O Brasil e, sobretudo, os brasileiros usuários da internet só terão a ganhar se o Senado aprovar o projeto que institui o Marco Civil da Internet – que define obrigações, deveres e direitos dos que utilizam a rede mundial de computadores – antes de esgotar o prazo legal de que dispõe. Melhor seria se o texto estivesse aprovado pelo Senado (a Câmara já o aprovou) e sancionado pela presidente da República até a conferência mundial sobre governança na internet que se realizará em São Paulo nos dias 23 e 24 de abril. Ali, o país poderia apresentar como exemplo seu modelo de governança já devidamente formalizado para representantes de governos, entidades privadas, academias e organizações da sociedade civil esperados para a conferência.
A arrastada tramitação do projeto na Câmara – que o aprovou no fim de março, quase três anos depois de apresentado pelo Executivo – talvez seja utilizada como argumento para alguns parlamentares tentarem prolongar seu exame no Senado, sob a alegação de que também os senadores devem ter o tempo necessário para debater o texto. Mas é justamente a demorada tramitação na Câmara que justifica, agora, a decisão rápida do Senado.
Os pontos essenciais do projeto, bem como as propostas apresentadas durante sua tramitação na Câmara, foram abertos e, na maior parte dos casos, exaustivamente debatidos pelos deputados, por membros do governo, por representantes de entidades interessadas, dirigentes de empresas privadas e usuários em geral.
Certamente os senadores conhecem essas discussões, o que, como observou o deputado João Arruda (PMDB-PR), que presidiu a comissão especial da Câmara que examinou a questão, pode assegurar a tramitação rápida e tranquila no Senado. “Todos os pontos de divergência na Câmara já foram neutralizados”, disse Arruda em entrevista a emissora de rádio de seu Estado. “Os partidos que eram contra tiveram suas dúvidas esclarecidas.”
Sensibilidade política e responsabilidade
Tais avaliações justificam a declaração do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de que a Casa analisará o projeto em “curtíssimo” prazo e não há “absolutamente nenhuma” hipótese de os senadores demorarem tanto quanto os deputados para votá-lo. Calheiros assegurou que o Senado tratará o projeto com “absoluta celeridade”. Este é também o desejo do governo.
Em seu dispositivo mais importante, o Marco Civil da Internet preserva o princípio da neutralidade da rede, por meio do qual se assegura que a transmissão de informações será feita sem discriminação de nenhum tipo, ou seja, não haverá a possibilidade de o fluxo de dados ser suspenso ou retardado dependendo da origem, do destino ou do conteúdo. O governo concordou em retirar do texto a exigência de instalação em território nacional dos centros de dados das empresas que prestam serviços no País. A exigência foi substituída pelo dispositivo que estabelece a precedência da legislação brasileira sobre quaisquer outras, qualquer que seja o país de origem da empresa.
Desse modo, o texto aprovado pela Câmara preservou o que havia de mais importante no projeto. O elogio que a proposta recebeu do criador da rede mundial de computadores (World Wide Web), o cientista britânico Tim Berners-Lee, é a demonstração mais clara de sua importância internacional. Embora ressaltasse que ainda há questões que podem ser discutidas, Berners-Lee afirmou que, com o Marco Civil, “finalmente um projeto de lei reflete como a internet deve ser: uma rede aberta, neutra e descentralizada, em que os usuários são o motor para a colaboração e inovação”.
Como a própria internet, disse o criador da rede, o projeto resultou do trabalho dos usuários, por meio de um “processo inovador, inclusivo e participativo” que “resultou em uma nova política que equilibra os direitos e responsabilidades dos indivíduos, governos e empresas que utilizam a internet”.
Se aprová-lo com a presteza anunciada por seu presidente, o Senado demonstrará que respeita os usuários da internet e que sabe agir com sensibilidade política e responsabilidade.