Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Conferência quer intervir na mídia

A maioria das propostas encaminhadas pelos ministérios, sindicatos e organizações não-governamentais à 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) quer mais regulação do Estado sobre a mídia e, principalmente, mais favores do governo. Entre as ideias tiradas nas conferências regionais, preparatórias para a 1ª Confecom, está a de criar um Conselho Nacional de Comunicação, vinculado à Presidência. Outra proposta é a de recriação da Embrafilme, extinta no início de 1990.


Esse conselho, que lembra a proposta de criação do polêmico Conselho Nacional de Jornalismo – ideia arquivada, que agitou o primeiro mandato do presidente Lula (2003-2006) por se destinar a intervir na produção de reportagens –, servirá para promover ‘o aperfeiçoamento do setor e viabilização do novo marco regulatório’.


Das propostas que, na prática, são reivindicações de algum tipo de acesso facilitado aos cofres públicos, a mais comum é a que pede uma reserva de parte das verbas de publicidade oficial para ‘veículos alternativos comunitários’ e jornais de pequena circulação.


Em vez de regulação objetiva, as propostas têm caráter interventor a pretexto de estabelecer o equilíbrio entre ‘os interesses da população’ e os interesses dos ‘grandes grupos empresariais’. Por esse caminho trafegam ideias que vão da regulação de programas religiosos nas emissoras de rádio e TV à defesa do ‘controle público dos meios de comunicação’.


Para o presidente da comissão organizadora da 1ª Confecom, Marcelo Bechara, do Ministério das Comunicações, a intenção da conferência não é aumentar a participação do Estado na mídia.


‘O sistema privado é muito bem sucedido. Tem bom conteúdo, promove o entretenimento e presta um serviço importante. Mas a comunicação pública tem outra visão, um ritmo que não segue a mesma lógica’, afirma ele. ‘Não acho que seja maior participação do Estado. Fica parecendo que o Estado quer tomar o lugar de alguém, mas isso não existe.’


A pulverização da publicidade oficial pelo País, no entanto, é vista como uma forma de tentar coibir a produção de reportagens contrárias aos interesses do governo.


‘Em vez de aumentar o alcance da publicidade oficial, o governo deveria reduzi-la drasticamente e estabelecer regras muito claras. Há um risco enorme de ser uma tentativa de intimidar o jornalismo investigativo’, afirmou o coordenador de projetos da ONG Transparência Brasil, Fabiano Angélico.


Desde que Lula convocou a Confecom, por decreto assinado em abril, os municípios e Estados iniciaram os debates para levar as teses à conferência nacional. Mas, alegando o caráter pouco democrático dos debates, amplamente dominados por representantes do governo ou contrários às empresas, seis representantes das redes privadas abandonaram as discussões. Permaneceram apenas duas, a RedeTV! e o grupo Bandeirantes.


Programas religiosos


A conferência será palco de disputa de interesses específicos. As entidades sindicais, por exemplo, trabalharão para ter direito a um canal próprio de televisão, proposta já encaminhada à Confecom pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB) e União Geral dos Trabalhadores (UGT).


Rádios e TVs comunitárias querem ter direito a uma cota de publicidade oficial, subsídio para a compra de equipamentos, criação de um fundo alimentado com recursos das empresas comerciais de comunicação, anistia e indenização para quem foi preso pela Polícia Federal por manter rádios sem autorização, as chamadas rádios piratas.


Dentre as propostas já levadas à Confecom, a que mais deve gerar polêmica trata da regulação pelo governo da ‘prática de proselitismo religioso’ no rádio e na TV. Segundo a Secretaria de Comunicação Social do governo (Secom), a programação das empresas de radiodifusão deve ser destinada ‘prioritariamente para a difusão de programas educativos, culturais, artísticos e informativos’.


Outra sugestão, também da Secom, é ‘coibir a comercialização do tempo de programação’ pelas emissoras de rádio e TV. Algumas delas, inclusive, vendem parte de sua programação para programas religiosos.


‘Há necessidade premente de coibir a venda de espaço na radiodifusão, porque a concessão, permissão e autorização não podem ter sua titularidade e seu controle repassados nem em sua totalidade e nem parcialmente a outros’, defendeu a Secom na sugestão encaminhada à Confecom.


Todas as propostas discutidas e aprovadas durante a conferência, entre os dias 14 a 17 de dezembro em Brasília, serão depois compiladas no documento final da Confecom. ‘A conferência é propositiva, não cria lei, não haverá um decreto. Mas o Congresso pode usar as informações como subsídios’, afirmou Bechara.

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