Grupos defensores da liberdade de imprensa manifestaram nesta sexta-feira sua preocupação com a nova Lei de Comunicação aprovada pela Assembleia equatoriana. A norma prevê a criação de órgãos de regulamentação da mídia e punições no caso de reportagens e artigos considerados ofensivos. Em um de seus artigos mais polêmicos, cria a figura do linchamento midiático, que poderá ser usado para impedir a publicação de informações que desprestigiem uma pessoa ou empresa ou afetem sua credibilidade. Para o Comitê de Proteção aos Jornalistas, este é o sinal mais recente da deterioração da liberdade de imprensa no governo de Rafael Correa.
– A lei não apenas prejudica a capacidade de informar criticamente como ameaça o direito dos cidadãos a serem informados sobre questões sensíveis. Ela transforma em legislação um dos principais objetivos da Presidência de Rafael Correa: amordaçar os críticos do governo – disse Carlos Lauría, coordenador do CPJ para Américas.
Organizações como CPJ, a Anistia Internacional e Repórteres sem Fronteiras criticaram a linguagem vaga empregada nos artigos e o que viram como uma tentativa de regular o conteúdo de reportagens. “Uma das principais falhas dessa lei é a criação de um novo mecanismo para regular a mídia e seus sites. Outra é a tentativa de influenciar como o jornalismo é definido e praticado”, disse a RSF em comunicado na sexta-feira (14/6).
“Dia de luto”
O projeto passou por maioria absoluta na sexta-feira (14/6), após quatro anos de debates. Governistas definiram sua aprovação como um dia histórico, enquanto a oposição o classificou como uma lei de mordaça. A norma cria o Conselho de Regulamentação da Comunicação, integrado em sua maioria por representantes do setor público e que deve controlar conteúdos da mídia relacionados com discriminação e violência.
Esse conselho poderá impor sanções aos veículos que publiquem conteúdos considerados proibidos. As punições – que vão de pedidos públicos de desculpas a multas altas – vão ser aplicadas pela Superintendência de Comunicação, órgão também criado pela lei e cujo titular será indicado pelo Executivo.
O projeto foi considerado uma vitória para o governo de Rafael Correa, e sua aprovação não foi menos polêmica. A iniciativa começou a ser debatida em 2009, foi interrompida em 2012, e retomada nesta sexta. ElA foi votado em cerca de uma hora e meia, divida em sete partes: cinco delas obtiveram 108 votos a favor e outras duas 110 dos 135 parlamentares presentes. Seu texto foi entregue aos legisladores 17 horas antes da sessão, e, segundo a mídia local, houve mudanças cinco minutos antes do início da votação.
– Nenhum projeto de lei foi tão debatido, tão socializado como o da Lei de Comunicação – disse Mauro Andido, parlamentar da Aliança País que propôs a medida.
O presidente equatoriano, Rafael Correa, tem tido constantes choques com a imprensa desde que chegou ao poder pela primeira vez, seis anos atrás. Ele insistia na urgência de criar um órgão para controlar os meios de comunicação. Certa vez, chegou a classificar os veículos como “assassinos de tinta” e “bestas selvagens”, colocando jornalistas dentro da lista de seus principais opositores. Para entrar em vigor, a norma ainda necessita da assinatura de Correa, que pode sugerir mudanças em sua estrutura antes de aprová-la.
“Hoje é um dia de luto para o Equador”, escreveu o parlamentar opositor Andrés Páez no Twitter, que teme que a lei seja usada contra críticos ao governo. “Hoje, na Assembleia Nacional, se assina o atestado de óbito da liberdade de expressão. Estamos a caminho da consolidação de um regime fascista.”
Jornais colombianos contra lei no Equador
Em uma ação sem precedentes, jornais colombianos se uniram e publicaram nesta sexta-feira – antes da votação da Assembleia equatoriana – um mesmo editorial contra o projeto da Lei da Comunicação no Equador, considerado pela Associação Colombiana de Editores de Diários e Meios Informativos como o golpe final contra a liberdade de expressão no país vizinho.
– Há outros países que estão em perigo e podem adotar medidas legislativas similares, como Venezuela, Argentina, e Bolívia. Mas uma situação tão grave como a do Equador é quase única, é talvez a mais grave de todas – alertou Nora Sanín, diretora executiva da organização Andiarios, de empresas editoriais da Colômbia.