Saturday, 30 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Receita de jornalismo insosso

Há alguns anos, quando trabalhava como editor-chefe do jornal A Hora, em São Luís (MA), escrevi um editorial dizendo que no Maranhão havia três tipos de imprensa: a oficial, a não-oficial e a insossa. O último termo referia-se ao jornalismo água com açúcar, que não fede nem cheira. Enfim: que não tem identidade. Nessa época, atual senadora Roseana Sarney era governadora.

O tempo passou e Roseana já não governa o estado. Mas o quadro do jornalismo maranhense, com raríssimas exceções, permanece o mesmo. Apenas se inverteram os papéis: quem era alternativo virou oficial (melhor dizer: panfleto governista); quem era oficial virou alternativo (melhor dizer: oposição); e quem era insosso? Continua insosso.

Mas por que toda essa volta ao passado? Porque o comportamento de boa parte da imprensa em relação ao processo que pede a cassação do atual governador Jackson Lago é um atentado contra a inteligência. De um lado e de outro se manipulam informações e se distorce a realidade, num jogo de interesses marcado pela dissimulação, que serve mais para confundir do que esclarecer o leitor.

Do lado da mídia oposicionista, tenta-se condenar o governador antecipadamente, antes mesmo do pronunciamento final da Justiça. E o que é pior: tudo é feito de forma descontextualizada, como se aqueles que agora clamam por justiça não tivessem um passado de corrupção quando dominavam o estado. Simplesmente tentam apagar da memória 40 anos de desmando e atraso, transformando o julgamento em espetáculo.

Jornalismo empobrecido

Já a imprensa oficial trata o problema de forma maniqueísta, ressuscitando a velha dicotomia do Bem contra o Mal. Para o jornalismo de gabinete, o inferno são os outros. O mal está sempre do outro lado. Noutras palavras: os outros é que são corruptos, golpistas; os outros é que querem voltar ao poder de forma espúria; os outros é que não admitem perder.

Assim, na ânsia de querer justificar o que parece injustificável, adota-se um discurso messiânico. Poucos se atêm aos aspectos técnicos do processo. Afinal, houve ou não abuso de poder econômico por parte do governo? Houve ou não uso eleitoral de convênios, como alega o procurador Francisco Xavier Pinheiro Filho? Discutir isso, pelo visto, não interessa. Comparo essa atitude com a de um paciente que tem um membro gangrenado, mas não aceita amputá-lo. No fundo, ninguém admite cortar a própria carne, ainda que ela esteja podre.

Mas é bom não esquecer: quando surgiram as primeiras denúncias de corrupção contra o PT e seus líderes, no caso do mensalão e outras lambanças, muita gente dizia que aquilo era coisa da direita golpista etc. e tal. Até que a situação chegou a um ponto em que o próprio presidente teve de admitir publicamente que houve erros, inclusive chamando alguns ex-companheiros de ‘aloprados’. Não estou querendo dizer que o caso do Maranhão é o mesmo. Mas é preciso ater-se aos fatos e deixar de lado a cantilena ideológica.

Rebaixar essa discussão ao nível das conversas de botequim empobrece o jornalismo e depõe contra os profissionais da área. Distorcer os fatos pode até servir de consolo para quem não quer ver a realidade. Mas em nada ajuda a compreensão do que está acontecendo. Nem a absolver o governador.

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Professor e jornalista, Chapadinha, MA