Ao acompanhar o trabalho da mídia brasileira percebo certa tendência que evidencia um momento de entressafra no mercado. Os últimos 10 anos serviram para descobertas na tecnologia que facilitam a transmissão da informação, e seu compartilhamento. Porém, também foram tempos que consolidaram a árdua tarefa de conceituar o jornalismo e seu profissional no século 21.
A falta de limitações que possam definir o que é ser um jornalista nos dias de hoje reforça a ideia de que passamos por um momento entre uma safra e outra. Salvo engano, até meados da década de 90 era menos difícil distinguir o profissional da área de comunicação social. Normalmente eram profissionais que tinham a condição de escrever, ou falar, para um grupo grande de pessoas. Até por ter acesso a informações que a maioria não tinha.
Tal condição propiciava entre os comunicadores a busca pelo “furo”, que nada mais era do que noticiar em primeira mão o que colegas ainda apuravam. Mas, com os anos, o furo se tornou lenda, tendo em vista que hoje qualquer um pode se comunicar em segundos com milhares de seguidores através das redes sociais.
Quanto ao acesso à informação, idem. Pensar em exclusividade da notícia em dias globalizados se assemelha muito com os que ainda procuram por Eldorado – a cidade de ouro. Assim, o paradigma do jornalista rompe, como já aconteceu em outras eras, quando a imagem do comunicador é fundida com a de um boêmio. Contudo, o modelo vigente caiu em desuso sem a substituição por outro. O que define o ser jornalista hoje ainda está em construção. Caso alguém pergunte: Mas, por que a demora em se ter um novo modelo para o jornalismo? A resposta é simples, mas não confortante. A verdade é que não há demora.
Antes vivíamos as quatro estações do ano, os meses, suas semanas e seus dias… Mas, hoje, construímos nossas vidas, e profissões, nos segundos e milésimos. Na era touch, basta um clique e sua informação já está disponível para qualquer parte do globo.
Adolescentes ganham celulares cada vez mais sofisticados e com eles a capacidade de registrar imagens, sons e dados que podem ser viralizados em instantes. Aliás, viralizar não trata mais de questões ligadas apenas à saúde. Os tempos são outros e o significados das palavras também. Por consequência, alguns desses adolescentes seguem para uma faculdade de comunicação ávidos por descobrir novas técnicas, formatos e….modelos. Adivinhe, qual a surpresa?
Cavernas
Não demora muito para esses mesmos alunos percebam que atualmente o novo está do lado de fora. Enquanto muitas universidades se especializaram em mais do mesmo, a vida pulsante da notícia segue sem precisar de compreensão, ou mesmo aceitação. A crise por responder a perguntas como “Quem eu sou? Para onde vamos?” sai da antropologia para fazer parte do dia a dia do homem moderno. Até Platão, se estivesse atuante nos dias de hoje, perceberia que vivemos em outros tipos de cavernas.
O filósofo oferece em seu trabalho “Alegoria da Caverna” a discussão sobre teoria do conhecimento, linguagem e educação na formação do Estado ideal, e mostra um lugar fechado, limitado, e que por isso aprisiona o ser humano. Mas, agora, é justamente pelo fato de a caverna estar cheia de possibilidades e perspectivas que o homem se torna refém da dinâmica do ambiente e condena sua identidade profissional a um divã.
A visão apocalíptica no jornalismo pode não ser (e nem deve) aceita pela maioria, mas o choque de gerações entre os profissionais se reflete nas publicações da imprensa brasileira. São jovens que como tais buscam referências, mas anseiam por novas fontes e impõem novos meios de interação. Porém, alguns dos tidos como tradicionais sequer percebem a tensão. O lead de ontem é o twitter de hoje, e quem não sabe informar em 140 caracteres, por exemplo, já perdeu audiência. E isso é só um exemplo.
Os tempos são outros e, em dias de Uber, há quem ainda vá de taxi. Se antes a preocupação era informar, hoje também é entreter. Quanto a isso, não precisa concordar, basta ver que programas de TV em canal aberto têm às vezes a mesma audiência que um jovem que se intitula produtor de conteúdo e grava vídeos em meio à bagunça de seu quarto – são os youtubers.
Todavia, é uma questão de tempo. Em mais ou menos dias o profissional de hoje conseguirá dizer com precisão o que caracteriza e limita seu ofício, e conseguirá se adaptar às novas possibilidades que sua própria geração criou. Se antes um jornalista era reconhecido por ter um MTB, hoje se pergunta: quem não tem? Precisamos de novas respostas, e logo esse período de entressafra finda.
Há poucos dias li o artigo “A profissão na era do “design thinking” aqui no Observatório da Imprensa (https://www.observatoriodaimprensa.com.br/diretorio-academico/a-profissao-na-era-do-design-thinking/) e fui surpreendido com o que considero uma luz no fim do túnel. O texto revela a proposta de uma nova maneira de pensar e avaliar a informação. Além dos dados, as formas, a concepção e a estética dão as cartas.
O termo “design thinking”, que na falta de uma definição de consenso na língua portuguesa faz uso da expressão inglesa, é um conceito novo que procura pensar soluções considerando as redes sociais e levando em conta o contexto atual, passado e futuro do tema em estudo. Longe de afirmar ser um destino, essa maneira de pensar informação pode ser um novo caminho, ou uma nova maneira de se caminhar na caverna de plataformas e possibilidades do século 21.
* Leonardo Rodrigues é jornalista e chargista