Em 7/1, neste espaço, o presidente do conselho consultivo superior da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Eduardo Fumes Parajo, assinou artigo intitulado “Marco Civil: por uma internet livre“. O tema tratado – a proposta de regras para o uso da web no Brasil, com direitos e obrigações de cidadãos, empresas e governos – é um dos mais importantes para o país neste momento. Um projeto de lei a esse respeito aguarda votação no plenário da Câmara dos Deputados.
É louvável que, em sua abordagem, o articulista defenda o conceito da neutralidade de rede, previsto no projeto, cujo objetivo é assegurar que todos os provedores de internet ofereçam aos usuários a mesma velocidade, independente das características do arquivo transmitido. O princípio da neutralidade, que conta com o apoio do setor de radiodifusão, é fundamental para preservar o direito de milhões de internautas, de pequenas empresas e de novos empreendimentos, ao evitar uma tarifação “customizada”, acessível apenas aos grandes sites comerciais. A regra já é adotada por países como Chile, Colômbia, Holanda e EUA, mas no Brasil enfrenta resistência das companhias de telecomunicações.
Entretanto, o autor do artigo incorre em equívocos quando trata de outro ponto relevante do marco civil da internet: a regra para a retirada de conteúdo ilegal que infringe direitos autorais ou conexos. A Abranet entende que ao provedor de internet não “compete” decidir sobre a remoção de um conteúdo de sua plataforma. Tampouco, em sua opinião, o provedor poderia ser responsabilizado por violação de direitos autorais após “mera notificação de terceiros”.
Produção cultural de qualidade
Ora, o exercício da liberdade em qualquer democracia implica assumir responsabilidades. Aliás, no ambiente de absoluta liberdade da rede, esse princípio está consagrado internacionalmente com a adoção do sistema Notice and Take Down, no Brasil já respaldado por farta jurisprudência. Por esta regra, o site que incorrer em violação de direitos autorais é notificado e pode decidir se retira ou mantém o conteúdo pirata. Se, mesmo alertado do caráter ilegal do conteúdo postado, o site o mantiver, somente nesse caso responderá pelos danos causados, solidariamente com o autor. A notificação não possui caráter impositivo. Exige, sim, um juízo de valor do site sobre o conteúdo contestado.
A alternativa ao instituto da notificação – a judicialização do conflito – seria a pior possível tanto para o autor de uma obra pirateada como para o conjunto da sociedade. Trata-se, evidentemente, de um caminho incompatível com a celeridade do mundo virtual, e antagônico à tendência de evitar o acionamento do Judiciário, já sobrecarregado. Felizmente, o relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), soube recolher as melhores contribuições da sociedade civil e de seus pares.
Cabe lembrar que a indústria cultural é um dos mais ativos setores da economia brasileira, responsável por bilhões de reais e milhões de empregos, diretos e indiretos, e que tem na internet uma plataforma extraordinária para seu crescimento.
Em nome de suas 3.000 emissoras associadas, a Abert espera do Congresso Nacional um marco civil para web que garanta a liberdade de expressão, promova novas oportunidades econômicas e respeite os direitos autorais, que, mais do que uma garantia apenas para artistas, músicos e criadores, são pressupostos em uma sociedade que demanda produção cultural de qualidade e em grande escala.
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[Daniel Pimentel Slaviero, administrador de empresas, é presidente da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão)]