Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

A Constituição cidadã e a comunicação sem cidadania

A Constituição brasileira fez 25 anos em 5 de outubro sem resolver uma de suas grandes falhas: o capítulo da comunicação. O texto constitucional que foi a marca da redemocratização do país, com avanços históricos, tais como o capítulo que trata da saúde pública, ou o do meio ambiente, que possibilitou que a nação conseguisse produzir uma até então inédita política pública para o setor, produziu um insuficiente e genérico capítulo sobre comunicação, sem regulamentação até os dias de hoje.

Isto não foi por acaso ou fruto de descuido. Na verdade, o setor empresarial de comunicação brasileiro, um dos mais concentrados e verticalizados do mundo, era uma herança que a ditadura deixava. Os grandes jornais e redes de TV e rádio tinham colaborado com o golpe que derrubou o presidente João Goulart. Como diz Juremir Machado da Silva, este golpe, antes de ser militar, foi civil/midiático.

Enquanto as comissões do Congresso sistematizaram os diversos capítulos que compuseram a Constituição, o da Comunicação ficou sem consenso. Apesar da atuação incansável da Frente Nacional por Políticas Democráticas – capitaneada pela Fenaj, presidida então por Armando Rolemberg, e com o obstinado trabalho do jornalista Daniel Herz, o texto teve que ser negociado em plenário com acertos apressados e com sua legitimidade comprometida. Embora garantisse as liberdades de expressão, de imprensa e de jornalismo como princípios, o texto final nunca teve as ferramentas que realizassem o que era sinalizado de maneira ambígua e genérica. Tanto que até hoje não existe lei que defina quando é monopólio ou a partir de quantas propriedades será oligopólio. A produção regional nunca foi preservada e a diversidade cultural foi esmagada por uma produção cultural geograficamente concentrada e politicamente monolítica. Poucas famílias detêm imenso poder com a propriedade cruzada de veículos privado-comerciais e o equilíbrio previsto constitucionalmente entre os sistemas privado, estatal e público prossegue sendo vilipendiado.

O Marco Regulatório das Comunicações

A Frente da sociedade civil constituída para defender a democratização da comunicação, embora muito atuante e com sofisticada reflexão conceitual, foi sendo derrotada pelo imobilismo dos grandes partidos e pela ausência de estratégia dos partidos de esquerda, além do poderio da chamada bancada da mídia, que naquele momento era composta por mais de 40% de proprietários ou testas de ferro destes proprietários na Câmara de Deputados e no Senado Federal.

A única e parcial vitória da sociedade foi a criação de um Conselho de Comunicação como órgão auxiliar do Congresso Nacional. Era um conselho consultivo – e não deliberativo conforme o desejo da Frente pela Democratização da Mídia –, mas era um enorme passo para quem defendia o princípio de que a comunicação era essencialmente pública e que necessitava de regras e agentes para garantir esta dimensão.

No aniversario da Constituição, precisamos exigir a sua plena implementação. Para que isto aconteça é necessário que o capítulo da comunicação seja finalmente regulamentado para compor o urgente Marco Regulatório das Comunicações que o governo federal deve à sociedade brasileira.

 

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Celso Schröder é presidente da Fenaj, da Fepalc, e vice-presidente da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ)