo (7/3/) – oh!, fiat lux! – ficamos todos enfim sabendo. Na coluna do ombudsman, a explicação:
‘Tanto os que afirmaram ter conhecimento prévio do caso quanto os que o desconheciam receberam dos pesquisadores uma descrição objetiva do ocorrido e só depois opinaram a respeito’.
Aaaaaaahhhhh …. assim, até eu.
Faço idéia da ‘descrição objetiva’ do ocorrido. Pode ser assim:
‘O ministro José Dirceu vinha passeando em frente à Casa Civil quando viu o seu Waldomiro, que é o caseiro, achacando um bicheiro numa grana firme. Daí que falou ‘eu me chamo Dirceu, dá cá o meu, que tô na maior pindaíba, num güento esse batedô, tenho que resolver tudo pro Lula, que é um cara legal, mas só pensa em churrasco e futebol – quando não está viajando’.
Ou assim:
‘O despudorado meliante Waldomiro, o pérfido, traiu a confiança do ministro José Dirceu, fazendo-se passar por pessoa idônea, quando, na verdade, tratava-se de indivíduo traiçoeiro que, solerte, subtraiu quantias expressivas de legítimas contribuições de corretores zoológicos para a campanha vitoriosa e para o Fome Zero. Waldomiro, impedido de escafeder-se, foi imediatamente trancafiado, e o ministro José Dirceu foi admoestado e aconselhado pelo presidente Lula a evitar as más companhias, não fazer xixi na cama e nem bater na irmãzinha. Recebeu como penitência três padres-nossos e três ave-marias’.
É isso que é pesquisa de opinião pública?
Bem mais rápido em avaliar o estrago do caso Waldomiro (quem?), o Instituto Gerp fez uma pesquisa com exclusividade para o Jornal do Brasil, nos três dias seguintes à reportagem da revista Época – isso é que velocidade. Os resultados foram ruins para o governo federal, que despencou (hoje eu estou hiperbólico) de 40% para 31% de ‘ótimo+bom’ e aumentou de 19% para 29% os ‘ruim+péssimo’, entre janeiro e fevereiro. O presidente do instituto, Gabriel Pazos, falou e disse: ‘O governo foi para a linha abaixo do regular (sic). Sua curva descendente se acentuou muito e tudo indica que isso se deve ao Caso Waldomiro’. Então, conclui-se que:
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Os cariocas (a pesquisa foi feita com 400 eleitores do Rio), ao contrário de que se pensa, não estão só na praia falando ‘e aí, cara?’ ou fugindo de bala perdida – são extremamente antenados, atentos e sensíveis a todas as notícias do país, diferentemente do resto dos brasileiros. A qualquer escândalo, emitem logo sua opinião e não precisam que nenhum entrevistador conte ‘objetivamente’ o que está acontecendo.**
O carioca está sempre além da notícia, percebe nas entrelinhas toda a perversidade do mundo e logo julga, absolve ou condena.Aproveito o ensejo para comunicar aos leitores deste Observatório que, diante do que está acontecendo, voltou a funcionar o meu Instituto de Pesquisas Vovó Maria Conga. Desde que muito bem remunerados, fazemos pesquisas de públicos com qualquer opinião. Se o distinto público não tiver opinião, a gente arruma logo uma para ele.
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Engenheiro, professor do Departamento de Estatística da Universidade Federal de Juiz de Fora