Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Gestão coletiva de direitos autorais

A legislação brasileira de proteção aos direitos autorais tem um papel importante na economia da cultura, mas necessita mudanças. Em uma nova configuração, o Estado precisa estar mais atuante do que o setor privado na gerência da matéria. O advogado Marco Tulio De Rose, entrevistado deste e-Fórum, especialista no assunto, acredita na gestão coletiva e estatal sobre os direitos autorais e observa que cabe aos juristas encontrar uma forma de tornar mais efetiva e simples a proteção econômica da lei em relação ao autor. Marco Tulio De Rose, jurista há três décadas, atua em Porto Alegre, RS.

A internet estabeleceu novas possibilidades de relação entre o público e o autor de uma obra intelectual ou artística, transformando de forma definitiva a relação entre todos os que compõem essa cadeia. Se, por um lado, é possível tornar-se conhecido do público muito mais facilmente por meio da rede mundial de computadores, por outro lado, resguardar os direitos do autor sobre sua obra tornou-se um desafio nesse meio. A preocupação é global.

No Brasil, o Ministério da Cultura realiza, até o dia 31 de agosto, uma consulta pública para a modernização da Lei de Direito Autoral (Lei 9.610/98). Que regras devem mudar?

Como resguardar o direito autoral

A Lei Brasileira do Direito Autoral vai mudar. Quais os pontos mais críticos dessa lei hoje?

Marco Tulio De Rose – O primeiro ponto é a necessidade de regular, de forma mais explícita, os direitos do autor e os direitos conexos na mídia eletrônica. A matéria é extremamente complexa, onde se entrechocam valores igualmente relevantes. O segundo ponto é como garantir ao autor uma efetiva proteção, e a lei está longe de apontar qual é o caminho adequado. E o terceiro são os prazos excessivos para que a obra caia no domínio público.

Até que ponto é possível resguardar direito autoral no mundo digital?

M.T.D.R. – Num mundo em que a coletivização está por baixo, impô-la ao direito autoral é irrealismo. Trata-se de propriedade privada, mas deve ser concebida como hoje se concebe, este instituto, subordinado à função social.

Acho que mais o Estado, ou seja, entidades governamentais, e menos as entidades privadas, paradoxalmente, podem ser a solução. Quem quiser utilizar economicamente o trabalho intelectual, por via eletrônica, paga uma taxa e fica com este direito por um tempo relativamente curto, oportunidade em que negocia a continuidade da exploração. Penso que esta ideia, devidamente burilada, talvez atendesse o resguardo ao direito autoral.

Com as novas tecnologias voltamos a um tipo de indústria primitiva, da relação direta do autor com o seu consumidor. Como pensar um modelo de gestão coletiva que facilite o licenciamento massivo de conteúdos?

M.T.D.R. – Quando o autor disponibiliza sua obra em meio eletrônico, sem resguardo, penso que está abrindo mão dos direitos patrimoniais dela decorrentes. No entanto, poderia ser feita uma declaração de reserva quanto aos limites da renúncia. Algo assim como acontece na disciplina dos common rights que, neste caso, deveriam ir para a lei (libero, mas não para fins comerciais). Creio na gestão coletiva (e estatal) da matéria. Penso que os common rights devem ser introduzidos na LDA (ver Creative Commons).

As outras hipóteses, para mim, devem continuar sob proteção econômica da lei em relação ao autor, cabendo aos juristas encontrar uma forma de tornar isto mais efetivo e, portanto, mais simples. Algo muito polêmico é a reprodução reprográfica. Se for como hoje, proibida, e se esta proibição for efetiva, fecham-se as pós-graduações do país. No entanto, ficar sem qualquer remuneração também é difícil. Precisa-se uma solução de compromisso.

Estão ultrapassadas as atribuições do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), vinculadas ao monopólio do Direito Autoral?

M.T.D.R. – Os Ecads, na minha opinião, estão ultrapassados por sua pouca eficiência. Historicamente, os autores nunca assumiram a gestão dos seus negócios. Acho que aqui cabe uma agência estatal que faça o papel destas pessoas jurídicas. Sei que o assunto é polêmico, mas mantenho a ideia. A matéria aponta para inegáveis funções do Estado e, portanto, como algo estatal deve ser tratado.

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Da Redação FNDC