‘Espero, sinceramente, ter contribuído em alguma medida com o que vem ocorrendo, pela exortação em algumas colunas, na tentativa de mostrar o caminho das pedras: os leitores estão cada vez mais afiados, cada vez mais fazendo a leitura com espírito crítico, ficando mais exigentes. Tanto do ponto de vista mais amplo – como foi o caso do acompanhamento da cobertura eleitoral, comentado em alguns artigos do ombudsman – como em assuntos aparentemente mais triviais, um título equivocado ou em descompasso com o texto, uma ênfase indevida, uma informação omitida ou apontando a contradição entre o que o jornal prega e a sua prática.
Vou abordar alguns casos mais recentes, começando pela ligação que recebi na sexta-feira, a respeito da notícia ‘Show abre festejos dos 18 anos da Tempo FM’ (pág. 2). Vizinho da emissora, no bairro Aldeota, leitor disse que a festa o impediu de ‘ler, assistir televisão ou dormir’ entre as 18h e 23h da quinta-feira. Com a notícia, tomou conhecimento que a rádio faz parte do Grupo de Comunicação O Povo e lembrou-se que o jornal vem fazendo uma série de matérias sobre a poluição sonora, tratando do assunto em reportagens, editoriais e colunas, sempre criticando bares, casas de show e outras fontes de barulho urbano. ‘É uma contradição’, disse ele, ‘o jornal faz campanha pelo silêncio e uma de suas empresas provoca barulho para incomodar vizinhos de um quarteirão inteiro’.
Na mesma edição, sobre ‘Violência chega ao bairro Dunas’ (pág. 10), leitor escreve o seguinte: ‘A matéria foi mal titulada; dá idéia de que o bairro está sendo surpreendido pelos primeiros casos de violência. Garanto que a violência não está ‘chegando’ às Dunas: são vários problemas que já vêm atingindo a região, especialmente o roubo de cabos da iluminação pública. Jornalisticamente, a coisa fica incompleta pela falta de dados estatísticos que mostrariam o aumento da violência. Acho que o título ‘Violência preocupa o bairro Dunas’, ou alguma coisa do gênero, ficaria melhor.’ Ele aponta inconsistência no título, vê as falhas da matéria (falta de dados estatísticos), sugere pauta (roubo de cabos de iluminação pública) e chega ao requinte de oferecer sugestão alternativa de título. No comentário interno à edição do dia, reproduzi o e-mail, anotando que o ombudsman não poderia fazer crítica melhor do que a apresentada pelo leitor.
Morador do Tancredo Neves escreve elogiando a série de matérias que o jornal fez sobre o bairro, mostrando os problemas decorrentes da violência e o esforço dos moradores para superá-los, mas critica a manchete de capa da edição de segunda-feira – ‘Fortaleza tem áreas proibidas para taxistas’, por incluir o local entre as regiões nas quais os motoristas recusam-se a circular, seguindo orientação de suas cooperativas. O leitor reconhece a violência como um dos problemas, mas reclama que o bairro pode ter entrado na lista dos locais proibidos aos taxistas ‘pela fama’, pois, diz ele, a notícia deixou de citar ‘fatos concretos’ de violência contra motoristas de táxi. Ele tem razão. Sem citar as possíveis ocorrências contra motoristas, restam duas suposições, que não ficam esclarecidas: ou as cooperativas alertam os motoristas para não circularem do bairro simplesmente pela sua ‘fama’ de local violento ou pôs o local na lista de proibições depois de verificar casos de violência contra seus associados. Pode parecer a mesma coisa, mas a sutil distinção faz diferença, principalmente para a ‘auto-estima’ dos moradores do bairro, como escreve o leitor.
Onde é?, pergunta leitor, depois de ver a fotografia publicada na seção ‘Fotopovo’ (http://www.opovo.com.br/fotopovo), no portal O Povo Online, na qual aparece um caminhão tombado, com a legenda ‘informando’ que veículo despencou do barranco devido a ‘uma curva perigosa, já conhecida pelos moradores da região e viajantes da BR 222’. Para o leitor, a informação completa seria uma forma de alertar os motoristas que trafegam pela rodovia e não têm a mínima idéia de onde fica o trecho perigoso. (A seção ‘Fotopovo’ divulga imagens produzidas pelos leitores, mas os responsáveis pelo portal têm de se preocupar com a correção das informações publicadas.)
Recordes
Na edição de segunda-feira, a coluna ‘Reportagem’, assinada pelo colunista social Lúcio Brasileiro, publicou a seguinte nota: ‘Não é segredo pra ninguém que abri dois dos melhores vinhos franceses pro Lúcio Alcântara e fí-lo (sic) com prazer. (…) Querem, entretanto, saber mais, se o assunto da Medalha da Abolição foi mencionado no restô Chef Júlio. Não, não foi, eu não falaria com o governador e outros circunstantes (sobre o assunto). Mesmo assim, confesso que levarei pro túmulo, ou melhor, pro crematório, a frustração dessa desdita. Perdi a mais honrosa comenda do Estado e ele a oportunidade de reconhecer único cearense apto ao Livro dos Recordes. Cinqüenta anos de jornalismo diário, fato sem similar em todo o mundo’. (O colunista se gaba de não ter deixado de escrever um único dia nesses 50 anos.) O leitor Gerardo Barbosa Lima Filho escreve para mostrar que há erro na informação. Se o colunista se considera ‘apto’ para entrar no livro, Gerardo Barbosa, também cearense, já está inscrito no Guinness World of Records, como pode ser conferido na página 9 da edição de 2007. Escreve ele: ‘Eu tive reconhecida minha coleção de maior número de diferentes gravações para um música, no caso My Funny Valentine’. Gerardo Barbosa lembra que o assunto foi matéria no O Povo, na edição de 17/8/2006, no caderno Vida e Arte.
Até receber o e-mail, não havia lido a coluna ‘Reportagem’. Ao lê-la vi outro erro, mais grave que o factual, pois este pode ser corrigido. O colunista não tem o direito de constranger o governador do Ceará, de forma extremamente deselegante e desrespeitosa, na tentativa de arrancar-lhe benesses. Coluna não é feudo pessoal, da qual cada colunista pode dispor como quiser. O Povo tem de zelar pela sua credibilidade, portanto, a obrigação de conter tais investidas.’