Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Uma profissão de alto risco

A história do jornalista Mikhail Beketov não é incomum. Em uma série de artigos no jornal independente Khimkinskaya Pravda, ele fez campanha contra a administração do subúrbio de Khimki, em Moscou. Logo passou a receber ameaças. Beketov continuou. Seu carro foi incendiado. Ele insistiu. Chegou em casa e encontrou seu cachorro morto na porta da frente. O jornalista não se deu por vencido, denunciando, com freqüência, autoridades locais por corrupção e abuso. Este mês, Beketov chegou em casa para encontrar uma gangue o esperando do lado de fora. Ele foi brutalmente espancado com porretes e, provavelmente dado como morto pelos agressores, abandonado no jardim. Depois de dois dias inconsciente no chão, uma vizinha acabou vendo a perna do jornalista e chamou a polícia – que, acreditando que ele estava morto, cobriu o corpo com um lençol. Neste momento, Beketov moveu o braço. Levado ao hospital, ele teve uma perna amputada, deve perder os dedos, congelados, e está em coma.

Este relato brutal ilustra os riscos de se trabalhar como jornalista na Rússia. Segundo o Comitê para a Proteção dos Jornalistas, com sede em Nova York, trata-se do terceiro país mais perigoso para ser repórter, atrás apenas do Iraque e da Argélia. Desde 1992, 49 jornalistas foram assassinados. Até hoje, apenas um culpado foi condenado. Investigadores evitam resolver casos deste tipo por temer por sua própria segurança. Na semana passada, quatro homens foram a julgamento pela morte da jornalista investigativa Anna Politkovskaya, executada a tiros em Moscou, há dois anos. Todos são suspeitos de envolvimento no crime; nenhum é acusado de ser o mandante. Não se sabe, até hoje, quem é o mandante.

Tabus

Segundo Nina Ognianova, que coordena um programa do CPJ voltado para Ásia Central e Europa, há uma verdadeira lista de tópicos que são tabus para jornalistas na Rússia. Entre eles está a corrupção no Kremlin e na agência secreta de segurança do país. Fora dos limites também está a região do Cáucaso Norte, que Anna Politkovskaya insistia tanto em abordar, com críticas a abusos dos direitos humanos na Chechênia. ‘Ser jornalista na Rússia é suicídio. É suicídio se você falar sobre a verdade’, resume o jornalista Vladimir Yurov, amigo de Beketov. Editor de um jornal independente, ele já foi atacado três vezes. ‘O promotor não se interessou muito’, conta.

No sofisticado Estado ao estilo autocrático criado pelo ex-presidente e hoje primeiro-ministro Vladimir Putin, o governo controla a mídia. Todas as emissoras de TV estatais e a maioria dos jornais respondem, direta ou indiretamente, ao Kremlin. Quem opta por trabalhar na minguada imprensa independente fica vulnerável e exposto. Segundo Oleg Panfilov, diretor do Centro para Jornalismo em Situações Extremas, em Moscou, nunca houve liberdade de imprensa total no país. Nos últimos anos, entretanto, a situação piorou bastante. Jornalistas são atacados, ameaçados, processados por extremismo e assassinados. Tudo por contar a verdade. Informações de Luke Harding [The Guardian, 24/11/08].