Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo

VENEZUELA
Fabiano Maisonnave

Chávez volta a mirar Congresso brasileiro

‘DE CARACAS – O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, disse ontem que o Congresso brasileiro e outros parlamentos ‘arremetem contra a Venezuela’ e que o Legislativo em Brasília emitiu um ‘comunicado grosseiro’, em nova alusão ao requerimento do Senado pedindo que ele reconsiderasse o fim da concessão ao canal de oposição RCTV.

‘O Congresso dos EUA, uma fração do Congresso da União Européia e até o Congresso do Brasil; os jornais do mundo, as emissoras das grandes cadeias -manipuladas por seus donos, representantes da elite mundial, que pretendem impor aos povos sua vontade imperial-, arremetem contra a Venezuela’, disse Chávez, em discurso a simpatizantes transmitido em cadeia nacional de rádio e TV.

Minutos depois, diria: ‘No Brasil, a comissão do Congresso emite um comunicado grosseiro que me obriga a responder. Não aceitamos de ninguém ingerência nos assuntos internos da Venezuela’. E ainda: ‘Não me importa ser catalogado por esses poderosos meios de comunicação em seus espaços dominados pela elite. Que me chamem de tirano, que me comparem a Hitler, Mussolini (…). O que me importa é a dignidade do povo da Venezuela’.

Antes, Chávez chamara o Congresso brasileiro de ‘papagaio’ de seu análogo americano -atitude repudiada pelo governo Lula (leia texto na pág. A23).

Marcha de apoio

Um dia após proibir uma marcha contra o fechamento da RCTV, o governo lançou mão ontem da máquina estatal para promover uma manifestação que reuniu dezenas de milhares de pessoas (não há estimativas confiáveis) em favor do fim da concessão da RCTV, fora do ar desde o último domingo.

A ‘marcha vermelha’ pró-Chávez partiu da zona leste da cidade rumo ao centro. A maioria dos participantes era de funcionários públicos e filiados a programas sociais do governo. Órgãos estatais contribuíram com carros de som e ônibus para os participantes, disseram manifestantes à Folha.

Alguns tinham a identificação oficial, como um caminhão de som do governo metropolitano de Caracas. A reportagem ainda identificou caminhões da Ipostel (correios), do Seniat (fisco), do Instituto Venezuelano de Seguro Social, da PDVSA (petroleira) e da Conatel (reguladora das telecomunicações).

Do carro de som conduzido e seguido por funcionários da TV Telesur, o locutor gritava: ‘O povo diz e tem razão/agora é a vez da Globovisión’, citando a única emissora crítica ao governo. A concessão da Globovisión só vence em 2011, mas o canal é investigado após o governo acusá-lo de incitar o assassinato de Chávez.

Indagado pela reportagem sobre o uso da máquina estatal, o presidente da Telesur, Andrés Izarra, disse que o aluguel do carro fora ‘rateado entre funcionários’. Irritado, disse: ‘O que você quer dizer? Que isso deslegitima a marcha?’.’

Clóvis Rossi

Reação do Brasil traz surpresa a venezuelano

‘Hugo Chávez, ficou surpreso com a reação da diplomacia brasileira a suas críticas ao Congresso, a propósito da não-renovação da licença da RCTV. Essa avaliação chegou, sem maiores detalhes, à delegação brasileira que partiu ontem de Londres para a Índia, chefiada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Nem o Itamaraty nem a Presidência escondiam a torcida para que a surpresa de Chávez não se transformasse em réplica à nota oficial divulgada pelo Itamaraty na sexta, expressando repúdio aos comentários do venezuelano -Chávez dissera que o Congresso brasileiro era ‘papagaio’ do americano por emitir um requerimento sobre o fim da licença à RCTV.

No fim do dia, no entanto, o venezuelano voltaria a mirar o Legislativo brasileiro, embora não tenha citado a nota do Itamaraty. Antes do novo ataque, a avaliação da diplomacia brasileira era a de que uma réplica elevaria o tom de um confronto verbal, que, para o chanceler Celso Amorim, até então não existia. O que havia, disse Amorim, eram ‘arroubos verbais, que, como todos os arroubos verbais, podem refluir’. Mas, acrescentou, é preciso ‘contenção de todos’, o que mostra a torcida para que Chávez não levasse avante a troca de críticas.

Amorim contou também que o embaixador Rui Nogueira, chanceler interino, lhe telefonara para dizer que levara a mensagem do Itamaraty ao embaixador da Venezuela no Brasil, Julio García Montoya, com ‘a força que corresponde’.

Amorim mostra extremo cuidado ao comentar o assunto. Tanto que repete, sempre, o termo ‘supostas declarações’ ou ‘declarações atribuídas’ a Chávez, como se elas não tivessem sido de fato feitas. O chanceler sabe que foram porque, para redigir a nota de repúdio, foram cotejadas diferentes notícias sobre o tema.

O governo brasileiro fez também saber a Chávez que não era da conveniência dele levar avante o tiroteio verbal com o Brasil, um dos poucos países latino-americanos de importância com o qual a relação não vinha enfrentando conflitos.

Chávez já se atritou com Alan García (Peru), Álvaro Uribe, (Colômbia), Vicente Fox (ex-presidente do México), José Miguel Insulza, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos e membro do Partido Socialista chileno, no poder. Causou ainda embaraços a Tabaré Vázquez (Uruguai) e Néstor Kirchner (Argentina).

A diplomacia brasileira esperava de Chávez a mesma contenção mostrada no caso do etanol, quando o venezuelano criticara os biocombustíveis mas, depois, anunciou a compra de álcool do Brasil.’

TELEVISÃO
Laura Mattos

‘YouTube nacional’ levará os melhores vídeos à televisão

‘‘Era uma vez a mídia velha, em tempo de espectador pacífico.’ Segue por aí a propaganda do Fiz TV, site e canal de televisão que estréiam em julho.

O projeto, apelidado de ‘YouTube brasileiro’ em referência ao famoso site de vídeos, funciona assim: qualquer pessoa com uma idéia na cabeça e uma câmera (que pode até ser do celular) na mão grava sua ‘obra’ e coloca no site (www.fiztv.com.br, que já está no ar, em fase de teste).

Uma eleição entre os próprios internautas seleciona os que devem ser veiculados na televisão. A programação do canal Fiz TV será uma seqüência desses melhores vídeos, organizados por faixas temáticas, como Fiz Clipe, Fiz Notícia, Fiz Humor, Fiz Animação etc.

Não haverá apresentadores, a não ser um VJ com programa semanal a respeito dos vídeos recentes mais interessantes.

O Fiz TV, que entra no ar em 30 de julho (o site estréia no dia 1º), marca a volta da Abril à produção de televisão. Em setembro, a editora lança também o Ideal, sobre mercado de trabalho (leia ao lado), e há a previsão de mais dois canais para 2008 e um para 2009.

O responsável pela nova divisão de TV do grupo é André Mantovani, que atuou até março como diretor-geral da MTV Brasil, da qual a Abril é sócia.

Segundo ele, o Fiz TV ‘é mais que o YouTube, porque é um canal de televisão, e menos que o YouTube, porque está só no Brasil’. ‘Nosso objetivo é usar a TV para dar visibilidade a essa produção da internet e organizá-la de modo a ficar interessante para o telespectador.’

Mantovani alerta que nem tudo o que chegar pela internet poderá ser exibido na TV (veja quadro). ‘A TV tem restrições mais sérias do que a internet.’

A seleção será feita por um ‘colegiado’, com representantes de universidades, como USP e Unicamp. ‘Não pode entrar nada ilegal, nem aquilo que utiliza imagens de terceiros.’

Segundo Mantovani, seria vetado, por exemplo, o ‘Tapa na Pantera’, vídeo cômico que ficou famoso no YouTube. Nele, a atriz Maria Alice Vergueiro faz papel de uma senhora sob efeito da maconha. ‘É apologia ao uso de drogas’, diz.

Mas seria aprovado o ‘Vai Tomar no C…’, sucesso recente do mesmo site, em que a atriz Cris Nicolotti interpreta uma música que tem praticamente só o ‘belo’ verso do título.

Também não vale cena gravada das redes de TV. ‘Além de ser ilegal, a pessoa não estaria produzindo, mas sim aproveitando produção alheia.’

E o famoso vídeo que mostra Daniella Cicarelli na praia com o namorado? ‘Esse sim. O cara que filmou produziu aquilo. Mas só seria exibido antes da liminar [obtida pela modelo, que vetou a veiculação].’

Pornografia vale? ‘Não. Digamos que poderia haver a faixa de vídeos Fiz Sexo, mas não uma Fiz Sacanagem’, diz, bem-humorado, Mantovani.

O Fiz TV também fechou acordo com a USP, para veicular obras de alunos, com a ABD (Associação Brasileira de Documentaristas) e com o Instituto Criar, dirigido por Luciano Huck, que ensina jovens da periferia a trabalhar com produção de televisão e cinema.

Quem tiver seu vídeo exibido pela televisão receberá uma remuneração. ‘Não é um valor que deixará ninguém rico, mas o objetivo é estimular a produção audiovisual brasileira.’

Como qualquer canal, o Fiz terá intervalos comerciais.

Novos canais

A associação da Abril com a Telefônica deu gás ao projeto de novos canais de televisão. O grupo Abril foi pioneiro da TV paga no Brasil, com o lançamento da TVA, em 1991.

Além de funcionar como operadora de TV por assinatura (como é até hoje), a empresa no início criou canais próprios, como TVA Esportes, que se tornou a ESPN Brasil. Com a retração do mercado, optou por apenas distribuir canais.

O Fiz TV será veiculado pela TVA e pela Telefônica, mas o objetivo da Abril é fechar contrato com outras operadoras.

TV PAGA DIGITAL PODE TER QUASE 400 CANAIS

O número de canais que ‘cabem’ na TV digital é bem maior do que na analógica. A Net, por exemplo, tem 64 canais analógicos, contra 110 digitais. Se acabar com os analógicos, poderá abrigar cerca de 380 digitais.

PODE X NÃO PODE

Regras do FizTV

VALE

Vídeos caseiros e até profissionais

Qualquer duração

Novelas e séries

Curtas, médias e longas-metragens

Clipes de bandas independentes

Conteúdo erótico

Divulgação indireta de programação cultural

Entram, por exemplo

Clipe ‘Vai Tomar no C…’

Vídeo da Cicarelli na praia antes da liminar que proíbe sua exibição

NÃO VALE

Conteúdo de terceiros, como imagens gravadas das redes de TV

Conteúdo ilegal, como apologia às drogas

Clipes de bandas de grandes gravadoras

Pornografia

Propaganda ou merchandising

Não entram, por exemplo

Clipe ‘Tapa na Pantera’

Vídeo da Cicarelli na praia depois da liminar que proíbe sua exibição’

***

Ideal, o ‘canal RH’, aborda negócios 24 horas por dia

‘O apelido de ‘canal RH’ não agrada muito a André Mantovani, diretor de TV do grupo Abril e responsável pela Ideal, emissora que estréia em 12 de setembro com programas sobre o mundo dos negócios.

‘É limitador para a proposta do canal, que é voltado a carreiras, formação e educação’, diz.

Mas não há como negar que a programação tem tudo a ver com o departamento de recursos humanos das empresas.

Há programas com dicas de como fazer um bom currículo, pedir aumento, se comportar em entrevistas para empregos e em almoço de negócios.

Um dos programas que já tiveram piloto (teste) gravado é o ‘Trajetória’, no qual grandes executivos contam como chegaram lá. O primeiro entrevistado foi Eduardo Angelo, presidente da Brasilprev.

Tem também o ‘Pergunte ao Headhunter’, em que os caça-talentos dos negócios tiram dúvidas dos telespectadores.

Segundo Mantovani, o Ideal foi criado com base em pesquisas de hábitos. ‘Depois da droga -a maior preocupação dos jovens-, vêm a carreira e a formação. O canal Ideal é voltado tanto para quem acabou de sair da faculdade quanto para quem tem cerca de 35 anos e quer crescer profissionalmente.’

Gastronomia

Quem já se deu bem, segundo Mantovani, também pode se interessar. Há um programa de gastronomia para executivos. ‘Hoje, esse mundo corporativo não é algo chato como já foi um dia. Virou um assunto pop, de mesa de bar’, analisa.

O Ideal falará das novidades de tecnologia. ‘Os executivos adoram saber qual é o celular mais moderno, Blackberrys…’

Já estão definidos um programa de empreendedorismo e outro que analisa cases (exemplos) de sucesso no Brasil. ‘Podemos contar, por exemplo, como as Havaianas viraram moda em vários países.’

O Ideal poderá ter também games e reality shows, a exemplo de ‘O Aprendiz’, e comprará programas estrangeiros.

Mantovani nega que o Ideal será um canal de auto-ajuda, como os inúmeros livros que dão dicas ‘infalíveis’ para se dar bem na carreira. ‘Mas poderíamos entrevistar os autores desses best-sellers’, diz.

O Ideal entrará no ar pela TVA, do grupo Abril, mas Mantovani diz que há negociações com outras operadoras.’

Bia Abramo

Novela das oito une prestígio e carisma

‘O ALARME soou na semana passada. Não foi nem uma nem duas vezes que me perguntaram: ‘Você está vendo a novela?’, ‘Escuta, o que você está achando da novela?’. Ou, naquele tom levemente culpado que muitas pessoas assumem ao falar de televisão, confessaram: ‘Putz, a novela me pegou’.

A novela em questão é ‘Paraíso Tropical’, aquela que foi vaticinada ao fracasso logo no início, mas que aparentemente aprumou, em termos de audiência. Agora, deu um passo além, atingindo aquele desejável patamar de prestígio e carisma, que torna o ato de assisti-la perto do imperdível.

As razões são várias e, boa notícia, pouquíssimas dependem desses esteróides de audiência que se tornaram tão comuns nas tramas. Ninguém se ‘viciou’ na novela porque fica esperando alguma mulher ser espancada -embora até tenha rolado um engalfinhamento entre Ana Luísa e Fabiana.

O nome, ou melhor, os nomes são Bebel, Olavo e Jáder. E Marion e Ivan. E Fred e Neli. A novela de Gilberto Braga e Ricardo Linhares conseguiu criar aqueles personagens que fazem o espectador ligar a TV para reencontrá-los -só para ver como eles estão e se continuam adoráveis (ou odiosos, ou intrigantes, ou surpreendentes) como foram deixados no dia anterior.

É como se esses personagens conseguissem ultrapassar a ‘história’ da novela. Se a trama principal ainda escorrega no clichê, se o par central ainda patina num romantismo muito doméstico, importa pouco.

Queremos ver Bebel provocando Olavo e Jáder sofrendo, com ciúme da prostituta. Queremos ver o janota Fred falar de auto-ajuda corporativa com ar compenetrado num momento e chantagear Neli em outro. Queremos ver Marion, a trambiqueira-sênior, dar lições de sua ética bastante particular para Thais, a trambiqueira-júnior.

Há tempos uma novela não causava esse efeito. Em ‘Celebridade’, havia, claro, o par Laura e Marcos, de altíssimo teor sexual e canalhice simpática. ‘Belíssima’, por sua vez, trouxe de novo um par caliente, Safira e Pascoal, além de personagens secundários que garantiam os aspectos mais cômicos da novela. Giovanni e a vilã Nazaré, em ‘Senhora do Destino’, também conquistaram o apreço do público.

Mas o que acontece em ‘Paraíso Tropical’ é um pouco diferente: são os personagens, mais do que a trama, que conseguem criar um universo atraente, no qual o espectador deseja, de algum modo, estar.’

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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 3

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