Saturday, 07 de September de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1304

Banda larga e democracia de alta intensidade

O povo brasileiro tem hoje a capacidade de passar de uma democracia simplesmente representativa para uma democracia deliberativa de alta intensidade. Por isso, temos que lutar por uma banda larga barata, estável e com controle público, defendeu o sociólogo Sérgio Amadeu, doutor em Ciência Política pela USP, ex-presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, durante o debate “Cultura digital, democracia e governos no Século XXI”, realizado no 12º Fórum Internacional de Software Livre (Fisl12), na última semana em Porto Alegre.

Amadeu argumentou que nunca houve tanto poder de processar informações quanto existe hoje. Isso possibilita aos cidadãos acesso a tudo que se passa em relação ao governo, e, como consequência, o poder de questioná-lo. “É preciso que os dados do governos sejam colocados em plataformas que possam ser acessadas livremente pelos cidadãos. É preciso aumentar o controle público para aumentar a eficiência do governot”, destacou o sociólogo, defendendo ainda a criação de um marco civil da internet.

Nesse processo de aposta em uma maior democratização, Amadeu ressaltou a importância do software livre, “desenvolvido de modo transparente”, cujas especificações são todas documentadas de maneira acessível, podendo ser usado independente de qualquer empresa ou produto. “O formato aberto em um governo é vital, porque tem um grande poder cibernético. Os formatos proprietários podem limitar, bloquear a nossa ação e criam dependências. Porque, com o passar dos anos, se o software proprietário onde se armazenou dados ficar ultrapassado, nós precisaremos de uma autorização da dona do formato para acessá-los”, afirmou.

Mas a leitura de formatos exige uma intermediação – abertos (não proprietários), eles podem garantir um governo transparente, seus dados possam ser lidos sem restrição pelas máquinas dos cidadãos. “Isso é a base para uma cidadania deliberativa diante das possibilidades da revolução informacional e dessas novas formas de controle da vida”, garantiu Amadeu.

Democratização radical

O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, no mesmo evento, enfatizou que em muitos países a sociedade vem se organizando através da internet e mostrando o poder dessa ferramenta. “Hoje, a internet é capaz de se colocar na cena pública de maneira ostensiva. A democracia parlamentar, de regra, sempre teve uma reserva de valor de exclusão. Tu não tinhas como te representar sob o controle da opinião pública, seja pela má formatação dos partidos políticos, pela ausência de um projeto mais consistente, com as tuas posições diretas (como cidadão), sem a mediação dos instrumentos democráticos tradicionais”, avaliou. Por isso, segundo o governador, é necessário rever a postura do governo com relação às redes sociais “que surgiram à margem do processo político”.

De acordo com Tarso Genro, essa nova forma de organização, “ao contrário do que afirmam as vozes neoliberais, é que abre uma porta para a democratização radical do Estado e dá valorização ao conhecimento da informação capaz de circular entre todas as classes sociais”. O governador gaúcho garantiu ainda que “os processos de dominação do capitalismo podem ser quebrados através da troca de conhecimento”.

Mas a rede cibernética é, ao mesmo tempo, de informação e de controle, poderou Amadeu. E, se a inteligência coletiva é a principal característica da cibercultura, é necessário incentivá-la. “É preciso reconhecer que hoje nós superamos uma sociedade simplesmente de massa. Somos uma sociedade individualista, mas colaborativa”, avaliou. Desta forma, sustentou o sociólogo, o governo deve apostar numa cultura de compartilhamento de dados, no incentivo às tecnologias colaborativas entre as escolas. “O governo pode ainda incentivar uma tecnologia que não é criada por empresas ou universidades, mas através da troca de informações e conhecimentos dos cidadãos. Feita por hackers abertos, por biotecnologia de garagem, com ciência de bairro. É preciso aprender criando, recombinando tecnologias”, afirmou Amadeu, ao defender, por meio da educação para a cibercultura, a viabilidade de um governo transparente, interativo e inovador.

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[Da Redação FNDC, com a colaboração de Miriã Isquierdo]