Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Setor tenta ir além da Apple e do Android

O robô que simboliza o Android, sistema operacional desenvolvido pelo Google, está por todas as partes no hall de exposições do Mobile World Congress, evento de telefonia móvel que ocorre nesta semana, em Barcelona. Desenhadas no chão, as figuras formam um caminho que leva até o estande do Android, onde os visitantes deparam com uma legião de robôs, em todos os tamanhos possíveis. Nada poderia ser mais emblemático. A proliferação dos robozinhos nos corredores da feira mais importante do setor vem em um momento em que operadoras e desenvolvedores de software acendem o sinal amarelo para o crescente domínio do Android e do iOS, sistema operacional da Apple, no mercado de dispositivos móveis.

A espanhola Telefónica anunciou, ontem, uma parceria com a fundação Mozilla para desenvolver uma nova plataforma para telefones móveis, que usará os códigos do programa de navegação Firefox e será baseada na tecnologia HTML5. A ideia é constituir uma alternativa aos dois sistemas dominantes. “Todo mundo está buscando qual vai ser o terceiro ecossistema”, afirmou Carlos Domingo, diretor de desenvolvimento de produtos e inovação da unidade Telefónica Digital. A expectativa é de que o primeiro modelo chegue ao mercado antes do fim do ano e custe menos de € 100.

A americana Qualcomm fornece os chipsets [grupos de componentes que trabalham em conjunto com o processador] usados nos testes dessa nova plataforma. “Ainda não sabemos se vai funcionar, mas apoiamos a ideia de criar um sistema operacional mais aberto que os existentes”, disse o presidente da companhia na América Latina, Rafael Steinhauser.

Aplicativos baseados em HTML5

O objetivo inicial é desenvolver aparelhos mais baratos que os modelos mais simples baseados em Android, que hoje custam ao redor de € 100 e explicam a popularização do sistema do Google. “Queremos que os smartphones proliferem na América Latina”, disse Domingo. Mas a explicação para a entrada da operadora em um terreno que não é sua especialidade vai além disso. A Telefónica também quer reduzir sua dependência dos aparelhos da Apple e do Google. “Há uma cadeia de valor e há um ponto dessa cadeia que é um duopólio”, disse Domingo. Para ele, ao abrir essa cadeia cria-se valor porque os aparelhos ficarão mais baratos e o mercado como um todo deixará de ficar restrito a apenas duas plataformas.

A Telefónica está procurando outras operadoras para compor a aliança. De qualquer forma, não está sozinha na defesa dos sistemas abertos. O presidente da China Mobile, Li Yue, também defendeu a ideia de promover as plataformas abertas. A maior operadora do mundo, com 700 milhões de assinantes, tem acordo com universidades na China para desenvolver programas para celular. A loja de aplicativos da companhia tem 169 milhões de usuários. “Em comparação com a Apple Store, ainda temos um longo caminho, mas estamos crescendo”, disse o executivo, que participou do painel de abertura do evento.

Maior rede social do mundo, o Facebook atribui parte de seu sucesso ao fato de não estar restrito a nenhuma plataforma específica. “Posso publicar uma foto com o iPhone e um amigo abri-la com um [telefone] Android”, afirmou Bret Taylor, principal executivo de tecnologia do Facebook. A companhia, que prepara sua oferta inicial de ações, anunciou algumas medidas para promover o desenvolvimento de aplicativos baseados em HTML5, ou seja, que não dependam nem dos iPhones nem dos modelos Android.

Celular com câmera de 41 megapixels

A razão é simples: dos 425 milhões de pessoas que usam o Facebook pelos dispositivos móveis, a grande maioria o faz de aparelhos que não usam nem a plataforma do Google nem a da Apple. “Os usuários da web móvel são mais numerosos que os do Android e do iOS juntos”, destacou Taylor. Na avaliação do executivo, os dois sistemas operacionais foram fundamentais para desenvolver a internet móvel e o mercado de celulares. “Mas a web é uma terceira grande plataforma”, ponderou. Indagado se o Facebook estaria desenvolvendo seu próprio celular, Taylor disse que não poderia comentar projetos por causa do processo de abertura de capital da empresa.

No fim do terceiro trimestre de 2011, o Android estava presente em mais da metade dos aparelhos móveis equipados com sistemas operacionais. O iOS estava em 15% desse tipo de dispositivo, enquanto o Windows Phone aparecia, mais distante, com 1,5%, segundo dados da consultoria Gartner. Naquele momento, porém, a Nokia não havia lançado seus primeiros modelos baseados no Windows Phone. A estreia da companhia finlandesa ocorreu no fim de outubro. Ontem, em Barcelona, a empresa apresentou um novo celular baseado no sistema operacional da Microsoft para competir com os telefones Android mais baratos. A previsão é que o Lumia 610 chegue ao mercado por € 189. “Estamos demonstrando que podemos mudar o rumo da Nokia”, disse o executivo-chefe da empresa, Stephen Elop.

A Nokia também lançou um telefone móvel com câmera de 41 megapixels, que permite tirar fotos e gravar vídeos em altíssima resolução. A questão é que o aparelho está baseado no sistema operacional Symbian, que mais cedo ou mais tarde será aposentado pela companhia porque não tem conseguido competir com os modelos da Apple e do Google no mercado de smartphones.

30% sobre a venda de conteúdo

Essa preponderância de dois sistemas operacionais desperta, entre os executivos do setor, o receio de que se reproduza na telefonia móvel o que se viu na indústria de computadores, que foi dominada por uma única plataforma (o Windows). É por isso que muitas empresas têm se empenhado para encontrar caminhos alternativos.

O jornal britânico Financial Times informou ter acumulado 1,7 milhão de visitantes em seu aplicativo para dispositivos móveis baseado em HTML5. De acordo com Rob Grimshaw, diretor do FT.com, o número é bem maior que o de usuários que acessavam o aplicativo baixado pela loja da Apple. O Financial Times e outras empresas de mídia têm optado por sair da Apple e desenvolver aplicativos em HTML5 para driblar a taxa de 30% que a companhia americana cobra sobre a venda de conteúdo. (A repórter viajou a convite da Qualcomm.)

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[Talita Moreira, de Barcelona, para o Valor Econômico]