Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Tuitando a imprensa para fora do jogo

Durante a última crise política latino-americana, que teve como cenário o Equador, a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, decidiu utilizar seu Twitter para contar ao mundo o que estava acontecendo com o colega Rafael Correa. Em 30 de setembro passado, dia em que o presidente equatoriano enfrentou uma rebelião policial que, segundo seu governo, foi uma tentativa de golpe de Estado, a presidente argentina escreveu mais de dez mensagens no microblog sobre o conflito. ‘Estou na Casa Rosada, 21.10hs. Rafael Correa está no telefone’, escreveu Cristina naquele dia. Minutos depois, a presidente argentina continuou seu relato: ‘Comovido (Correa) me comentou que franco-atiradores dispararam contra seu automóvel. Tem cinco impactos de bala’.

Cristina entrou para o ‘mundo do Twitter’ quatro meses depois do lançamento da página do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, outro fanático dessa nova ferramenta de comunicação virtual. Ambos os presidentes escrevem mensagens quase todos os dias e utilizam o Twitter como um meio de contato direto com seus seguidores e, também, com seus adversários políticos.

Para dois chefes de Estado – mergulhados numa verdadeira guerra com a imprensa privada de seus países – que costumam evitar o contato com jornalistas, o Twitter representa uma solução ideal para anular a participação dos meios de comunicação como intermediários entre seus governos e o povo. Os presidentes do Chile, Sebastián Piñera, e do México, Felipe Calderón, têm menos conflitos com os jornalistas, mas também aderiram à nova moda comunicacional.

‘Via escapatória’

Nas últimas semanas, a presidente argentina atacou através do Twitter a Corte Suprema de Justiça e juízes de seu país, pela decisão de favorecer o Grupo Clarín na disputa sobre a implementação da polêmica Lei de Serviços Audiovisuais. ‘Existe uma Justiça para o monopólio e outra para o resto da sociedade’, opinou Cristina, referindo-se ao Clarín Na visão de jornalistas da região, a presidente tem todo direito de usar a ferramenta para comunicar suas opiniões.

O problema, disseram ao Globo, é o estilo pouco protocolar adotado por Cristina.

– Como líder política, a presidente pode fazer o que quiser para comunicar suas ideias, mas ela deveria respeitar algumas formalidades – opinou Fernando Alonso, secretário de redação do jornal El Cronista.

Segundo ele, ‘um presidente não pode atacar a Justiça como fez Cristina. Usar o Twitter é uma coisa, violar todas as regras de comportamento de um chefe de Estado é outra’.

Para a venezuelana Gloria Bastidas, jornalista do El Nacional, o Twitter permite aos presidentes isolar-se e fugir do ‘incômodo vínculo com os meios de comunicação opositores’.

– Após as eleições legislativas de 26 de setembro passado, Chávez não apareceu na sacada do Palácio Miraflores, como faz sempre, escreveu no Twitter – comentou Gloria.

De fato, naquele dia, o líder bolivariano digitou uma mensagem fria e distante, que não reflete o suposto clima de vitória que seu governo tentou criar. ‘Os resultados do processo eleitoral nos permitiram esclarecer o processo político nacional’, disse Chávez. Minutos depois, o presidente venezuelano assegurou que ‘continuaremos avançando e construindo o socialismo no ritmo e na velocidade que as circunstâncias nos impuserem’.

– O Twitter representa um refúgio para Chávez, uma via escapatória – concluiu a jornalista venezuelana.

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Correspondente de O Globo em Buenos Aires