A edição de quinta-feira (27/8) do programa radiofônico do Observatório da Imprensa transmitiu uma entrevista com Diogo Moyses, da ONG Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, que realiza na Universidade de São Paulo um curso sobre políticas públicas de comunicação.
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Como surgiu essa necessidade por promover esse curso na USP?
Diogo Moyses – O Intervozes trabalha basicamente com regulação em políticas de comunicação. É uma ONG que tem como objetivo lutar pela democratização da comunicação ou, em outras palavras, pela garantia do direito à comunicação. E como a maioria dos nossos integrantes é formado em algum curso de comunicação (Jornalismo, Radialismo, Relações Públicas, Publicidade), desde sempre avaliamos que os cursos, hoje, de comunicação não suprem uma lacuna indispensável, não só para o exercício da profissão, mas uma lacuna indispensável para a formação do comunicador, que é conhecimento vinculado às políticas de comunicação, como se organizam as comunicações no Brasil.
Você quer dizer que a universidade não discute políticas públicas de comunicação dentro do currículo normal dos cursos de comunicação?
D.M. – Não tenho a menor dúvida disso. Os currículos, majoritariamente – não dá para generalizar – são vinculados à formação de quadros para o mercado. E essa discussão sobre como se organiza o ambiente das comunicações no Brasil simplesmente não existe nos cursos de comunicação de graduação no Brasil. São poucos, inclusive, os cursos de pós-graduação ou as linhas de pesquisa de pós-graduação que são vinculados a essa temática.
Como um dos coordenadores da pesquisa que resultou no livro Sistemas Públicos de Comunicação no Mundo, como vê o retrato do Brasil nessa questão?
D.M. – O Brasil ainda está engatinhando – se a gente for fazer uma análise honesta e sincera – na construção do seu sistema público de comunicação, que é uma determinação constitucional. Nós temos algumas experiências desde a década de 1960, temos emissoras estaduais vinculadas aos governos do estado, e tínhamos até recentemente duas experiências que poderíamos chamar minimamente de iniciativas de comunicação pública relevantes. Temos a Fundação Padre Anchieta e tínhamos a TVE do Rio de Janeiro, vinculada à Fundação Roquette Pinto. E tivemos recentemente a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que pode ser chamada de o grande ponto de virada na construção do sistema público de comunicação no Brasil.
O fato de haver uma grande concentração de meios cria uma força antagônica? E também o fato de muito parlamentares serem donos de concessões de rádio e televisão cria forças antagônicas que dificultam a criação desse sistema no Brasil?
D.M. – Não tenha dúvida. Para as emissoras comerciais, tudo o que elas não querem é um concorrente de peso. Independentemente desse concorrente não estar disputando verbas publicitárias, é um concorrente pela audiência. E essa é uma questão muito importante para os meios de comunicação comerciais, especialmente as emissoras de televisão. Mas essa é uma questão que tem sido tema, não só das emissoras de televisão comerciais, como dos jornais também. Recentemente tivemos dois editoriais, um da Folha de S. Paulo e outro do Estado de S.Paulo, pedindo inclusive o fechamento da TV Brasil, dizendo que ela estava só gastando o dinheiro do cidadão e não servia para nada. E essa é uma posição que não é nova. Ela é conhecida de todos aqueles que trabalham com esses temas. Os veículos comerciais tendem a criar dificuldades para a construção de um sistema público. E é importante que os gestores desses sistemas públicos saibam disso e entendam que ou você constrói uma legitimidade junto à sociedade, ou dificilmente as emissoras públicas de televisão, de rádio e as agências públicas de notícias vão prosperar.