Os últimos resultados do Gini (0 = igualdade de renda e 1 = desigualdade completa) mostram a desigualdade do Brasil em 0,56. Este resultado contrasta com o índice de crescimento, com um PIB que é o sétimo mais rico do planeta. A Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo brasileiro divulgou que 50% das famílias que moram nas favelas formam a nova classe média (renda mensal de R$291 a R$1.019). Os dados de 2012 representam o contexto geral das estatísticas com base em dados econômicos que indicam que determinado país ficou mais rico e ao mesmo tempo mais desigual. Então, quem são os ricos e quem são os pobres? Onde está este PIB de US$ 2,3 trilhões?
Essa riqueza é representada por uma parcela mínima da população que nos índices gerais ganha proporção, demonstrando outro fenômeno social, a concentração de riqueza. Paralelamente ao contexto de concentração caminha a ideia de democratização, indicando que há mais indivíduos matriculados nas escolas e que o acesso à informação é maior. Desse modo, menos inocente é questionar: o que é ser excluído ou incluído social?
Concentração e democratização são contextos contraditórios do social que nos levam a refletir sobre o entendimento semântico do termo exclusão e seu par inclusão; como por exemplo, o que se compreende de exclusão social, ou seja, se está incluído ou excluído em relação a quê? Estar excluído ou não depende da classe social que o dono do discurso está se referindo.
A metamorfose sociodigital
A metamorfose a que estamos nos referindo diz respeito às transformações sociais, tomando como norteadora a linha de compreensão que vem se fundamentando nos termos inclusão/exclusão social, assim como o relacionamento que estes fazem com a sociedade.
Na atualidade, os esforços dos países em desenvolvimento para a promoção da inclusão digital enfrentam a barreira da coexistência com o crescimento econômico, subdesenvolvimento e acentuada desigualdade social. Para esses países, outras formas de desigualdade já existentes seriam aprofundadas por uma nova forma de exclusão materializada em um novo termo denominado de inclusão digital. Este termo estaria ainda mais ligado à noção de exclusão, pautada no que alguns estudiosos do tema têm convencionado chamar de “nova questão social” que no nosso entendimento se trata da pobreza historicamente conhecida incrementada pelas novas formas de acumulação de capital.
A essa altura de nossa argumentação, percebemos que mesmo estando em países pobres, cidadãos privilegiados de maior poder aquisitivo possuem tanto acesso à internet, e podem ser tão ou melhores informados quanto os usuários ricos dos países desenvolvidos. O Brasil tem aumentado paulatinamente seus percentuais com relação ao acesso ao computador e à internet. Conforme o Cetic.br, os dados de 2009 mostram um acréscimo de mais de 20% com relação a 2002. Contudo, tal acesso se dá de forma desigual.
Pensamento hegemônico
Quando observamos esse fenômeno a partir de outros indicadores, a exemplo da inserção das TIC na educação básica e fundamental, teríamos um movimento ainda mais contraditório e com tendências à concentração. Uma vez que parcelas significativas da população enfrentam dificuldades para acessar a educação formal, comumente chamada de “educação de qualidade” – pautada no ensino do conhecimento historicamente produzido socialmente –, sendo problemático ainda à associação desse processo formativo juntamente com as TIC.
No Brasil, o conceito de exclusão está ligado ao desemprego, adicionado a outros aspectos como o impacto da economia mundial na realidade nacional, características discriminatórias a pobres e negros, e ampliação de subempregos.
O medo de estar fora do modelo hegemônico é uma constante e no nosso entendimento, na formatação da sociedade atual, tem funcionado como combustível para competição por postos de trabalho. O sistema tende a colocar diretamente nas mãos dos indivíduos a responsabilidade pela educação, cultura e empregabilidade.
Proposta de informatização
Embora que hoje as discussões da inclusão digital estejam em torno das questões ligadas à empregabilidade dos sujeitos, percebemos que foi fortemente enraizada na problemática do consumo de bens e serviços, que surgiram no Brasil os debates pioneiros sobre a temática.
Com base nas análises em torno da inclusão digital observamos uma forte vertente que entende a inclusão como passagem de um estado ou de uma situação para outra, ou seja, a inserção do outro em uma condição proposta por um discurso que preza um contexto imposto, hegemônico e homogêneo. Os pontos contraditórios desta linha de pensamento são a intencionalidade e seus resultados. Pois, embora a intenção de “incluir” preze o objetivo geral de que o maior número de pessoas tenha acesso à educação, às tecnologias, ao saneamento, etc., as propostas de inserção anseiam por resultados que indiquem uma homogeneidade quantitativa. Uma inclusão do tipo controle; proposta por aqueles que se consideram inclusos e que precisam, de tempos em tempos, controlar quem estar dentro, proporcionando o acesso àqueles que estão fora. Esses indivíduos entendidos como exclusos, na maioria das vezes, se manifestam por meio da violência, delinquência ou micro revoluções, pressionando o sistema, logo precisam de alguma forma de controle. Como uma intenção quase perfeita de controlar os problemas e mazelas do modelo capitalista.
Trata-se de uma inclusão social dual. E a inclusão digital, quando fundamentada nesta perspectiva, suas ações terminam por supervalorizar a proposta de informatização da sociedade, separando-a das relações sociais, como se destacasse parte desse fenômeno social.
Potencialidade das TIC
Neste caso as relações pessoais e a atividade do trabalho são vínculos que o sujeito depende para manter contato legitimo com a sociedade a qual pertence. A inclusão, nesta perspectiva, está muito enraizada na alienação, subordinação e ao mesmo tempo na posição social, se constituindo em relações estritamente de base mercantilista.
Ainda assim, o entendimento de inclusão digital pode apresentar resultados benéficos na sociedade, desde que tenha sido fruto de reflexão com relação à dinâmica capitalista, se posicione enquanto eixo de uma política de inclusão social que apresente um contorno que respeite a heterogeneidade, acreditando no potencial de emancipação digital do sujeito.
Desse modo, a exclusão digital pode ser entendida como estado daqueles que não têm acesso às TIC, principalmente computadores e internet; como também aqueles que têm acesso, mas utilizam com limitações, ou seja, pouca ou quase nada da potencialidade que as TIC podem proporcionar.
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[Barbara Coelho Neves é cientista da Informação e Educação e Tecnologias]