A indústria do entretenimento perde espaço na TV, nos programas das tardes, para ocorrências policiais e sensacionalismo. Qual a realidade a ser mostrada em programas que iniciaram falando da vida das celebridades e agora só têm espaço para crimes, tragédias, exploração da pobreza e miséria humana? Será mesmo que é dessa forma que acontece? Pois a discussão é longa. E não tem prazo para acabar.
A TV cada vez abre mais espaço para a programação chamada mais popular, mas ao abrir este espaço também passa a receber críticas desfavoráveis, os apresentadores são classificados como exploradores e muitos perdem sua credibilidade, já que os temas muitas vezes são divulgados com redundância, fragmentação do conteúdo e o tempo total da narrativa se torna muito longo.
Apelo fácil e conversa atravessada, apresentadores que se odeiam e críticos que odeiam todos.
Claro que o sucesso no passado de programas como o Aqui Agora (que ‘ensaiou’ uma volta), O Povo Na TV, Cidade Alerta e muitos outros, inspirou os produtores de tantos programas, que passaram a utilizar uma linguagem semelhante em sua grade de programação. Ou seja, tais assuntos, que eram exibidos no final das tardes, por volta das 18h00, passaram a ser apresentados também às três, ou quatro horas da tarde, divulgando notícias de ataques de cães da raça Pit-Bul a crianças e até a seus donos, chacinas em bairros distantes, adolescentes que dão à luz e matam seus bebês, filhos que matam os pais e pais que matam seus filhos, e tantas outras tragédias que possam acontecer.
Celebridades estão na lista
Mas paira ainda uma dúvida: o interesse por esses temas é obra dos produtores e diretores de seus programas, ou o telespectador é quem busca saber do assunto? Parece um pouco com a campanha publicitária de um biscoito: ‘Vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?’
A ocorrência tratada com sensacionalismo e explorada ao extremo faz com que jornalistas, repórteres e apresentadores de TV ganhem notoriedade ou caiam no descrédito.
Fica então uma pergunta: Sobre o que, e de que maneira informar?
É claro que existem excessos na televisão. Passamos por um referendo sobre o desarmamento, faz ainda pouco tempo, pessoas em defesa, outras contrárias, mas o fato é que, em uma novela na Rede Globo (Duas Caras), houve uma invasão em uma favela e todos os moradores de lá saíam de suas casas com armas em punho. Na mesma novela, um bando de fanáticos destruía a casa em que três personagens viviam um suposto triângulo amoroso, cenas de violência gratuitas na TV.
Entretenimento ou ocorrência policial?
As celebridades não estão de fora dessa lista, pois basta se envolverem em alguma ocorrência, escândalo, ou problema de saúde para serem o alvo de qualquer que seja o programa.
Oratória de repetição
As mães e familiares dos jogadores de futebol que passaram por seqüestro e viraram notícias, os atores que se envolveram com travestis no Rio de Janeiro, a cirurgia de uma atriz, a luta contra o câncer, o assassinato do guitarrista de uma banda, o tráfico no morro envolvendo artistas. Fatos que chamam a atenção da mídia e ganham ainda em proporção, pois misturam famosos, tragédias e ou escândalos.
Na tentativa de furo de reportagem, de sair na frente, programas brigam pela audiência e decidem jogar imagens, muitas vezes de mentiras do dia-a-dia, nem sempre com a real clareza dos fatos. Produções que brigam entre si, roubam a pauta umas das outras, inventam suas ‘verdades’.
Noticiar, não deve ser apenas falar dos fatos sem apurá-los, pois assim é irresponsabilidade, e não é informação. Tratar qualquer assunto com apelo demasiado, desconsiderando regras, só pensando em vender a notícia, valorizar um pequeno caso, transformando os envolvidos em desgraçados.
Existem muitas maneiras de transmitir uma mesma notícia, dependendo do formato do programa.
Os programas populares mostram a realidade crua, sem maquiagens, sem precisar se esconder atrás da máscara da hipocrisia. Claro que isso muitas vezes não acontece, mas a verdade deve ser levada em consideração – fingir, mentir e iludir são truques facilmente usados. Basta chamar para que a câmera feche no rosto do apresentador, que muitas vezes insta os que assistem a uma revolta e conduz e distorce os fatos, usando de uma oratória de repetição e até sem concordância, pois existem aqueles que usam de improviso, sem dominar totalmente a linguagem e acabam por dizer absurdos.
A ‘festa dos desajeitados’
Vítimas do buraco do metrô, acidente da TAM, João Hélio, caso Isabella, massacres, chacinas, adolescentes torturados até a morte, mãe que joga seu bebê embrulhado em saco plástico na lagoa, erro médico, filha que planejou a morte dos pais, briga de torcidas, balas perdidas, Eloá…
E o povo brasileiro não tem a capacidade intelectual de entender matérias mais elaboradas?
Este é o pensamento de muitos que contribuem para uma programação desajeitada, com ranço de um jornalismo apelativo e sem qualidade.
Tantas são as notícias, as ocorrências que se tornam entretenimento e dão ênfase aos limites que envolvem o jornalismo sensacionalista para a televisão, por meio dos fatos noticiados e como eles são tratados; a ordem interna da narrativa, além das questões referentes às transmissões ao vivo, e aos recursos retóricos ou técnicos que procuram tornar esse telejornalismo mais atraente para o público, mas que acabam contribuindo para que a informação perca a qualidade.
Não são somente os ‘programas da tarde’ e de ‘entretenimento’ que tratam das ocorrências policiais e demagogias. Parece que a televisão fez disso o seu caminho e convida apenas para a ‘festa dos desajeitados’ estes mais criticados, pois é bom lembrar que com ou sem padrão, o ‘Homer Simpson’ está em sua poltrona com o controle remoto nas mãos pronto para desejar boa-noite e tomar a sua cerveja.
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Jornalista, São Paulo, SP