Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Um pré-histórico passado recente

2001. Apenas 15 anos nos separam dos fatos reais apresentados em Spotlight: segredos revelados. No entanto, parece uma época muito mais distante. Ora, quem ainda lembra do jornalismo como é apresentado no filme vencedor do Oscar deste ano? Em meio a tantas redes sociais, coberturas em tempo real, Buzzfeed, Periscope, compartilhamentos desesperados etc., onde está o espaço para a apuração?

O tempo para se realizar um bom trabalho e a dedicação que a profissão necessita, cada vez mais estão sendo consumidos por uma geração que preza pela instantaneidade, não importando se o que está sendo apresentado é, de fato, um conteúdo de qualidade. Afinal, para que se esforçar em uma matéria se, no final das contas, só a manchete será lida? Falo isso como se os veículos de hoje em dia estivessem dispostos a dar tempo e recursos suficientes para que seus profissionais (cada vez mais escassos) pudessem realizar um trabalho aprofundado. Obviamente, esta é uma realidade de cada vez menos jornalistas.

“A internet está nos matando”, diz um dos personagens de Spotlight. Isso, em 2001. O Boston Globe, jornal em que os personagens do filme trabalham, tinha uma equipe de quatro jornalistas para casos mais aprofundados, a Spotlight. Quatro profissionais que podiam ficar um ano trabalhando em uma matéria. Coincidentemente, esta reportagem ganha um Pulitzer. Alguns anos depois, vira um filme. Este filme ganha um Oscar.

Não, ele não merecia o prêmio. Os outros concorrentes eram melhores. Mais cinema. No entanto, os votantes da Academia deram o prêmio para Spotlight. Por que será? Acredito, em minha modesta opinião, que seja para nos lembrar que uma profissão como o jornalismo não pode ser apenas um “copia e cola” desenfreado. Ela é mais do que isso. Merece mais do que tem agora.

Outro dia, na redação do portal em que trabalho, recebemos um e-mail assinado por um anônimo. Nele, uma pessoa passava informações sobre (adivinhem?) demissões que seriam feitas por um grande grupo de comunicação do Rio Grande do Sul. Quando li aquelas palavras, escritas por uma pessoa misteriosa, me senti no clássico Todos os homens do presidente. Fiquei entusiasmado com aquele momento. Imaginei diversas tramas, redes de intrigas, teorias da conspiração. Poucos momentos depois, diversos sites estavam noticiando aqueles fatos. Aqueles devaneios não duraram uma tarde.

Outro destaque deste “novo jornalismo” é o impresso, que está definhando. Em fevereiro, por exemplo, o britânico Independent anunciou que sairá de circulação e continuará apenas na web. Como li em um artigo recente, um jornal não continua na internet. A última edição impressa dele é o seu fim. A linguagem digital é outra, muito diferente do bom e velho jornal impresso. Blogs, vlogs, tumblrs, snapchats e afins são as ferramentas que substituem a máquina de escrever e as folhas do jornal impresso. Ir a bibliotecas e entrar em porões escuros para procurar informações em livros pesados e empoeirados? É melhor se contentar em assistir a isso em filmes como Spotlight.

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Carlos Redel é jornalista