Na sexta-feira (13/2) comemora-se o Dia Mundial do Rádio, data instituída pela Unesco para que as pessoas possam refletir sobre a importância deste meio de comunicação. Por isso, nunca é demais lembrar que foi um brasileiro, o padre-cientista Roberto Landell de Moura, quem fez a primeira transmissão radiofônica do mundo. O italiano Guglielmo Marconi, citado como o inventor do rádio até mesmo nas escolas brasileiras, transmitiu apenas sinais de telégrafo, não a voz humana, em 1895.
Em 1894, mais de um ano antes de Marconi começar seus testes na Itália, Landell de Moura havia realizado a primeira transmissão pública de sinais entre dois aparelhos, sem fio, conforme vários registros da época. O boletim Brazil Actual (ver aqui), publicado em 1904 no Rio de Janeiro, cita uma referência feita pelo jornal americano New York Herald no dia 12 de outubro de 1902, na qual informava que o brasileiro havia conseguido reproduzir sua voz em distâncias de 8, 10 e 12 quilômetros “logo que chegou a São Paulo, em 1893”.
Em 1899, em evento intensamente divulgado, o padre gaúcho fez ouvir sua voz na Ponte das Bandeiras, em São Paulo, a partir do Colégio Santana, localizado em uma colina da Rua Voluntários da Pátria, na Zona Norte da cidade, a cerca de 3,8 quilômetros – fato registrado pelos jornais O Estado de S. Paulo, Correio Paulistano, O Commercio de São Paulo, Jornal do Brasil, A Imprensa e O Commercio do Rio de Janeiro.
“Toquem o hino nacional” – foram suas primeiras palavras. E em seguida as testemunhas ouviram o hino.
Depois de comprovar a realidade do rádio, Landell de Moura patenteou sua invenção no Brasil e, cinco anos mais tarde, em 1904, obteve também três patentes nos Estados Unidos, para o transmissor de ondas hertzianas (ou landellianas), o telégrafo sem fio e o telefone sem fio.
Suas experiências no Brasil foram prejudicadas pela falta de interesse do governo, tanto no Império quanto na República. Segundo uma de suas biografias (ver aqui), ele foi interlocutor de D. Pedro II, cientista amador, a quem explicou as leis da transmissão do som. O imperador do Brasil havia financiado os experimentos do americano Alexander Graham Bell.
Nas ondas landellianas
Entre os princípios que conduziram sua invenção, a afirmação de que todo movimento de ondas pode ser transmitido por meio físico, através da luz e mesmo na sua ausência, o levou a concluir que seria possível fazer chegar a voz e outros sinais até o interior da Terra e, a qualquer distância, para o espaço exterior. Essa tese irritou representantes da igreja católica, que promoveram um atentado dois dias depois da primeira experiência oficial com o rádio, destruindo seus equipamentos.
Acusado de estar a serviço do demônio, o cientista procurou apoio em outros países, a partir de 1900, quando seu experimento com o rádio impressionou o diplomata Percy Charles Lupton, representante do governo britânico, mas as negociações foram enterradas pela burocracia daquele país.
Foi nos Estados Unidos que ele conseguiu os registros de alguns de seus inventos. O Brazil Actual de 1904 observa que o telefone sem fio era considerado o mais importante.
O Dia Mundial do Rádio não pode ser comemorado sem uma referência ao padre Roberto Landell de Moura. Seu reconhecimento pelo governo do Brasil demorou mais de um século: em janeiro de 2011, os Correios lançaram selo e carimbo comemorativos dos 150 anos de seu nascimento e seu nome foi inscrito no Livro dos Heróis da Pátria em 27 de abril de 2012, após uma intensa campanha mobilizada pelo jornalista Eduardo Ribeiro.
O milagre do rádio permite que bilhões de pessoas em todo o mundo ouçam música, recebam informações e, ironicamente, ouçam pregações religiosas inspiradas pelo mesmo padrão obscurantista que insuflou os fanáticos a destruir mais de uma vez os aparelhos do inventor Landell de Moura.
A mensagem radiofônica pode entreter, embalar, inspirar, mas também pode causar estragos. Que se lembrem disso todos que têm diante de si um microfone e emprestam sua voz para o mister de servir o ouvinte.
Neste estreito espaço de ondas landellianas, propomos um olhar crítico sobre a realidade mediada, porque sabemos que, com os olhos e ouvidos atentos, você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito.