Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Garotos-propaganda com mandatos

A Rede Globo está veiculando uma serie de mensagens institucionais sobre o teor social de suas telenovelas e seriados. Como sempre impecáveis, impactantes e aparentemente associadas à campanha pela valorização do conteúdo nacional iniciada em 11/2 com um evento – o seminário ‘Conteúdo Brasil, no teatro Tuca, na PUC de São Paulo.

O empenho global é valido e legítimo, mesmo que possa ser visto como forma de diferenciar-se das demais redes privadas e, assim, qualificar-se para os eventuais benefícios a serem concedidos pelos BNDES. Faz parte do jogo concorrencial, não pode ser dissociado da crise que assola o país.

O estilo adotado nas mensagens é o testemunhal, mais convincente e persuasivo. Acontece que dois testemunhos exibidos até agora são, no mínimo, embaraçosos: o do presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), terceiro nome na ordem de sucessão presidencial, e Paulo Paim (PT-RS), vice-presidente do Senado Federal, que na ausência de José Sarney chefia o Poder Legislativo.

Na qualidade de telespectadores anônimos os dois parlamentares têm todo o direito de apreciar, aplaudir e saudar a teledramaturgia platinada. Mostram-se atentos à realidade, preocupados com a formação da sociedade. Mas além dos mandatos, João Paulo Cunha e Paulo Paím representam as mais altas esferas da República e, nesta condição, não podem manifestar-se publicamente a respeito de produções de empresas privadas que, além disso, são concessionárias do Estado.

Em outras partes do mundo esses endossos a empreendimentos comerciais seriam considerados como quebra de decoro ou, pelo menos, conflito de interesses. Mesmo que esta participação ostensiva como garotos-propaganda não seja remunerada e faça parte da grande cruzada pela responsabilidade social.

No Brasil, tais deslizes não chamam a atenção e as comissões de ética do Congresso jamais ousarão discutir o assunto. Ao contrário, dezenas de senadores e centenas de deputados – e não apenas do partido do governo – gostariam de estrelar qualquer mensagem da Globo. Inclusive no Big Brother.