Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Marco Civil e privacidade em pauta

Se tudo correr bem, nesta quarta-feira (28) vai ser lançado em Brasília o debate público sobre dois temas essenciais para a sociedade da informação: o decreto que vai regulamentar o Marco Civil da Internet e a nova redação da Lei de Proteção aos Dados Pessoais. A iniciativa é do Ministério da Justiça, que porá na internet um site para receber contribuições públicas sobre a redação dos dois textos.

Como são duas normas que afetam diretamente a rede, nada melhor do que utilizá-la como canal para receber contribuições de todos os setores da sociedade. Até porque os temas a serem tratados são complexos e, quanto mais opiniões e olhares sobre eles, maior a chance de produzir um resultado construtivo.

Foi o que aconteceu com o Marco Civil original. O Brasil viveu até abril de 2014 – mês de aprovação da lei – em um limbo com relação à definição das bases legais da internet. A construção do Marco Civil iniciou-se em 2007 e contou com sucessivas consultas públicas pela internet (vale dizer: participei da arquitetura do projeto e das consultas desde o início). O resultado foi positivo. Com tantas contribuições, o texto do Marco Civil ficou tecnicamente sólido e é hoje reconhecido como exemplar por vários países (para ver uma amostra da perspectiva internacional sobre ele, vale olhar a publicação da Universidade da Pensilvânia disponível em is.gd/estudo_marcocivil).

A chave

Mas nem tudo são flores. Processos de participação pela internet precisam ser bem conduzidos. Um dos riscos é que sejam capturados por grupos de interesse. Por causa disso, a participação da sociedade civil e da academia é muito importante. Felizmente, um dos efeitos colaterais positivos dos sete anos de desenvolvimento do texto foi justamente o surgimento na sociedade brasileira e na academia de grupos difusos que passaram a acompanhar o tema. É de esperar que eles estejam ativos na discussão desse novo processo que se inicia amanhã.

Até porque os temas são quentes: privacidade, neutralidade na rede, liberdade de expressão, governo digital, guarda de dados dos usuários para investigações e outros. A chapa deve esquentar ainda mais no debate sobre a Lei de Proteção aos Dados Pessoais.

Essa lei afetará um número infindável de atividades econômicas: telecomunicações, gestão educacional, análise de crédito, desenvolvimento urbano e assim por diante. O desafio vai ser equilibrar a proteção da privacidade, valor essencial para este século, com a necessidade de reconhecer que o processamento de dados é hoje motor econômico e de desenvolvimento de primeira grandeza para qualquer país.

Por isso, fica aqui minha primeira contribuição pública para o debate: a Lei de Proteção aos Dados Pessoais precisa adotar desde já a posição de que dados agregados e anonimizados não devem ser considerados “dados pessoais”. Essa é a chave para permitir que o Brasil participe dos benefícios do big data, ao mesmo tempo em que promove a privacidade dos usuários.

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Ronaldo Lemos é advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro