Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A novela da falsa TV pública

Prossegue a novela da TV pública que não é pública. Na quinta-feira (15/3) quem se insurgiu foi o Ministério da Cultura, por intermédio do Secretário do Audiovisual, Orlando Senna. E disse o que dele se esperava: o projeto está errado a partir do nome e, muito mais grave do que isso, vai atrapalhar a política do ministro Gilberto Gil de promover o fortalecimento da verdadeira rede pública de TV, aquela que vai oferecer à sociedade brasileira uma programação verdadeiramente alternativa.


Está evidente que o anteprojeto do ministro Hélio Costa foi apresentado de forma prematura e irrealista para atender interesses menores. Além de confrontar o Ministério da Cultura, que há tempos empenha-se em organizar a convivência entre as redes de TV culturais e educativas, o projeto de Hélio Costa ignorou completamente a existência da Radiobrás – cujo presidente, Eugênio Bucci, só soube pelos jornais da existência do anteprojeto da tal rede pública que não é pública.


Esta novela começou muito mal, melhor será tirá-la do ar o mais cedo possível.


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Por que incomoda uma TV pública de qualidade



Comentário para o programa radiofônico do OI, 15/3/2007


Os jornais de quarta-feira (14/3) reagiram de forma curiosa à noticia sobre a criação desta estranha entidade que se chamará Rede Pública de TV, mas que será na realidade uma TV estatal.


Primeira observação: a imprensa divulgou a repercussão mas não comentou nem opinou. [Na quinta (15/3), O Estado de S.Paulo publicou um editorial a respeito; ver abaixo.]


Segunda observação: apenas um jornal, no caso o Estadão, por intermédio de um entrevistado, deu-se ao trabalho de ressaltar o conflito entre a intenção de fazer uma rede pública e o fato de ela ser justamente o contrário, uma rede estatal.


Terceira observação: está comprovado que o cidadão médio não sabe a diferença entre público e estatal e a mídia não está interessada em desfazer esta confusão.


A quarta observação diz respeito à reação dos empresários de TV: foram os únicos que deram boas-vindas a esta TV pública que não é pública. E por quê? Simplesmente porque os empresários de TV não estão minimamente preocupados com uma rede estatal. Sabem que ela não roubará telespectadores da TV comercial. Mas, se o governo resolvesse investir 250 milhões na rede de TVs educativas e culturais, os empresários abririam o berreiro porque esta quantia resultaria em grandes melhorias para a programação alternativa que, assim, roubaria audiências da TV comercial.


Conclusões: nem o governo nem a iniciativa privada estão interessados numa rede verdadeiramente pública. Portanto, esta seria a aposta certa em beneficio da sociedade.(A.D.)


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TV para o Executivo


Copyright O Estado de S.Paulo, editorial, 15/3/2007


Dois meses após ter anunciado um plano para a implantação de uma rede de rádio mantida pela União e capaz de cobrir todo o território nacional, sob a alegação de que o presidente Lula quer estabelecer um canal direto de comunicação dos Três Poderes com a população, o governo divulgou o anteprojeto de criação da Rede Nacional de Televisão Pública, orçada inicialmente em R$ 250 milhões. As duas iniciativas estão previstas no decreto que definiu os critérios para a escolha do padrão de radiodifusão digital adotado no País. A idéia é que as duas redes comecem a funcionar este ano.


Apesar da pressa, contudo, os planos do governo ainda são incipientes e não permitem saber se o que ele realmente pretende é criar rádios e tevês estatais ou rádios e tevês públicas. As primeiras são controladas diretamente pelo governo e têm por objetivo defendê-lo e promovê-lo, além de divulgar suas iniciativas. As rádios e tevês públicas, apesar de receberem recursos oficiais, têm gestão autônoma, englobam as emissoras educativas e, por não precisarem disputar audiência para atrair anunciantes, podem oferecer programação de qualidade.


No caso da rede de rádio que o governo pretende criar, até agora não ficou definido se a responsabilidade por sua programação ficará a cargo da Radiobrás, à qual pertence a Rádio Nacional, a maior emissora estatal do País. No caso da rede de tevê, o Ministério das Comunicações já divulgou que disponibilizará dez canais públicos para o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Contudo, nada se sabe sobre as negociações que estão sendo feitas com os dirigentes desses Poderes pela Secretaria-Geral da Presidência da República.


O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, já afirmou que até o momento não foi procurado pelo ministro das Comunicações para discutir a criação das duas redes.


A idéia de se criar uma rede de rádio e tevê financiada pelo Executivo não é nova. Rede desse tipo começou a ser planejada pelo regime militar nos anos 70, quando o uso de satélites permitiu a integração das comunicações. Em si, a iniciativa não é má. Muitos países democráticos dispõem de redes públicas de comunicação, com programação institucional, cultural e educacional sem qualquer tom partidário e com controles eficientes para evitar que o noticiário seja distorcido com objetivos políticos. Essas redes, das quais a mais conhecida é a BBC inglesa, exercem um papel específico que não cabe às redes privadas.


Diante da pressa com que o Ministério das Comunicações quer criar as duas redes e do histórico do governo no campo da comunicação social, é preciso ver o que está inspirando essa iniciativa. No início do primeiro mandato de Lula, o governo propôs a criação de um órgão corporativo que, a pretexto de fiscalizar o exercício da profissão de jornalista, teria a prerrogativa de interferir na concessão de registros profissionais e no funcionamento da mídia. O projeto era de autoria de uma entidade controlada por assessores de imprensa indicados pelo PT para autarquias e estatais. Na mesma época, o governo também propôs a criação da Agência Nacional de Cinema e Audiovisual. Justificado em nome do estímulo à produção cultural nacional, o projeto previa expedientes regulatórios que, na prática, eram instrumentos velados de censura.


O anúncio da criação das redes de rádio e tevê a serem custeadas pela União ocorre no momento em que o PT voltou a cobrar do governo a ‘democratização da comunicação’, por meio da concessão de rádios e tevês a ONGs e movimentos sociais. Há um mês, em Salvador, a cúpula do partido acusou as empresas particulares de comunicação de constituírem um ‘monopólio conservador e prejudicial ao País’. Na Câmara, deputados petistas estão exigindo um pente-fino nas concessões de rádio e televisão.


Como os planos do governo ainda são embrionários, é cedo para saber se a iniciativa é séria ou se é mais uma tentativa petista de interferir na liberdade de informação e aumentar o número de vagas para ‘companheiros’ na máquina estatal. Na realidade, o Executivo não tem a menor necessidade de rádios e tevês estatais para divulgar suas atividades, pois ele já é a principal fonte das informações divulgadas pelos órgãos da mídia privada.