O seminário organizado pela Câmara dos Deputados para discutir a atualização e a consolidação das leis que organizam a comunicação no país, realizado na terça-feira (10/11), foi uma oportunidade para o esclarecer as demandas do setor empresarial sobre um novo marco regulatório. Demandas que devem, inclusive, dar o tom da participação do empresariado na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, que acontece entre os dias 14 e 17 de dezembro, em Brasília. O encontro foi uma iniciativa do Grupo de Trabalho de Consolidação das Leis, coordenado pelo deputado José Mentor (PT-SP).
Os deveres dos produtores de conteúdo na internet foi um dos assuntos centrais no debate. O diretor-geral do Grupo RBS em Brasília, Paulo Tonet Camargo, afirmou que antes de pensar na consolidação das atuais leis, é necessário revisá-las. Uma das preocupações colocadas por Paulo Tonet diz respeito à proliferação da produção de conteúdos pelas empresas de telefonia, principalmente os jornalísticos.
Ele lembrou que empresas jornalísticas têm restrições quanto à propriedade por pessoas jurídicas e por empresas de capital estrangeiro, mas não as teles. Segundo ele, um portal de internet, por exemplo, é empresa jornalística e tem previsão constitucional de como devem funcionar. ‘Onde é que fica o princípio constitucional da igualdade?’, indagou.
Participação estrangeira
Já o representante de uma das maiores empresas de telefonia do país tem opinião diferente sobre os portais. ‘Vejo na internet uma instituição de ensino; um parque de diversões; um cassino; uma biblioteca. Tem um pouco de jornalismo também, mas é um pouco de exagero reduzir a internet a apenas uma das coisas que ela é’, disse João de Deus, diretor de Planejamento Executivo da Oi.
A advogada Vanda Nogueira também defendeu regras para os sites noticiosos. Segundo ela, os portais estão fazendo jornalismo sem nenhuma regulamentação. ‘Temos que regulamentar os portais como comunicação social e desregulamentar e desburocratizar um pouco a radiodifusão, chegando a um denominador comum’, disse ela.
O consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, afirmou que a pasta não tem uma posição sobre o assunto. Mas defendeu que há provedores de acesso que não devem estar sujeitos à regulação ou controle. ‘Só vale a pena discutir uma regulação para os provedores de conteúdo que seja exeqüível. Como faríamos com servidor colocado fora do país? Estariam submetidos às mesmas regras estabelecidas para empresas jornalísticas e de radiodifusão? E como faríamos em relação aos blogueiros?’, questionou.
A Constituição limita a participação de capital estrangeiro nas empresas de comunicação (rádio, televisão e imprensa escrita) a 30% do capital com direito a voto e do capital total. Até 2002, a participação estrangeira era proibida no setor e a propriedade de meios de comunicação era permitida só a brasileiros natos ou com mais de dez anos de naturalização.
Marco legal
O foco do seminário, porém, não era a discussão específica da regulamentação da internet. O evento estava voltado a colher opiniões a respeito do Projeto de Lei nº 3.516/2008, que tramita na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Bruno Rodrigues (PSDB-PE). Ele pretende organizar – e não alterar – as leis relativas à comunicação em um só dispositivo legal. Hoje, a legislação do setor é feita por um conjunto disperso de regulações, como o Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, e a Lei Geral de Telecomunicações, de 1997, e um outro grande número de leis específicas, como a Lei da Radiodifusão Comunitária e a Lei do Cabo.
Enquanto a convergência aproxima os serviços de transmissão de voz, dados e imagens, a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abert) acredita que a separação no marco regulatório entre a radiodifusão e telecomunicação deve ser mantida. O diretor jurídico da entidade, Rodolfo Machado Moura, embora considere que a atual legislação precise ser atualizada, defende a consolidação das leis como um primeiro passo. Uma das premissas é a divisão do serviço de transporte (telecomunicações) do serviço de conteúdo (radiodifusão). ‘Pelo menos enquanto isso estiver posto na Constituição’, argumentou.
A advogada Vanda Nogueira, consultora na área da radiodifusão e ex-funcionária do Ministério das Comunicações, defendeu a atual legislação da radiodifusão, o CBT, dizendo que ‘só uma lei forte dura 40 anos’. Segundo ela, a lei da década de 60 não atrapalhou nenhum avanço tecnológica e precisa apenas de reparos. Para ela, os reparos seriam para desburocratizar o setor e citou como exemplo o projeto de lei do atual ministro Hélio Costa que desobriga a notificação das mudanças societárias das concessionárias [saiba mais].
Alguns deputados também participaram do seminário para discutir o papel do Legislativo na modernização das leis para a área. Alguns deles avaliam que é preciso revisar leis antes de consolidá-las. O deputado Gilmar Machado (PT-MG), por exemplo, criticou o fato de ainda existirem artigos sem regulamentação no Capítulo da Comunicação Social da Constituição. ‘Se a TV é uma concessão, elas têm que participar da regionalização da comunicação’, citou, em referência a um dos pontos desregulamentados. ‘Precisamos cobrar das concessionárias uma melhora nas suas grades de programações’, completou.
A consultora Vanda Nogueira fez uma defesa em sentido totalmente oposto. Pregou o fim de exigências que ela considera ‘excessos de regulamentação’. Entre os excessos, citou destinar no mínimo 5% do horário de sua programação diária à transmissão de serviço noticioso; limitar no máximo 25% do horário de sua programação diária o tempo destinado a comerciais; integrar gratuitamente as redes de radiodifusão quando convocadas pela autoridade competente.
O coordenador de Comunicação da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Josué Lopes, fez questão de frisar os problemas da atual legislação, principalmente para o setor que representa. Segundo ele, é preciso alterar os marcos legais para enquadrar a radiodifusão comunitária no sistema público e permitir que as rádios comunitárias operarem em rede, por exemplo. Ele também defendeu a regulamentação do Capítulo V da Constituição Federal e a submissão do concessionário de rádio e TV ao controle social, por meio, por exemplo, da reinstalação do Conselho de Comunicação Social do Senado.