Há algum tempo,em outubro de 2005, o jornalista Renato Rovai advertia quanto aos riscos que o tipo de jornalismo praticado por Diogo Mainardi e outros articulistas de Veja trazia para a imprensa como instituição e o jornalismo como profissão.
‘Os tiros do padrão Veja de jornalismo estão sendo dados enquanto o silêncio acomodado da maior parte dos jornalistas segue impávido. Parece que é assim mesmo, que faz parte do jogo. Não é. Não se pode deixar que seja. Os profissionais mais jovens ainda merecem um desconto. Os mais experientes, calados, são cúmplices. Estão ajudando a desmoralizar a profissão. E pagaremos todos por isso’ (revista Fórum, outubro de 2005).
Em dezembro do mesmo ano, Olavo de Carvalho, em cruzada aberta contra o Observatório da Imprensa, afirmava que pelos critérios da esquerda ‘o simples salário de jornalista profissional, tão limpo quando pago a esquerdistas, se torna uma espécie de propina corruptora quando vai para o bolso de alguém politicamente incorreto’.
‘Uma prostituta de classe’
O ‘esquerdista’, subsidiado por uma tão onipresente quanto imaginária ‘Internacional Comunista’, sempre atuante nos arrazoados do auto-intitulado ‘filósofo’, seria o jornalista Alberto Dines, editor do Observatório. O ‘politicamente incorreto’, o iconoclasta de estimação da família Civita era, obviamente, o polemista Diogo Mainardi. É assim que Olavo costuma reorganizar as questões que o atormentam no campo das idéias: com simplificações e rótulos. É nesse marco que se processam suas ‘impagáveis abstrações.’
Passados três anos da publicação dos dois textos, o ‘oráculo de Ipanema’, em entrevista ao jornal-laboratório da Facha (edição nº 23, julho/agosto de 2008), tece considerações sobre o que julga ser a natureza de uma categoria profissional. Confirma os piores temores de Rovai e, por conseqüência, esclarece as dúvidas ‘olavianas’ sobre os critérios que definem o tipo de pagamento pelos serviços prestados por ela.
Lembrando da argumentação usada pelo pai do articulista, o publicitário Ênio Mainardi, para trocar as redações pela publicidade (‘se era para ser uma prostituta, seria, então, uma prostituta de classe’), os estudantes Daniela Lima e Diego Ferreira perguntaram a Diogo se ele se considerava uma prostituta no jornalismo.
Distância diminuiu
A resposta não podia ser mais categórica:
‘Hoje em dia, jornalistas e publicitários ganham a mesma coisa, saíram da Vila Mimosa para as ruas mais elegantes da cidade (…). Talvez seja essa a minha maior preocupação: ser menos prostituta possível.’
Não ficou claro se Mainardi produziu uma peça de péssimo gosto ou tentou esboçar análise de um novo projeto de construção da identidade do campo jornalístico brasileiro. Uma tosca tentativa de iniciar o debate sobre novas funções éticas da imprensa. Um processo que passa pela redefinição de como se dará a elaboração crítica da informação a partir de insuspeitas exigências da nova tecnologia.
Enquanto os especialistas não se debruçam detidamente sobre as questões levantadas na entrevista, uma coisa é certa: a distância entre Vila Mimosa, famosa área de prostituição do Rio de Janeiro, e a redação de conhecida revista semanal, na Avenida das Nações, 7221, em São Paulo, diminuiu consideravelmente. Em breve, será muito comum ouvirmos as pessoas dizerem que certo tipo de articulismo é a profissão mais antiga da humanidade. E, no entanto, estarão lidando com fenômeno recente e urbano.
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Professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), Rio de Janeiro, RJ