Após ter notado que a dificuldade dos pequenos provedores (ISPs) em competir com as concessionárias no mercado de banda larga não era em função dos preços praticados para a Exploração Industrial de Linha Dedicada (EILD), como durante anos se pensava, a Anatel dá início a um ajuste de foco regulatório.
O superintendente de competição da agência, Carlos Baigorri, explica que a agência percebeu que o produto que os pequenos provedores compram não é a EILD, mas sim um outro denominado interligação, que até então era tratado dentro da agência como algo menor. “Durante muito tempo a agência fez a sua regulação fazendo confusão entre esses dois produtos”, reconhece Baigorri. “A ficha caiu quando fui em um evento da Abrint (Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações) e depois de falar meia hora sobre EILD, a primeira pergunta que me fizeram foi o que era EILD”, conta ele.
A confusão, entretanto, segundo ele, está sendo corrigida e o ajuste de foco regulatório teve seu primeiro resultado com a redução de, por exemplo, 62% do preço médio da interligação praticada na cidade de São Paulo. Esses novos preços de referência, assim como os novos preços dos demais mercados relevantes, foram publicados nesta terça, 15, no Diário Oficial da União (DOU). Esse é o segundo ciclo de ajuste das ofertas de referência que é realizado a cada seis meses. No caso da interligação, o produto de atacado que determina os preços da banda larga que serão praticados no varejo, a única companhia que não teve a oferta publicada nesta quinta, 15, foi a da Oi.
Baigorri explica que, no caso da Oi, a Anatel teve que arbitrar o preço e, por isso, a publicação do ato com os novos valores vai sair na próxima quarta, 16. “Acho que eles vão para a Justiça”, reconhece ele. “A única que vê isso como um negócio parece ser a Telefônica/Vivo, que tem os preços mais baixos”, completa.
A outra ação do órgão regulador após ter identificado que o produto que os pequenos provedores compram é a interligação e não EILD será não multar os provedores que compram os produtos de banda larga do varejo e revendem. “A gente está dizendo que esses contratos das empresas de SCM (Serviço de Comunicação Multimídia) que compram como pessoa física vão ser considerados de interligação”, explica ele.
A confusão dos conceitos pelo órgão regulador do setor, para Baigorri, é prova dos efeitos nocivos da assimetria de informação entre a agência e os regulados.
Mercado corporativo
O Sistema Nacional de Negociação das Ofertas de Atacado (SNOA) também ajudou a Anatel perceber que o produto EILD não é usado para expandir a penetração da banda larga pelo País, como se pensava, mas, sim, usado por grandes empresas para atender o mercado corporativo (sobretudo pela Embratel) ou ligar as suas estações radiobase (ERBs) – no caso da TIM.
Por conta disso, está descartada uma atuação regulatória da Anatel mais forte nesse mercado. Baigorri entende que se a Anatel atuar para baixar o preço da EILD, na verdade, estará “desincentivando” que as empresas construam suas próprias redes. “Se a empresa não constrói rede para atender um grande banco em um contrato de 15 anos no Brasil inteiro, não vai construir nunca”, afirma ele. “A Telcomp acha que o mercado corporativo tem que entrar, mas, para nós, é um mercado no qual se justifica a construção de novas redes”, analisa ele.
Além disso, se estaria penalizando as concessionárias – ao obrigá-las a vender o EILD a um preço baixo – quando quem compra não vai expandir a banda larga pelo País, mas, sim, atender a um mercado de alta demanda.
Metodologia de replicabilidade
As ofertas de referência desse segundo ciclo (e também as do primeiro) foram homologadas com uma nova metodologia de replicabilidade, que não é aquela que chegou a ir para consulta pública. Baigorri explica que aquela fórmula se mostrou impossível de ser utilizada. “É como você querer explicar como se faz um bolo, sendo que você nunca fez um bolo”, compara.
A nova fórmula usada para homologar as ofertas tanto do primeiro ciclo quanto do segundo é baseada na experiência real e inclui também consulta aos compradores dos insumos. O Conselho Diretor da agência deve receber a nova metodologia nos próximos meses, diz Baigorri.
Infraestrutura passiva
A superintendência fará a re-homologação das ofertas de referência a cada seis meses, mas com o foco regulatório em apenas um produto, dada a escassez de pessoal. Agora o produto escolhido foi a interligação e o próximo será a infraestrutura passiva.
Como tinha sido mencionado pelo presidente João Rezende, representantes da agência se reuniram com a Abrintel, a associação que reúne as empresas detentoras de dutos, a fim de verificar se a associação teria interesse em negociar as torres de propriedade das associadas pelo SNOA. E a resposta foi sim.
Com o “de acordo” da associação, a Anatel tentará intermediar um acordo entre os pequenos provedores e as empresas de infraestrutura sobre um modelo de negócio específico para eles. Hoje, as torres são usadas pelas operadoras do Serviço Móvel Pessoal (SMP) que têm um tipo de antena maior que os rádios usados pelos provedores.
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Helton Posseti, do Tela Viva