Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A hora da reforma trabalhista

Considere uma pequena publicação que, com seu orçamento limitado, tenha, por exemplo, cinco profissionais ganhando 5 mil reais por mês no regime de pessoa jurídica (PJ, ou o famoso frila fixo). Se ela for obrigada a registrar essa equipe, cada funcionário que ganha 5 mil reais passa a custar mensalmente em torno de 8 mil reais.


Com o dinheiro curto, a publicação pode fechar e cinco jornalistas perdem o emprego. Ou ela resolve registrar alguns, mas o dinheiro só dá para três funcionários. Ela fica com esses três trabalhando mais e ganhando menos, no resultado líquido. E dois perdem o emprego.


Esse exemplo, da maior clareza, está no excelente artigo do Carlos Alberto Sardenberg, publicado no Estado de S.Paulo (28/3/05) [veja remissão abaixo].


Se o cumprimento da lei leva ao desemprego ou à redução da atividade econômica, alguma coisa está errada com essa lei.


O assunto das PJ, que finalmente aparece na grande imprensa, já vinha sendo discutido aqui no Observatório [remissões abaixo], praticamente com as mesmas conclusões. Sardenberg mostra que o fenômeno ocorre em todos os setores da economia, mas com espantosa expansão nos meios de comunicação. E cita a postura de algumas empresas em estimular ou obrigar funcionários a abrirem suas empresas e receber como PJ.


Na verdade, no início dos tempos, lá pela década de 1960, essa história de PJ era uma reivindicação dos astros da publicidade, que ganhavam fortunas e deixavam metade (ou quase) para o imposto de renda. A negociação era do tipo: ‘Se eu ganho 20 e custo 28 para a agência, me dá os 28 que eu apresento uma nota fiscal’. Ou seja, os encargos trabalhistas eram acrescentados ao valor nominal do salário do artista.


Em princípio, as empresas, por ética ou medo, resistiram. Mas, aos poucos, acostumaram-se com a idéia e o feitiço virou contra o feiticeiro, por dois motivos.


Um, que esse método chegou aos profissionais com nível médio de remuneração, entre os quais as vantagens não são tão grandes.


E outro, que a negociação nominal passou a ser feita tendo como referência o valor bruto dos salários (já com os encargos), o que pode ter um certo efeito psicológico, principalmente entre aqueles não muito afeitos a fazer contas.


Ou seja, se um profissional é registrado com 18 mil reais mensais, ele realmente ganha 18 mil reais, embora grande parte fique com o imposto de renda. Mas se o pagamento é feito para a firma desse profissional, então ele não ganha isso. Os 18 mil reais são o faturamento bruto da empresa que ele abriu. Desse dinheiro, ele tem que abater, no mínimo, o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, o Cofins, o PIS, a CSLL, o ISS, o contador…


As contas com a pessoa física desse colega começam depois desses abatimentos. Como a remuneração é alta, a firma desse senhor pode se dar ao luxo de fazer uma reserva para os tempos de vacas magras (substituir o FGTS), pode fazer um plano de previdência privada, pode lançar despesas de gasolina, restaurantes e empregada como custos da empresa. Pode ter, pela firma, um plano de saúde para a família. O que sobra pode ser considerado como a retirada, pessoa física, sobre a qual ele vai pagar um mínimo de Imposto de Renda pessoa física e contribuir com o INSS.


Como pessoa física e jurídica ele não está na informalidade e – bela contradição – coloca mais reais no bolso que se estivesse registrado.


Conclusão clara


Algumas empresas, nos vários setores, adotam um sistema misto. Registram o funcionário com um certo salário e pagam a diferença ‘por fora’. E nem sempre exigem que esse funcionário tenha sua própria empresa. Ele pode apresentar notas de outras empresas, como postos de gasolina, restaurantes etc.


Mas, no caso particular dos meios de comunicação, a coisa é completamente diferente pois se tornou uma prática muito difundida e chegou ao pessoal com nível médio de remuneração. De fato, alguns jornais, TVs e assessorias de imprensa estão exigindo que o contratado tenha sua própria empresa. E a remuneração não permite que esses colegas façam ‘reservas’.


Os impostos podem ser menores (se a empresa estiver no regime do ‘Simples’ – Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte) e, ilusoriamente, o profissional pode achar que está ganhando um valor líquido maior do que se estivesse registrado. Mas só ilusoriamente, pois ele está totalmente desamparado. Não tem fundo de garantia, assistência médica, vale-transporte, vale-refeição, só para falar nos benefícios óbvios.


E é aí que, se correr, o bicho pega.


Pequenas empresas de comunicação – com seus serviços ou publicações – dependem de muita mão-de-obra. Como a economia não está tão bem assim, quase todas trabalham no limite de custos e receitas. Um aumento de custos, para muitas delas, significa o fim da operação – com mais desemprego por aí.


Algumas dessas empresas – e não só no setor de comunicação – encontraram um terceiro caminho, o da parceria. Em resumo, o funcionário ou profissional passa a ter interesses no lucro daquele empreendimento. Trabalha por uma remuneração bem menor acompanhada de polpudas comissões ou participações se o trabalho for bem-sucedido. Há empresas que até transformam esses funcionários em sócios do negócio.


Mas esse não é o caso geral. Como a maior parte dos profissionais tem plena consciência de que pode perder o emprego, a regra geral tem sido a da aceitação – e até defesa – do sistema de remuneração para pessoas jurídicas.


A conclusão, clara, é que a lei precisa ser transformada, corrigida, atualizada. A imprensa, onde o tema do desemprego já é recorrente, fica devendo matérias acompanhadas de simulações que mostrem o quanto uma reforma trabalhista mudaria a situação do emprego no Brasil.


Boas pautas podem mostrar quantos empregos seriam gerados e o quanto a economia ganharia em dinâmica por estimular capitais que estão em fundos DI a virem para a produção. E nenhum momento pode ser melhor para essa reforma do que agora, quando o Partido dos Trabalhadores, tão empenhado na geração de empregos, está no poder.