Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Especialistas discordam do conceito de neutralidade

O Marco Civil da Internet, que deverá ser aprovado em comissão especial neste segundo semestre, ainda causa protestos de alguns especialistas do setor. O advogado Pedro Dutra e o professor da Fundação Getúlio Vargas Artur Barrinouevo discordam do conceito de neutralidade de rede da proposta e do papel atribuído ao CGI. A discussão aconteceu durante a ABTA 2012, com a presença do relator da matéria, Alessandro Molon (PT/RJ)

Para Barrinouevo, o Marco Civil falha ao não permitir que as teles possam fazer um gerenciamento “inteligente” das redes e, assim, impedir que haja problemas de congestionamento. “Seria importante que o nosso projeto deixasse claro as formas de gerenciamento de rede aceitáveis”, afirma ele.

Para o professor, ao permitir que os provedores tenham a capacidade de criar planos com preços diferenciados, cria-se um ambiente propício para o surgimento de novos provedores. Além disso, para ele, restringir os provedores a uma qualidade única resultará na redução da qualidade média das redes e desestimulará o investimento nesta infraestrutura.

Já o advogado Pedro Dutra discorda do fato de que as exceções prevista à neutralidade sejam regulamentadas por decreto. “O decreto vai engessar a regulação e vai engessar a Internet”, afirma ele. Outro ponto criticado pelo advogado foi o fato de o CGI ficar responsável por criar as recomendações segundo as quais serão definidas exceções à neutralidade. Essa tarefa, na opinião dele, deveria ficar a cargo da Anatel, uma vez que o CGI é um órgão consultivo, que não tem competência regulatória. “Esse equívoco vai gerar inúmeras preocupações e eventuais contestações”, afirma.

Para ele, essa competência deveria ser dada à Anatel que “tem a estrutura formal de órgão de intervenção do Estado na economia”. Para o advogado, a atribuição do CGI pode também ferir a competência do Cade em decidir sobre concorrência. “Quando o CGI recomenda o que é aceitável ou não, ele está decidindo o que é concorrencialmente aceitável ou não”, argumenta.

O deputado Alessandro Molon considera que essa questão foi superada. O relatório preliminar dizia que o decreto deveria “respeitar” as recomendações do CGI. Na versão final, Molon trocou o verbo por “ouvir”. Assim, para o deputado, não existe mais o “caráter vinculativo” das recomendações do CGI ao decreto. “A presidência vai ouvir quem ela achar que deve, inclusive o CGI”, diz ele.

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“Marco Civil da Internet serve para garantir que ela continue sendo como é”, diz Molon

Durante a Sessão Especial realizada nesta quarta-feira, 1º, durante a feira e congresso ABTA 2012, o Marco Civil da Internet – projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados desde o ano passado – foi alvo de discussão. O deputado federal e relator do Marco Civil Alessandro Molon (PT/RJ) explicou os principais pontos do projeto de lei: liberdade de expressão, neutralidade da rede, privacidade, atuação do poder público, responsabilidade civil de terceiros e guarda de registros (logs).

Um dos pontos que gerou mais controvérsia no debate foi a neutralidade da rede, isto é, o princípio que afirma que todas as informações que trafeguem na Internet devem ser tratadas da mesma maneira, sem prioridade. O projeto de lei prevê que os parâmetros de neutralidade devem ser indicados pelo Comitê Gestor da Internet (CGI). Esses princípios orientariam a regulamentação da Presidência da República.

O conselheiro da Anatel Marcelo Bechara afirmou que a fiscalização da neutralidade deve ser feita pela agência, ganhando adesão do advogado Pedro Dutra: “Quando o Comitê decide o que é discriminativo ou não, ele deixa de recomendar e passa a decidir, subtraindo competências da Anatel e passando a ter função regulatória”. Para ele, a Anatel deveria propor regulamentos, uma vez que este é o momento de fortalecer as agências reguladoras.

O professor Arthur Barrionuevo, da FGV, acrescentou que uma gestão de rede razoável deve ser definida primeiramente ao verificar se a prática discriminatória é tecnicamente necessária. “Sem dúvida precisamos de respostas regulatórias aos problemas de discriminação, mas não pode ser uma camisa de força”, afirma, acrescentando que uma Internet muito democrática e ao mesmo tempo muito lenta não iria atender às demandas da sociedade. O deputado Molon acatou as sugestões, mas afirmou que o CGI seria apenas um órgão consultivo da Presidência, que não impediria o poder Executivo de ouvir outros órgãos. “Para garantir que a Internet permaneça aberta à inovação, temos que garantir que a Internet seja livre e acessível a todos”, afirma.

O debate terminou com uma comparação entre os modelos regulatórios da Internet no Brasil e em outros países, lembrando que apenas Holanda e Chile possuem Marcos Civis para os meios. “Vamos aprender muito, mas temos de ter a certeza que podemos servir de exemplo para influenciar positivamente outros países”, finalizou Molon.

Histórico

O deputado lembrou que o projeto começou a ser debatido no Ministério da Justiça por uma demanda da sociedade, que exigia que se criasse uma lei que garantisse direitos na web antes que se discutisse a criminalização dos atos praticados nela. Esta é a primeira lei geral da Internet, colocada em discussão 17 anos após a oferta inicial dos serviços, em 1995.

Como é um Marco Civil, e não Penal, questões como cibercrimes e direitos autorais não são discutidas pela lei. “O Marco Civil da Internet serve para garantir que ela continue sendo como é”, explica Molon, acrescentando que é fundamental ter um parâmetro legal para a rede. Mas outros pontos ganham bastante destaque, como a proteção à intimidade da vida privada das pessoas e o direito ao não fornecimento de dados conexão e navegação para terceiros sem consentimento prévio e informado do usuário. “É direito do usuário ter informações claras e completas sobre o uso e a coleta de seus dados pessoais”, explica o deputado.

Além da transparência nas práticas de gerenciamento no tratamento dos dados, a lei prevê também que no término da relação entre duas partes, as informações sobre os usuários sejam excluídas pela empresa. “Se o usuário sair de uma rede social, por exemplo, seus dados não poderiam continuar com a empresa, teriam que ser apagados”, afirma. Outro ponto tocado pelo Marco é a livre manifestação: os usuários que tiverem conteúdos removidos de qualquer espaço da Internet teriam o direito de se defender e divulgar as razões que levaram à remoção.

Por outro lado, o texto do Marco Civil também retira a responsabilidade dos provedores por conteúdo gerado por terceiros, eximindo empresas como o Google, Facebook e Twitter de serem punidas por postagens de seus usuários. Os provedores só seriam responsabilizados se mantiverem o conteúdo no ar depois de ser julgado como ofensivo pela Justiça. (Bruno Borin)

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Bechara propõe prazo para CGI elaborar as recomendações sobre exceções à neutralidade

O conselheiro Marcelo Bechara sugeriu ao deputado Alessandro Molon (PT/RJ), relator do Marco Civil da Internet, que seja estabelecido um prazo para que o CGI.br defina as recomendações que deverão ser consideradas pela Presidência da República na elaboração do decreto que regulamentará as exceções à neutralidade de rede.

“É interessante que se estabeleça um prazo para dar ao CGI a noção de responsabilidade e prioridade que esse assunto merece”, disse Bechara nesta quarta, 1º, durante o Congresso ABTA 2012. O deputado considerou a sugestão uma “boa ideia” e se comprometeu a “refletir sobre ela”.

A sugestão prova que a Anatel não está ressentida com o fato de não ter sequer sido mencionada no projeto de lei do Marco Civil. O conselheiro Marcelo Bechara diz que “a agência está muito tranquila em relação à proposta”. Na sua visão, a Anatel tem a competência natural sobre a neutralidade de rede, uma vez que cabe à agência regular as redes de telecomunicações. E, mais do que isso, para ele é claro que a neutralidade é condicionada às redes de telecom. “Eu não tenho dúvida de que se trata de telecomunicações. A proposta fala em comutação, roteamento, que são elementos basilares de telecomunicações”, afirma ele.

O conselheiro ainda mencionou que nos condicionamentos colocados para a aprovação da fusão da Brasil Telecom com a Oi a Anatel já inseriu a necessidade de se preservar a neutralidade de rede. O tema também aparece no novo regulamento de SCM – que ainda não foi aprovado pelo Conselho da agência. Segundo o conselheiro, o conceito previsto no regulamento cria condições para preservar a adequada fruição dos diferentes tipos de serviço e garante a priorização aos serviços de emergência, de forma muito semelhante com o estabelecido no Marco Civil.

O deputado Molon concorda que aquela fiscalização capaz de estabelecer sanções às prestadoras só pode ser realizada pela Anatel. Mas, ele observa que, no sentido amplo, outros órgãos poderiam também participar, como é o caso do CGI. O deputado acredita que o Brasil deve ter um órgão específico para regular e fiscalizar a Internet, e para ele esse órgão poderia ser o CGI. “Eu entendo que o Brasil deva ter um órgão específico para regular e fiscalizar a Internet. Queremos ampliar a estruturação e as funções do CGI”, afirma ele.

A iniciativa, se partir do poder Legislativo, esbarra na questão do vício de iniciativa, explica o deputado. O poder Legislativo não poderia criar, por exemplo, novos cargos para o CGI, uma vez que isso incorre em mais custos para o poder Executivo.

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[Helton Posseti, do Teletime]