Por obrigação profissional, tenho que ler muitas notícias por dia. Mas muitas mesmo. Nunca contei, mas acho que são centenas. Obviamente que, para dar conta da quantidade no pouco tempo que tenho para isso, preciso fazer uma leitura dinâmica. Fui adaptando meu método de leitura dinâmica a ponto de conseguir “passar os olhos” em todos os textos e absorver a informação em poucos segundos ou um minuto, dependendo do tamanho de cada um deles. Título, linha fina, lide, sublide e vruuuum… o resto.
Bom, o fato é que leio muuuuuita notícia mesmo, todos os dias, o dia todo. De todas as editorias: política, economia, internacional, cidades, cultura, esporte, ciência, tecnologia, celebridades, bizarrices etc. Tenho que estar por dentro de tudo, até do vídeo mais boçal que viralizou nas redes sociais.
Ontem, parei pra pensar quando foi a última vez que me debrucei sobre uma reportagem e sorvi ela com calma e prazer, como se faz com um café ou com uma cerveja artesanal das boas. Como eu fazia nos tempos de faculdade, em que cheguei a assinar a hoje ilegível revista piauí. Quando foi que li uma reportagem, pela última vez, do primeiro ao último parágrafo, sem precisar fazer isso, mas apenas e tão-somente pelo prazer da leitura daquele texto, pela pauta bem construída, pela apuração bem feita, pelo texto coeso e bem escrito e pela edição caprichada, que já tirou todas as gordurinhas, os adjetivos desnecessários, os artigos excessivos. Sobretudo, quando foi a última vez que falei: putz, que sacada genial dessa história! Que história, que história!
Nada melhor do que ler um bom texto
Forcei a cuca e não consegui lembrar. Não me ocorreu nenhuma reportagem bacana, marcante e prazerosa nos últimos tempos, dentre as centenas que leio, todos os dias, por obrigação. Não estou falando de reportagem genial, prêmio Esso ou Pulitzer, mas uma que contenha todos os ingredientes que listei acima, que seja redonda e tenha uma história sensacional, descoberta por algum repórter sensível e observador.
Em vez de pensar como nossos jornais estão maçantes e como nossos repórteres estão burocráticos, me ocorreu que talvez eu esteja lendo nos lugares errados. Claro, deve haver reportagens incríveis nesse mundão de deus (ou do Google). Eu é que estou fazendo minha ronda nos lugares de sempre. E esses lugares de sempre, que, aliás, dão notícias muito parecidas entre si, têm um olhar muito cansativo sobre o mundo. O olhar é rápido, tem um viés negativista (sobre isso, vale ler aqui) e é feito de forma apressada e descuidada*. Cá pra nós, não há café ou cerveja artesanal que preste se feito em 30 segundos. Como sorver com prazer o resultado dessa gororoba?
Como jornalista – e corresponsável pelo conteúdo noticioso que chega à internet –, só consigo pensar numa coisa: pobres dos leitores! Como leitora, chego a casa à noite, depois de ler/engolir centenas de notícias chatas, em leitura dinâmica, olhos já ressecados e coração colorido, e refugio-me nos livros. Porque nada melhor para descansar a vista e respirar o cérebro do que ler um bom texto.
Adendo
Coloquei o asterisco porque acho que vale explicar melhor para quem não é jornalista: não estou fazendo uma crítica aos profissionais, mas à conjuntura que leva a esse resultado. As Redações estão enxutíssimas (o mais recente passaralho quase fechou o portal Terra), o tempo da era da web é corrido, muitos repórteres precisam apurar cinco, dez matérias por dia. Tenho certeza que o sonho da maioria dos jornalistas é conseguir pensar em uma pauta sensacional e apurá-la da melhor forma possível. Alguns não sabem fazer mesmo por falta de competência (como acontece em qualquer profissão), mas a maioria simplesmente não consegue porque não dá tempo, não há espaço, não há equipe suficiente, os jornais priorizam um tipo de pauta diferente etc. Na verdade, o texto acima é mais uma reflexão que uma crítica. Mas achei que valia o adendo, porque jornalistas já andam apanhando mais do que deveriam nos dias de hoje.
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Cristina Moreno de Castro é jornalista