Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nativos digitais no rumo da informação móvel

selo_rev_jorn_espmO que a TV foi para a geração baby boom (quem nasceu de 1945 a 1964), as mídias sociais são para a geração millennial (os nascidos entre 1981 e 1996). Ou seja: os jovens atuais consomem notícias majoritariamente por meio de Facebook e Twitter, enquanto seus pais e avós o fizeram via televisão.

Essa é a conclusão mais contundente da mais recente pesquisa conduzida pelo Pew Research Center, divulgada em junho deste ano, a respeito de como os millennials se informam sobre assuntos políticos além de fontes interpessoais (familiares e amigos).

O estudo foi feito nos Estados Unidos. Mas pode-se aceitá-lo ao menos como tendência para o Brasil, onde, conforme várias outras pesquisas, os jovens passam mais tempo conectados às mídias sociais do que em qualquer outro país.

Quase dois terços (61%) dos americanos entre 18 e 33 anos em 2014 (quando a pesquisa foi feita) disseram que sua fonte principal sobre temas de política e governo são Twitter e Facebook.

Já 61% dos americanos entre 50 e 69 anos disseram que a TV era onde eles preferencialmente buscavam esse tipo de notícia.

As duas mídias sociais são usadas de modo ligeiramente distinto, embora ambas tenham penetração quase idêntica entre os jovens (63% dizem usar as duas como fonte de informação jornalística).

Pelo Facebook, as pessoas tendem a postar e responder mais sobre os assuntos a respeito dos quais leem; pelo Twitter, elas basicamente seguem os veículos jornalísticos de sua preferência, e se manifestam menos.

O Twitter também é preferido por aqueles que querem acompanhar o desenvolvimento dos fatos conforme vão ocorrendo.

A hegemonia das mídias sociais é ainda mais completa entre os que são “nativos digitais”, ou seja, aqueles que foram alfabetizados a partir da primeira metade da década de 1990, quando a internet se disseminou.

O Datafolha fez uma pesquisa com essas pessoas, entre 16 e 24 anos, para entender como se dá seu relacionamento com os meios de comunicação.

O resultado do estudo mostrou que 78% dos brasileiros nessa faixa etária têm seu próprio smartphone ou acesso a um da família.

Como em outros países, no Brasil as plataformas móveis também são preferidas pelos jovens em comparação com o desktop ou o notebook: apenas 34% dos entrevistados dizem navegar na internet com um PC.

Mas, de acordo com o Datafolha, a porcentagem de nativos digitais que dizem se informar (sobre qualquer assunto público, não apenas sobre governo e política, como procurou saber o Pew) preferencialmente pelas mídias sociais é menor do que entre os millennials nos Estados Unidos: 27% contra 61%.

O trabalho do Pew explorou uma variável não abordada pelo Datafolha: o grau de interesse dos jovens pelo noticiário político. Nos Estados Unidos, os jovens se dizem menos envolvidos com temas de política do que os de demais gerações.

Embora o Datafolha não tenha feito pergunta exatamente sobre isso, pode-se inferir que o perfil do nativo digital brasileiro é similar, já que, segundo a pesquisa, os itens que eles consideram mais importantes em sua vida são saúde, família, trabalho e estudo, seguidos de amigos, sexo e beleza.

Para a atividade jornalística, o que se pode depreender desses estudos é claro: as plataformas móveis são o futuro, os produtos devem ser concebidos para satisfazer quem as utiliza, ideologia não interessa muito ao público.

Pesquisa refuta tese de aumento da polarização

Um aspecto nocivo para a democracia apontado por alguns na predominância das mídias sociais na informação política é aumentar o grau de polarização ideológica.

Teme-se que tanto no Facebook quanto no Twitter as pessoas leiam e interajam apenas com os que comungam com seus pontos de vista sobre assuntos mais polêmicos.

A pesquisa do Pew Research Center atenua, se não chega a desmentir, essa hipótese. A geração que mais diz agir de acordo com o paradigma de buscar a concordância e evitar opiniões contrárias é a do baby boom (dos 50 aos 69 anos), e assim mesmo apenas 31% deles dizem fazer isso.

Os millennials são mais abertos à discordância: só 18% deles afirmam procurar apenas os que pensam similarmente a eles.

Além do mais, como os baby boomers são os que menos confiam nas mídias sociais, o efeito de aumento da polarização deve ser ainda menor.

Outra pesquisa do Pew comprova que a polarização ideológica nos Estados Unidos tem crescido desde 1994, mas aparentemente isso não pode ser atribuído às mídias sociais.

Nove horas por dia ao celular e muito conservador

De acordo com o Datafolha, o nativo digital brasileiro, que passa nove horas por dia conectado à internet via celular, é muito conservador.

A maioria rejeita a prática do aborto (79%), o uso de maconha (67%) e a audiência de vídeos pornográficos (51%). E quase um terço (30%) condena o homossexualismo.

A maioria valoriza muito a família (só a saúde é mais importante que ela) e quer ter sucesso profissional (as profissões mais ambicionadas são as mesmas de um século atrás: de médico, advogado e engenheiro).

O estudo, feito em junho, antes do auge da crise, já apontava a desilusão do nativo digital com o país: 65% diziam querer viver fora do Brasil.

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Carlos Eduardo Lins da Silva, é jornalista e membro do Conselho Consultivo do PROJOR.