FONTE
Moreno entrega ministro Nelson Jobim, 20/9
‘O jornalista Jorge Bastos Moreno entrega: ‘Nelson Jobim foi uma das minhas melhores fontes’
Viceja neste final de semana um movimento de jornalistas que já tiveram como fonte o ministro da Defesa, Nelson Jobim. Ensaiam produzir um memorial que conteria tudo que já receberam da fonte Jobim. Nessas conversas, há quem se recorde, inclusive, da terceira fornada dos grampos do BNDES. Sem esquecer os bastidores da Constituinte de 1988, essa mesma que ele reescreveu ao final, secretamente, ao seu bel-prazer.
Ainda sem realizar uma reunião para definir as suas diretrizes, o movimento já conta com a liderança (sem que nem ele mesmo saiba) do jornalista Jorge Bastos Moreno – o graaaaaaaaaaaaaaaaande Moreno, craque da crônica política.
Em sua coluna no jornal O Globo, Moreno revelou desapontamento com as declarações de Jobim em recente aparição no Congresso.
Em depoimento à CPI dos Grampos, Jobim defendeu mudanças na legislação para punir vazadores de grampos telefônicos e jornalistas que os publiquem. Na doutrinação jurídica aos congressistas, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) defendeu ainda que, em alguns casos, os repórteres devem revelar suas fontes.
– Os senhores terão que prestar atenção não só no interceptador ilícito, mas também no vazador de informações. Se os senhores não fecharem as duas pontas, vai continuar a acontecer o que está acontecendo – vaticinou o ministro.
Diante de profunda análise do nosso ordenamento jurídico, Moreno teve que entregar Jobim: este foi uma das suas melhores fontes em Brasília. Preocupado com a estabilidade da República, o jornalista pede uma trégua:
– …Ministro, é bom parar por aí! Se a lei me obrigar a revelar, retroativamente, minhas fontes, nós dois cairemos.
Terra Magazine sente-se no dever de publicar a íntegra da nota de Jorge Bastos Moreno, na coluna ‘Nhenhenhém’, no jornal O Globo deste 20 de setembro.
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‘Caro Jobim, foi bom para você também?’
‘Desde o tempo dos seus banhos noturnos no Xingu que o Jobim das Selvas vem matando a cobra. Agora virou a própria cobra e passou a dar paulada na mídia.
Na semana passada, Jobim faltou ao trabalho por causa de uma alergia provocada por uma indisposição gástrica.
Agora, descobre-se que o ministro está com alergia à democracia. Sua proposta de obrigar o repórter a revelar a fonte só pode ser fruto de uma idiossincrasia, e, como tal, requer um tratamento extremo: uma traqueostomia, para que ele volte a respirar os ares do seu belo passado constitucionalista.
Jobim quer medir a mídia com a sua própria régua: guardou durante anos, como fonte de si mesmo, os segredos de ter adulterado votações da Constituinte e, recentemente, traído pela vaidade, acabou entregando a própria fonte, só pelo prazer de exibir os poderes que tinha na época.
Conheço profissionalmente Jobim há mais de 20 anos, antes mesmo de a Adrianne começar a mandar nele, e sou testemunha da sua retidão. Ele foi uma das minhas melhores fontes.
Portanto, ministro, é bom parar por aí! Se a lei me obrigar a revelar, retroativamente, minhas fontes, nós dois cairemos.
O senhor, por tudo o que já me disse. E eu, por ter publicado no jornal. O pacto sempre foi bom para nós dois.’’
LITERATURA
Machado de Assis: um século depois, 22/9
‘Uma obra literária que resiste ao tempo é um clássico. E é certamente o caso da prosa de Machado de Assis, sobretudo depois de 1880, quando ele publicou Memórias póstumas de Brás Cubas. Os outros quatro romances e dezenas de contos que publicou até 1908 são antológicos.
Poucos autores brasileiros foram tão estudados, analisados e lidos como o Bruxo do Cosme Velho. Um dos raros erros de Mário de Andrade foi criticar com aspereza a prosa machadiana, talvez por esta obra não se encaixar no projeto modernista da Semana de 22. De fato, há uma distância considerável – no tom, no estilo, nos temas, na maneira de representar e problematizar o Brasil – entre Macunaíma e Memórias póstumas de Brás Cubas.
Machado não se enquadrava no projeto estético de Mário, mas isso não apaga nem atenua a importância desses dois romances seminais da nossa literatura. A extraordinária produção analítica sobre os romances, contos, crônicas e teatro de Machado, além dos livros sobre a vida e a obra do autor, é uma prova de que a leitura crítica da obra machadiana está longe de ser esgotada. Mas há uma outra leitura, anônima e não menos poderosa que faz de Machado um clássico de todos os tempos. Refiro-me aos leitores que gostam de literatura e que preferem ler Machado sem a mediação de textos críticos. Digo isso porque a leitura crítica, sem a adesão ou amparo do leitor comum, pode ser auto-referente. Ou seja, pode circular apenas nos departamentos acadêmicos, sem encontrar eco e respaldo na comunidade de leitores apaixonadas pela literatura.
Hoje em dia, Machado é lido por jovens de todos os quadrantes e classes sociais, é uma espécie de autor nacional que conquistou leitores com grau variado de sofisticação e repertório cultural. Eu diria que conquistou bons leitores, pois quem lê com atenção e fervor um romance ou conto machadiano talvez não leia, por exemplo, um livro de auto-ajuda.
Como ocorre com todos os clássicos, a obra de Machado é um emplastro poderoso para desintoxicar o leitor viciado em palavras fáceis e fúteis, em receitas de bem viver, em fórmulas de sucesso, em relatos sobre um cachorro amado, ou essa ou aquela celebridade. Todas as efemérides em torno do centenário da morte de Machado são válidas. E se você, leitor, ainda não leu contos como O espelho, Teoria do medalão, A causa secreta, Missa do galo, Pai contra mãe, Um homem célebre, Singular ocorrência e tantos outros, é um homem ou mulher de sorte.
Bem-aventurados os que ainda não conhecem o Machado contista, pois nas narrativas breves do Bruxo vão encontrar os temas dos grandes romances: a loucura, o adultério, o jogo de sedução e poder, os carreiristas e alpinistas sociais, e a combinação de falta de escrúpulos e crueldade nas atitudes de determinada elite brasileira do século XIX. Um século depois da morte de Machado, alguns desses temas perduram, porque fazem parte constitutiva da natureza humana. Quanto à crueldade de uma elite que cultiva privilégios… Até nisso Machado acertou em cheio, e com um pessimismo e uma ironia que nos deixam sem fôlego.’
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