Em artigo publicado neste Observatório [‘Folha adota padrão Veja de jornalismo‘], no qual demonstra como a Folha de S.Paulo agiu de má-fé na ‘reportagem’ sobre a distribuição de propaganda oficial entre o grupo Bandeirantes e a Gamecorp, que tem como sócio um dos filhos do presidente da República, lemos na última linha ‘O leitor pode apostar: amanhã tem mais’.
Li, gostei, esperei e, hoje, 30 de novembro, teve mais. Ao abrir a Folha me deparo com a seguinte manchete na página A4: ‘Com doações ocultas, PT repassa R$ 18,5 mi a Lula’, e uma manchete secundária, em letra menor: ‘PSDB adota prática idêntica e transfere R$ 7,4 mi à campanha de Alckmin’.
Ao iniciar o texto lemos: ‘Com uma dívida acumulada de R$ 40 milhões na praça, o PT nacional transferiu R$ 16,2 milhões diretamente à campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O valor representa 17,1% do montante arrecadado (R$ 94,43 milhões). O PSDB adotou prática idêntica, mas em menor proporção: o diretório nacional transferiu para a campanha de Geraldo Alckmin R$ 4,2 milhões, que arrecadou R$ 62,02 milhões.
Perguntar não condena: se a prática do PSDB é idêntica à do PT, por que o destaque maior na manchete foi dado ao PT? Será que é porque o valor repassado pelo Partido dos Trabalhadores à campanha de Lula foi maior que o repassado pelo PSDB à campanha de Alckmin?
Mais respeito
Se o critério foi a quantidade de recursos, não considero 4,2 milhões valor pouco significativo. Sugiro que, em caso semelhante, a Folha produza a seguinte manchete: ‘PT e PSDB repassam doações ocultas às suas respectivas campanhas presidenciais’
Continuando a reportagem, lemos que a prática é legal e as fontes dos recursos serão conhecidas em abril do próximo ano. Ora, ora, a manchete certamente não me fez pensar que os recursos eram legais, e sim fruto de caixa 2. Se não tivesse lido toda a reportagem ficaria com esta impressão. Podemos então sugerir uma manchete mais adequada ao texto: ‘PSDB e PT repassam recursos a suas respectivas campanhas e os doadores só serão conhecidos em abril’.
Editores da Folha, sabendo que um jornal vive de sua credibilidade, é preciso mais respeito aos leitores. Estamos de olho. O editor pode apostar: amanhã tem mais.
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Antropólogo, 24 anos, Brasília