O Ano Novo começa com promessas de mudanças profundas no setor de telecomunicações brasileiro.
Embora o ponto central seja a concentração do mercado, cada operadora luta por um objetivo diferente em defesa dos seus negócios. As iniciativas que começaram a amadurecer em 2013 mostram que a partir de 2015 o Brasil poderá ter um setor de telecomunicações bem diferente do que o Ministério das Comunicações e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) desenharam há quase duas décadas na época da privatização das empresas.
A estratégia e as regras do setor foram criadas para um mercado então centrado em telefonia fixa, com a internet embrionária no país e o serviço celular planejado para que cinco operadoras nacionais e duas regionais competissem com relativo equilíbrio.
Mas os fatos mostram que os planos saíram de controle. A telefonia fixa entrou em declínio, sufocada pela móvel, que colocou um celular nas mãos de cada consumidor. Com o aumento da velocidade da internet em banda larga o tráfego de dados cresceu verticalmente. Surgiram empresas que fornecem serviços sobre essas redes, mesmo sem parceria comercial com as teles, como Facebook, Google e Netflix, e a banda larga virou prioridade para os internautas, exigindo investimento em infraestrutura.
Os serviços que foram planejados para serem divididos entre telefonia celular, fixa, internet e TV por assinatura, prestados por empresas diferentes, foram aglutinados sob uma só operadora. Muitas empresas desapareceram, vendidas ou integradas por outras. O processo de encolhimento continua, o que é surpreendente para um país que já teve cerca de 1,2 mil empresas de telefonia que atuavam por localidade na fase “jurássica” da telefonia, muito antes da privatização do setor.
Hoje, restam Telefônica, que opera com a marca Vivo e acaba de comprar a GVT? América Móvil, que colocou Embratel e Net sob a Claro? TIM, que adquiriu a Intelig, espelho da Embratel na longa distância e AES Atimus, de fibras ópticas? Oi, em processo de fusão com a Portugal Telecom, que dará origem à CorpCo? e Nextel, além das regionais Algar Telecom e Sercomtel. Com exceção de TIM e Nextel, focadas em serviços móveis, as demais atuam com multisserviços.
A tentativa da Anatel de promover a competição no serviço móvel por meio de operadoras sem rede, que alugassem infraestrutura de concorrentes para atuar em nichos, por enquanto fracassou. Depois de fazer “road shows” internacionais para divulgar o projeto das operadoras móveis de rede virtual (MVNOs), a agência esperava vender uma centena de licenças. Mas, desde 2012, menos de meia dúzia de novos investidores se arriscaram. Entre eles, apenas Porto Seguro e Terapar entraram em operação, com 0,09% de participação de mercado. Para 2015 esperase o lançamento da Virgin Mobile, do grupo Altice, de Luxemburgo, o mesmo que acaba de comprar os ativos da Oi em Portugal. Mesmo assim, a Anatel já estuda expandir o modelo de MVNOs para outros serviços, como banda larga fixa e via satélite, e TV por assinatura.
Impacto econômico
A competição em telefonia fixa mal saiu dos planos originais. O mapa nacional da competição previa apenas três operadoras para o serviço: BrT, Telefônica e Oi. A BrT foi comprada pela Oi, e a GVT vai sair de cena, após a conclusão de sua venda pela francesa Vivendi para a Telefônica. Com isso, foram eliminadas uma concessionária (BrT) e sua espelho (GVT), um raro caso que deu certo nesse modelo. As empresasespelho Vésper São Paulo, da Telefônica, e Vésper S.A., da Telemar (Oi), foram compradas pela Embratel.
As espelhinhos, pequenas operadoras competitivas em telefonia fixa, idealizadas para prover o serviço por localidade, também ruíram. O modelo foi um fiasco desde o início, já que os pequenos empreendedores compravam as licenças mas não conseguiam garantias financeiras para a construção das redes. Os fabricantes, que durante anos financiaram grandes operadoras, puseram fim à linha de “vendor financing” e também não quiseram se arriscar com os pequenos projetos embrionários.
Há mudanças relevantes previstas para 2015 que envolvem quase todas as operadoras. De concreto até o momento, a Telefônica Vivo ganha força com a integração da GVT, prevista para o primeiro semestre.
TIM e Oi tentam se manter no mercado, mas uma delas pode desaparecer. A Oi contratou o banco BTG Pactual, em agosto, para estruturar uma oferta pela subsidiária da Telecom Italia em parceria com a Vivo e a Claro. O objetivo é dividir a TIM entre os concorrentes. O grupo italiano revidou e estuda se faz uma proposta de aquisição ou fusão com a Oi. Segundo fontes que acompanham as empresas, tratase de uma ação defensiva, e não de oportunidade de negócio, devido às dívidas e outros problemas estruturais da Oi.
A Nextel, da americana NII Holdings, em recuperação judicial, também poderá ser vendida em médio prazo, apesar dos esforços da Anatel para que se tornasse um quinto competidor forte.
Só com a integração da GVT, a Telefônica já altera o ranking de banda larga e telefonia fixa. A Vivo sai do terceiro lugar como prestadora de acesso em banda larga fixa para segundo, com 7.117 conexões, desbancando a Oi e se aproximando da América Móvil, com 7.389. Em telefonia fixa, a Vivo também ganha uma posição e chega à viceliderança, com 15.266 linhas, destituindo a Embratel e encostando na Oi, no topo com 16,7 mil linhas. Em TV paga, Vivo e GVT somadas têm só 1.603 assinaturas, o que não fortalece a Vivo para que se desloque do terceiro lugar.
Em banda larga, o país continua atrasado na comparação mundial, com baixa penetração do serviço e preço elevado ao consumidor. A dimensão geográfica do Brasil e o alto custo para investimentos desfavorecem a expansão do serviço.
“O desafio é a universalização no país, diz Sergio Lee, sócio da consultoria Maksen no Brasil. Em parceria com a FGV, a empresa fez uma pesquisa sobre banda larga em março, concluída em agosto, envolvendo 19 países, inclusive o Brasil. “Falta muito investimento no país. Em locais de baixa densidade e menos renda, o risco é alto para as empresas, e não há incentivo econômico.”
Entre as saídas indicadas por Lee estão o uso dos fundos de telecomunicações, que desde a criação servem para fazer superavit primário e revertem pouco ao setor? financiamento ou redução da carga tributária em telecomunicações. Com as operadoras endividadas e dificuldades de caixa, e sem incentivo do governo vai demorar para universalizar, diz ele.
Para Lee, banda larga é a tecnologia com maior impacto no desenvolvimento da economia. Uma expansão de 10% na taxa de penetração do serviço gera um aumento estimado de 1,38% no PIB, informa o estudo da Maksen/FGV.
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Ivone Santana, do Valor Econômico