Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Rádios AM devem migrar para faixa FM

O Dia do Radialista, comemorado no dia 7 de novembro, terá este ano um sabor especial. Nessa data, a presidente Dilma Rousseff vai receber donos de rádios no Palácio do Planalto para assinar o decreto que permite às emissoras AM migrar para a faixa FM, atendendo a uma demanda antiga do setor.

A mudança, que será opcional, tem por objetivo dar um novo fôlego às rádios AM, prejudicadas com o aumento de ruídos e muitas interferências em suas transmissões. Enquanto isso, as rádios FM, que desde os anos 80 sempre tiveram maior aceitação entre os públicos mais jovens, passaram a ganhar mais espaço. Mesmo sem o grande alcance das AM, as FM apresentam sinais mais limpos e também podem ser sintonizadas por dispositivos móveis.

“As emissoras de rádio AM vêm perdendo competitividade por causa da interferência no seu sinal. Essa é uma questão física: o meio de propagação desse tipo de onda é muito suscetível a ruídos, prédios, energia elétrica, barulho de carros”, afirma Daniel Slaviero, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).

Para Hilton Alexandre, presidente da Associação de Emissoras de Rádio e TV do Estado do Rio de Janeiro (Aerj), “é uma questão de sobrevivência”. “Há uma queda gradativa: os jovens não conhecem a AM nem a aceitam, porque a qualidade de áudio é muito ruim. E as pequenas emissoras estão sendo engolidas, porque não conseguem mais fazer audiência”, afirma ele, que desde 2009 pleiteia a migração, juntamente com outros radiodifusores.

A mudança será possibilitada com a transferência de emissoras de TV do analógico para o digital. Os canais 5 e 6 VHF devem ficar vagos em 2015, quando a TV analógica for de fato desativada. Em cidades onde a faixa FM praticamente não comporta mais rádios, como em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, as emissoras AM serão alocadas nos canais de televisão recém desocupados, chamados de “faixa estendida”. Onde o FM não estiver saturado, as rádios serão alocadas na própria faixa já existente.

Convertida para rádio, a frequência dos canais 5 e 6 da TV irá de 76 a 88 MHz, tornando-os “vizinhos” da atual faixa FM, que opera de 88 a 108 MHz (veja quadro). O novo espectro do FM obrigará a indústria a produzir aparelhos de rádio que consigam sintonizar a nova faixa. Por isso, diz o presidente da Abert, haverá um prazo de adaptação de cinco anos, em que o radiodifusor poderá realizar transmissão simultânea em AM e FM.

Neste primeiro momento, os canais desativados da AM não despertam interesse do governo ou do mercado. “Por enquanto, a faixa ficará sem uso, até desenvolvermos uma tecnologia para aproveitar esse espaço”, diz o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Ele afirma que foram feitos testes para averiguar se a digitalização, que já ocorre no FM, seria uma solução para os percalços do AM. No entanto, afirma, os resultados não foram satisfatórios. Novos testes, porém, ainda serão realizados, diz.

Custos

A mudança para o FM é opcional, porém onerosa. Os radiodifusores terão de pagar por uma nova outorga, de FM, o que será custoso. Além disso, terão de adquirir equipamentos condizentes com a nova tecnologia. “Será necessário comprar uma nova antena e um novo transmissor, o que vai ficar por volta de R$ 70 mil a R$ 80 mil”, diz Slaviero. A Abert estima, apenas com os aparelhos, um gasto de R$ 115 milhões para o setor.

Também podem entrar na conta gastos logísticos, uma vez que, enquanto os transmissores de AM precisam estar alocados em um lugar plano, os de FM costumam ficar em lugares altos, como no topo de prédios. Os gastos de energia e manutenção, contudo, são bem menores em rádios FM.

Segundo a Abert e o Ministério das Comunicações, as rádios AM que optarem pela migração ocuparão na faixa FM um espaço correlato, sem perder potência. “Ela vai ter o mesmo alcance que tinha com o AM”, diz o ministro, se referindo ao raio de abrangência principal da rádio, conforme estabelecido pela outorga.

Porém, as rádios perderão a amplitude geral de sua cobertura, uma vez que a AM tem um alcance maior que a FM. Uma rádio que opera na capital paulista pode, por exemplo, “pegar” no litoral, ainda que com sinal de baixa qualidade. “Se a emissora cobria dez municípios, dificilmente vai continuar assim”, diz Ronald Siqueira, engenheiro da Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET).

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Para rádios pequenas, mudança pode ser questão de sobrevivência

Embora estejam em decadência, as rádios AM têm abrangência considerável. Tanto que, nas viagens pelo interior do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, agora, da presidente Dilma Rousseff, o Palácio do Planalto organiza entrevistas para rádios, especialmente AM. No interior, a AM ainda mantém um público ouvinte fiel, ainda que em processo de redução, resultado de uma experiência de quase um século de transmissões.

A primeira AM a atuar no País foi a Rádio Roquette-Pinto, do Rio de Janeiro, em 1923. Nas décadas seguintes, as lendárias rádios Nacional e Tupi tiveram seus programas sintonizados em quase todo o território brasileiro, fazendo, por exemplo, que clubes do futebol carioca tivessem torcidas em todos os Estados. A chegada da TV e a migração dos artistas da radionovela para a nova mídia, nos anos 50, não aposentou a AM.

Caberá às emissoras colocar tudo na ponta do lápis – audiência, qualidade de sinal, cobertura – para decidir sobre a migração. Enquanto algumas rádios veem na medida uma forma de sobrevivência, outras, que dependem de um sinal que atinja mais municípios, ainda que em baixa qualidade, como na Amazônia, podem optar por permanecer em AM, por exemplo.

“Emissoras que têm cobertura muito grande não vão querer migrar, vão querer ficar do jeito que estão. Acredito que a medida vai ser uma redenção para empresas pequenas de alcance local, que estão perdendo qualidade, receita e audiência”, afirma o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. No entanto, ele prevê que a maioria dos radiodifusores escolha fazer a mudança.

Um deles é Jorge Moisés Filho, um dos donos da Rádio Cidade de Vitória, no Maranhão. Apesar de alcançar 42 municípios com sua programação, Filho responde sem pestanejar que vai optar pela migração. “Não temos condições de continuar no AM. A audiência caiu muito, a manutenção é caríssima”, afirma. “Há muitas emissoras que foram desativadas; conheço umas 15.”

Com muita interferência, baixa qualidade de sinal e poucos anunciantes, a rádio, que existe desde 1991, vê no novo decreto uma solução, embora ainda não possa mensurar quais vão ser os gastos. “Não sei mesmo quanto vai custar; isso aí a gente vai ter de ver”, afirmou.

Moisés Filho, no entanto, anima-se com a possibilidade de poder, finalmente, alcançar os dispositivos móveis. “Essa juventude quer interagir, participar, quer que a rádio pegue no seu celular. Eles abandonaram a rádio AM”, afirma.

Para Slaviero, da Abert, esse é o meio no qual os radiodifusores devem ficar de olho: “Os números indicam que os grande receptores de rádio não serão nem os fixos, de residências, nem de automóveis, mas sim os celulares. Afinal, são 240 milhões no País”.

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Anna Carolina Papp, Andreza Matais e Leonêncio Nossa, do Estado de S.Paulo