A prática de subconcessão, arrendamento ou alienação a terceiros promovida por concessionários de serviços públicos de rádio e televisão foi criticada pelo Ministério Público Federal (MPF) e por representantes de organizações da sociedade civil. O assunto foi debatido em audiência pública, realizada na terça-feira (5/8), pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados. A audiência atendeu ao requerimento da Deputada Federal Luiza Erundina (PSB), datado do ano de 2012.
A lista de convidados para debater o assunto foi extensa, porém, mais uma vez, a maioria das empresas de radiodifusão não enviou seus representantes. Como palestrantes, a audiência pública contou com as contribuições da Rosane Bertotti, Coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC); Bia Barbosa, do Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes); Domingos Sávio, Procurador regional da República e coordenador do Grupo de Trabalho de Comunicação Social da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do Ministério Público Federal (MPF). As Organizações Globo, única empresa presente, teve como representante o seu Vice-presidente de Relações Institucionais, Paulo Tonet. A Rede Record, o Grupo Bandeirantes de Comunicação e a Rede CNT foram convidados, mas não compareceram ao debate.
Violação constitucional
O Procurador Regional da República, Domingo Sávio, destacou que o arrendamento e a subconcessão são práticas que violam a Constituição Federal. “São ilegais e devem ser combatidas”. Para ele, há grandes falhas no processo de fiscalização das concessões públicas. “Continuamos presos ao coronelismo eletrônico que faz com que as concessões se transformem em algo privado”, afirmou. Segundo o procurador a possibilidade de fazer circular a informação é essencial se quisermos um país verdadeiramente democrático. Ele citou como grande desafio a regulação das mídias.
A coordenadora-geral do FNDC, Rosane Bertotti, lembrou que este debate sobre a existência de subconcessões e arrendamento esteve presente de forma marcante na 1ª Conferência Nacional da Comunicação – Confecom, realizada em 2009. “A ilegalidade está clara, não há respeito à legislação”, disse Rosane, enfatizando a importância de que os debates e proposta apresentados nesta audiência tenham consequências de fato. Ela também cobrou dos parlamentares presentes e do Congresso Nacional mais responsabilidade quanto à renovação de concessões. “As concessões não podem ser renovadas de forma automática. É preciso análise, mais critérios e que o debate ocorra com o conjunto da sociedade e dos movimentos sociais”, argumentou a coordenadora do FNDC. Rosane lembrou que o projeto de lei de inciativa popular da Lei da Mídia Democrática, em seu artigo 11, veda, na utilização das outorgas de rádio e televisão terrestre, a cessão onerosa ou o arrendamento das prestadoras de serviços de comunicação social eletrônica, bem como de horários de sua grade de programação. “A luta dos movimentos sociais continua firme para que esta Casa dialogue com a sociedade, via o projeto da Lei da Mídia Democrática e outros instrumentos, para regulamentar a comunicação brasileira”, concluiu.
A Deputada Luiza Erundina iniciou sua fala registrando a ausência do Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, bem como a ausência de empresas do setor. “A democracia depende de um sistema de comunicação democrático. A sociedade espera, a democracia espera e é preciso avançar”, disse Erundina, lembrando que este é um debate antigo, várias vezes posto em pauta, mas que permanece repleto de irregularidades e práticas inconstitucionais. “O controle do bem público que é a comunicação precisa se dar de forma efetiva”, destacou a parlamentar.
Programação à venda
Representando o Intervozes, entidade que também integra a coordenação executiva do FNDC, Bia Barbosa reafirmou que os serviços de radiodifusão são sim serviços públicos. Ela apresentou pesquisa do Intervozes sobre as porcentagens dos arrendamentos de algumas empresas de radio difusão. Segundo o levantamento, a prática ilegal de vender blocos de programação a terceiros é bastante comum. “O espaço ‘vendido’, de forma inconstitucional, é ocupado, na maioria das vezes, por programas religiosos e para publicidade”, informou Bia. Na análise do ano de 2014, a estimativa apresentada revela que a Bandeirantes possui 32 horas por semana de espaço vendido; a Rede TV! tem 83 horas e 50 minutos por semana; Na TV Gazeta, são 38 horas e 30 minutos por semana. A Record vende o espaço de 35 horas por semana. O caso que mais chama atenção é o da Rede 21: o tempo de programação vendida chega a 92% da programação. Ou seja, são 154 horas por semana (22 horas por dia). Diante deste cenário, Bia Barbosa destacou a necessidade urgente de fiscalização das concessões, da regulação e do controle social do setor.