Nos últimos anos, com o advento de novas tecnologias, previsões sombrias foram anunciadas sobre o futuro do rádio. A internet chegou para acabar com o rádio? Como ouvinte e pesquisador da radiodifusão, acompanhei mudanças que ocorreram envolvendo o veículo desde a década de 1980. A resposta, com base em minhas observações, é sim, com algumas ressalvas. Amante dos chiados das ondas curtas, numa época em que nem se sonhava com emissões online, fui obrigado a me render, nos dias atuais, aos aplicativos das emissoras instalados nos celulares com múltiplas funções (smartphones).
Nas décadas de 1990 e 2000, muito se conjeturou sobre como o rádio poderia transpor fronteiras com um sinal audível e de qualidade. As transmissões por satélite foram saudadas como uma evolução, mas nunca foi fabricado um pequeno aparelho que poderia captar o sinal de uma emissora diretamente do espaço. O que se viu foram pequenas emissoras de ondas médias (OM) e frequência modulada (FM) captando um sinal de estação do centro do país, via satélite, e o retransmitindo em suas frequências em simples aparelhos domésticos.
Recordo que, em 2008, em um encontro de radiófilos, discutíamos como seria este novo aparelho de rádio do futuro, que captaria os sinais das emissoras de quaisquer lugares e que também poderia ser monitorado em quaisquer lugares do planeta. Tal aparelho, atualmente, com certeza, é o telefone móvel. Basta ter acesso à internet e um aplicativo. E funciona. Recentemente, estive em locais interioranos, onde o sinal de celular não era muito intenso. Nos testes que fiz, entretanto, consegui ouvir normalmente a programação da Rádio Gaúcha, cujo aplicativo está instalado no meu aparelho.
“Rádio digital” pouco ou nada evoluiu
Não estou pregando que seja o fim do velho aparelho de rádio. O sinal da telefonia celular ainda é insipiente não só no Brasil, mas em grande parte dos países do Terceiro Mundo. Da mesma forma, o acesso à internet atinge um público ínfimo. O fato é que a possibilidade de ouvir rádio pelo telefone celular está mudando comportamentos, não só entre os ouvintes, como também na maneira como as emissoras fazem sua programação. Como o smartphone possibilita que o usuário tenha uma infinidade de músicas de seu agrado no aparelho, quem sofre com a queda de audiência são as emissoras musicais. Por que depender do programador se eu mesmo posso fazer minha playlist com as que eu gosto? É a lógica para as novas gerações. Sobra uma audiência das antigas gerações de ouvintes, aqueles que tinham seus apresentadores preferidos. Eu mesmo só acompanho programas musicais em emissoras de FM com músicas da década de 1980, produzidos por profissionais experientes (no caso de Porto Alegre, Alexandre Fetter, Mauro Borba e Fabio Codevilla).
Nas grandes cidades, as emissoras que ainda dependem da audiência de ouvintes tradicionais estão mudando seus rumos. Algumas sedimentaram a programação, falando de apenas um tema, como por exemplo, futebol. Outras procuraram enfocar na prestação de serviço para quem está no automóvel engarrafado. Quem não usou a criatividade e utiliza sua concessão apenas para buscar o lucro fácil, acaba arrendando espaços para segmentos religiosos.
Hoje são os smartphones. Amanhã, novos equipamentos poderão compor as emissões de rádio, sempre avançando. Enquanto isso, quase nada evoluiu em relação ao chamado “rádio digital”. Alguns testes foram feitos no país usando os modelos da Europa e Estados Unidos. O fato é que, novas gerações de ouvintes vão surgindo e sendo apresentados às novas tecnologias. Neste ritmo, em pouco tempo, um simples aparelho receptor de rádio será um ilustre desconhecido, igual aos velhos aparelhos movidos a válvulas que poucos ouvintes conhecem nos dias atuais.
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Célio Romais é jornalista, Porto Alegre, RS