A Folha de S.Paulo completou 90 anos no sábado (19/2) e ofereceu um magnífico presente à sociedade brasileira: a disponibilização integral do seu conteúdo desde 20 de fevereiro de 1921. São 1,8 milhão de páginas totalmente indexadas, permitindo buscas e cruzamentos por assunto, data, nome, localização etc.
Mesmo que a atração deixe de ser universal passando a ser restrita aos assinantes, o ‘rascunho da história’ (como o próprio jornal o designa) é um serviço inédito no segmento dos diários. O semanário Veja já o oferece gratuitamente a qualquer cidadão há dois anos.
A grande mídia brasileira parece assim disposta a reencontrar a sua vocação como agente do interesse público. Por alguns instantes está abandonando a obsessão quase suicida pelo ‘modelo de negócio’ para investir (no caso, cerca de 3 milhões de reais) no reforço da sua imagem como instituição de referência e transparência.
Sem destaque
O país agradece. Dilma Rousseff também agradece, já que o jornal foi a um beija-mão na semana passada, em Brasília, para selar a publicação de um artigo assinado pela presidente em homenagem à efeméride.
Algo não funcionou ou funcionou ao revés: a presidente evitou qualquer alusão ao jornal-aniversariante num texto de 13 parágrafos (‘País do conhecimento, potência ambiental’, domingo, 20/2, pág. 3). Menciona aleatoriamente o período de ’90 anos’, o que para o leitor desatento nada significa e para os atentos significa muito – equivale a um puxão de orelhas público. A Folha vingou-se de forma desabrida: publicou o texto da presidente recém-empossada sem qualquer destaque.
Coisas da Folha: o jornal chega à marca quase centenária e se comporta como a eterna criança.
Serviços prestados
Agora com o conteúdo integral na internet, as traquinagens e cosméticas das últimas décadas correm o risco de ser escancaradas na hora. O rascunho da sua própria história bosquejado na edição de sábado (’90 anos em nove atos’, caderno ‘Especial’, pág.10) é desastroso.
Ao justificar a entrega da redação da Folha da Tarde em 1969 a ‘jornalistas entusiasmados com a linha dura militar (vários eram policiais)’, o texto afirma que se tratou de represália da empresa ‘à atuação clandestina na redação de militantes da ALN de Carlos Marighela um dos terroristas mais procurados do país’.
Horror! No dia dos seus 90 anos de gloriosos serviços prestados ao país a empresa admite solenemente que na redação de um de seus jornais – e com o conhecimento da sua direção – desenrolou-se um capítulo da ‘guerra suja’.
O recém-lançado site já tem candidatos a campeões de acessos.