Os reflexos dos cinco anos do atual senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) à frente do Ministério das Comunicações (1985-1990) ainda são nítidos no estado da Bahia, onde 32 políticos em exercício de mandato – de vereadores a senadores – são sócios de 41 emissoras de rádio ou TV. Outros 10 são parentes dos sócios de 24 emissoras. E é o partido de ACM que domina o cenário: 28 emissoras estão sob controle direto de sócios-proprietários, sem contar as filiadas à Rede Bahia.
O mapa da relação entre políticos e radiodifusão na Bahia foi detalhado em reportagem publicada segunda-feira [26/12] no jornal A Tarde, de Salvador. A matéria repercute localmente a representação movida pelo Instituto pelo Desenvolvimento do Jornalismo (ProJor), que mantém este Observatório da Imprensa [ver a íntegra na seção Entre Aspas, nesta edição do OI].
Além dos políticos em exercício de mandatos, a apuração identificou dezenas de outras rádios e TVs de ex-políticos que continuam a exercer poder político local. Essa lista poderá renderá outra reportagem, tamanha a abrangência do mapa.
A fonte principal das informações foi o cadastro do Ministério das Comunicações. Notou-se que ele está desatualizado. Um punhado de políticos negou a sociedade. Quem enviou documentos, teve a emissora retirada da lista – caso do senador Marcelo Crivella (PL) e do deputado federal José Carlos Araújo (PFL).
Ambos constam nos recentes levantamentos de parlamentares sócios de empresas de radiodifusão realizados por James Görgen, do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, e Venício A. de Lima, da Universidade de Brasília. Os dois estudos, aliás, foram o ponto de partida para o levantamento baiano.
Consultas e exames
Alguns políticos nem quiseram falar sobre o assunto, ou pelo menos suas assessorias não demonstraram menor interesse em esclarecer o problema. É o caso dos deputados federais Fábio Souto (PFL), Pedro Irujo (PMDB), Robério Nunes (PFL) e Wanderval Lima (PL).
Em Salvador, funcionários da TV Aratu e da Rádio Sociedade dizem que Irujo vendeu as emissoras. Elas foram, portanto, retiradas da lista.
Todos os políticos procurados, sem distinção, demonstraram curiosidade por saber a fonte da informação. A maioria não sabia ser um dado público, disponível a todos no site do Ministério das Comunicações, no menu ‘Rádio e TV’ [veja aqui].
Aliás, houve até quem não se soubesse sócio de emissora: o vereador Judazio Seibel (PL) e o ex-prefeito e ex-deputado estadual Waldemiro Seibel (PTB), de Laranja da Terra (ES), donos de uma FM em Itapetinga. Foi engraçado ouvir dos dois, pai e filho, que não faziam idéia de onde era ‘Tapetinga’.
‘É bom saber que eu tenho um bem na Bahia’, comemorou Waldemiro, que mantém um programa semanal numa rádio educadora do município de Afonso Cláudio, da qual também é sócio. No seu Voz do Povo, distribui consultas médicas e exames clínicos de graça, em sorteios realizados no meio de comentários políticos. A cidade fica a 130 km da capital.
‘Não pessoas’
Afora quem não quis dar entrevista, todos os políticos citados na reportagem foram ouvidos. A maioria foi ouvida por mim; daí a conclusão: eles sabem o que estão fazendo. Sabem direitinho, aliás. Mas uns se fazem de ingênuos, outros aparentam distância da emissora e alguns adotam ares de ascéticos empresários.
E há ainda quem demonstre ter consciência e, com um discurso convincente, tentam neutralizar a crítica. O prefeito de Várzea da Roça, Wilson Brasileiro (PFL), dono de uma OM numa cidade a 12 km do município que administra, diz o seguinte: ‘Não tenho esses pruridos de ser político e ser sócio de rádio. Nunca vou usar esse mecanismo de massas. Para mim, o povo tem que ter autogestão’.
Bravo. Se todos pelo menos pensassem assim, não veríamos veículos com resquícios de autoritarismo na capital e no interior. Em emissoras da Rede Bahia, da família de ACM, por exemplo, quem é da oposição não tem voz. São, orwellianamente, ‘não-pessoas’, apagáveis da memória – se a história fosse feita só das realidades construídas por esses veículos.
Um deputado federal – que pediu off, que pena! – reconheceu que as emissoras da rede da sua família são mesmo ‘blindadas’. Mas disse não ter nada a ver com isso e, portanto, off na veia. Falha minha não ter gravado o telefonema…
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Jornalista