A imprensa brasileira vive assombrada pelo fantasma da censura. A mais recente manifestação desse avantesma é a avaliação que os representantes da mídia nacional levaram à 66ª assembléia geral da Sociedade Interamericana de Imprensa, que se realiza no México. Segundo o documento apresentado ante a Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação da SIP, reproduzido em parte pela Folha de S.Paulo, o novo nome da censura é ‘controle social da mídia’.
No texto, a delegação brasileira afirma que, embalada pelo continuísmo e por maioria tanto na Câmara quanto no Senado, a esquerda brasileira detém os instrumentos para concretizar as ameaças embutidas no Plano Nacional de Direitos Humanos e nas conclusões da Conferência Nacional de Comunicação que o governo federal promoveu no ano passado.
Conforme pode se lembrar o leitor de jornais, a imprensa nacional condenou, em peso, as recomendações para a aplicação da norma constitucional e a ativação do Conselho Nacional de Comunicação. Portanto, a rigor, a imprensa brasileira está pregando a desobediência a uma determinação da Constituição.
Regime monárquico
Os temores da mídia tradicional se voltam para o Seminário Internacional das Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, que a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República promove nesta semana em Brasília, durante o qual serão debatidas propostas de modernização do setor.
O foco principal do seminário é a atualização técnica e normativa diante das inovações e da tendência de mudanças de plataforma no novo cenário das comunicações digitais. Trata-se de um evento predominantemente técnico, com a presença de convidados estrangeiros, entre eles representantes de órgãos reguladores de países como Portugal, França, Espanha, Argentina, Reino Unido, Estados Unidos e da União Européia. Também estarão presentes observadores da Unesco, o órgão da ONU encarregado da Educação e Cultura.
Não há sinais de agentes comunistas infiltrados nem há hipótese de uma invasão bolivariana durante os debates. O acontecimento será transmitido ao vivo pela TV NBR, da Rede Brasil, e pelo site www.convergenciademidias.gov.br
O que acontece é que as empresas tradicionais de mídia do Brasil vivem no regime monárquico e lutam para impedir a proclamação da República no setor.
Alhos com bugalhos
O que poderia explicar esse pavor que tem a mídia brasileira de qualquer debate sobre o modo como se organiza o setor?
Quando tratavam de eliminar a exigência do diploma para o exercício do jornalismo, a imprensa brasileira tradicional e seus acólitos souberam usar os chamados países desenvolvidos – citando o Reino Unido, os Estados Unidos e outras nações – como modelos de liberdade de imprensa.
Quando se trata de regulamentar a atividade de comunicação, necessidade que se impõe pelo avanço tecnológico e pela maior complexidade da sociedade contemporânea, a presença de representantes dos países mais avançados é vista como uma ameaça.
Por que será?
No documento levado à Sociedade Interamericana de Imprensa, os representantes da mídia tradicional brasileira misturam alhos com bugalhos, citando casos de agressões a jornalistas e a proibição imposta pela Justiça ao jornal O Estado de S.Paulo de publicar informações sigilosas sobre investigações contra o empresário Fernando Sarney.
O documento não esclarece que todos os outros jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão e de internet do país podem publicar o que quiserem, inclusive informações sobre o caso que envolve o filho do presidente do Senado.
O texto tem um claro viés político, ao citar o resultado das eleições presidenciais no Brasil, e mistura sem qualquer critério o caso brasileiro – onde se trata de fazer cumprir uma determinação constitucional – a situações de grave conflito entre imprensa e grupos políticos, como acontece na Venezuela, Argentina e outros países do continente.
Pelo que foi divulgado do comunicado, conclui-se que a imprensa brasileira vive acossada por ameaças à sua liberdade, quando o que se viu recentemente, durantes os meses de campanha eleitoral, foi uma imprensa partidária usando sua ampla e absoluta liberdade para praticar um jornalismo de cabo eleitoral.
Se existe algum risco à liberdade de imprensa no Brasil, ele nasce do viés imposto às redações, verticalmente, por seus dirigentes.