Copyright Folha de S.Paulo, 29/4/2007
A Igreja Católica caminha para implantar sua terceira emissora nacional, a partir da TV Aparecida. Em pouco mais de uma década, numa reação ao avanço das igrejas evangélicas, surgiram duas redes de televisão católicas com cobertura nacional em sinal aberto -Rede Vida e Canção Nova- e várias emissoras locais e regionais.
A velocidade de crescimento da Igreja Católica, na área televisiva, só tem similar com o da Igreja Universal, do bispo Edir Macedo, nos anos 90, embora os investimentos da Universal em emissoras seja muito maior.
A Universal tem 22 emissoras geradoras, sendo 19 da Rede Record, que disputa o segundo lugar entre as redes comerciais com o SBT. Já a Igreja Católica tem 12 emissoras em funcionamento, mas ao menos mais 14 concessões já autorizadas pelo governo, a serem implantadas.
Até a inauguração da Rede Vida, em 1995, a Igreja Católica tinha só uma emissora, a Sudoeste, no interior do Paraná, da Ordem dos Frades Menores. Na época, a igreja priorizava rádios. Em 1998, entraram no ar a primeira geradora da TV Canção Nova (hoje são quatro) e a TV Horizonte, da Arquidiocese de Belo Horizonte.
Um ano depois, surgiu a TV Século 21. Em 2002, a TV Nazaré, da Arquidiocese de Belém (PA), à qual se seguiram a TV Educar (Ponte Nova-MG, em 2003) e a TV Imaculada Conceição (Campo Grande-MS, em 2004). Em 2005, foi lançada a TV Aparecida, com a pretensão de ter cobertura nacional.
Levantamento feito pela Folha mostra que a igreja reagiu de forma desordenada. Na ânsia por espaço, aluga canais de terceiros e usa sua influência com o governo para obter TVs educativas, cujas concessões são distribuídas gratuitamente.
O resultado é uma superposição de meios e gastos e uma programação pouco atrativa, de conteúdo muito religioso e deslocado da realidade. A maioria das concessões é de caráter educativo, mas há emissoras comerciais (Rede Vida, TV Sudoeste e Canção Nova de Sergipe) e um tipo misto de TV aberta com TV paga (TV Horizonte e Canção Nova de São Paulo).
As emissoras estão registradas em nome de fundações dirigidas por religiosos e de pessoas físicas. A concessão da Rede Vida é da família do empresário João Monteiro Barros Filho, de São José do Rio Preto, que a obteve do ex-ministro das Comunicações Antonio Carlos Magalhães, no fim do governo Sarney (1985-90).
Ele propôs à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil criar um canal católico nacional. A CNBB usou sua influência para obter mais de 400 outorgas de retransmissão para a emissora, no primeiro governo Fernando Henrique (1995-98).
As dioceses financiaram a implantação das retransmissoras. Na época, estimou-se o custo de implantação da Rede Vida em US$ 100 milhões. Metade de suas 431 retransmissoras ainda é mantida por dioceses.
Descentralização
A igreja não tem informação sobre o patrimônio das emissoras. Elas pertencem a grupos que têm autonomia, e a CNBB não interfere nas decisões.
Segundo o diretor da TV Aparecida, padre César Moreira, a proliferação de emissoras acontece porque a igreja ”tem vários rostos’ e cada um segue um modelo teológico. A Rede Canção Nova e a TV Século 21 representam o Movimento da Renovação Carismática.
Para o arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira Azevedo, a Rede Vida ”deu uma resposta, mas não a resposta toda’, e as novas emissoras refletem a necessidade de regionalização da programação.
A TV Educar, de Ponte Nova (MG), confirma o fenômeno. Nasceu por iniciativa dos padres salesianos, que querem implantar uma rede de 14 emissoras educativas em Minas.
Custos
A TV Aparecida diz custar R$ 1,5 milhão por mês. Tem 200 empregados e dez retransmissoras que levam seus sinais a São Paulo e ao Rio, entre outras cidades. Para crescer, alugou do grupo OESP (que edita o jornal ‘O Estado de S. Paulo’), retransmissoras em São Paulo e no Maranhão, por dois anos.
Padre Cesar Moreira, da TV Aparecida, diz estar em negociação para entrar em mais 12 capitais. A emissora é financiada pelo Santuário de Aparecida e por publicidade. A Rede Vida diz gastar R$ 3 milhões por mês. Barros Filho sustenta que os gastos são cobertos com a venda de anúncios e de espaço na grade. As dioceses pagam para divulgar seus programas.
A TV Horizonte diz ter despesa mensal de R$ 400 mil, que seria coberta com publicidade. A Canção Nova e a TV Imaculada Conceição (vinculada à Fundação Padre Kolbe) não veiculam publicidade. Segundo a direção das emissoras, mantêm-se com a doação de fiéis.
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Canal da Fé: ‘Somos a tv da boa notícia’, afirma emissora Rede Vida
Copyright Folha de S.Paulo, 29/4/2007
A Rede Vida não está interessada em invasões do MST, rebeliões em presídios, corrupção de políticos ou assuntos considerados quentes pelo restante da mídia. ‘Somos a TV da boa notícia’, diz o presidente da emissora, João Monteiro Barros Filho. A grande prioridade é a religião. Na última sexta-feira, por exemplo, estavam programados oito terços, duas missas e vários programas de reflexão religiosa de três padres, entre eles, o ‘Momento de Fé’, do Padre Marcelo Rossi. O principal noticiário é o JCTV, sobre fatos da igreja no Brasil e no exterior, em três edições diárias. A sacada atual de marketing da Rede Vida é o mote ”Brasil mais Bento’, em referência à visita do Papa.
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De cada 20 rádios, uma pertence aos católicos
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Pelo menos uma de cada 20 emissoras existentes no Brasil pertence à Igreja Católica, que continua crescendo neste segmento. A RCR (Rede Católica de Rádios) reúne 215 concessões de rádios FM, AM, ondas curtas e ondas tropicais.
O número corresponde a 5% do total de rádios em funcionamento no país (4.546), de acordo com os dados oficiais da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
O poder dos católicos nesse segmento não tem paralelo nas outras igrejas. Grande parte das concessões de rádio da Igreja Católica foi dada pelo governo nas décadas de 50 e 60, para incentivar projetos de educação à distância, o que explica a existência de 18 rádios com o nome de Educadora.
Ela ocupa também espaço entre as rádios comunitárias. Criou a Ancarc (Associação Nacional Católica de Rádios Comunitárias) que orienta grupos de católicos no encaminhamento dos pedidos ao Ministério das Comunicações.
Segundo o presidente da entidade, padre José Donizetti do Amaral, as emissoras ligadas à igreja somam 1.200, o que representa 43% do total de 2.792 rádios comunitárias autorizadas. O padre Antonio Pinelli, presidente da Unda Brasil, que coordena as emissoras católicas comerciais, diz que ”o rádio é o meio de comunicação mais rápido e objetivo, porque não é preciso parar o que se está fazendo para ouvi-lo’.
Segundo Pinelli, as rádios católicas continuam em expansão. Ele calcula que haja pelo menos mais 30, de concessões recentes outorgadas pelo governo, que estão no ar, mas ainda não fazem parte da RCR.
A migração das emissoras de rádio da tecnologia analógica para a digital é vista como um grande desafio para a igreja, em razão dos custos. Pinelli calcula que o custo, por emissora, será de, no mínimo, R$ 150 mil, o que implicaria um gasto total superior a R$ 30 milhões.
As rádios comerciais da igreja são registradas em nome de padres e bispos. É o caso da rádio Voz do Vale, em Fartura (SP), que está em nome dos padres José Aparecido Hergesse e Osman Procópio da Silva. O pároco de Fartura, José Sérgio Lima, administrador da rádio, veta músicas que considera ”profanas’. Ele diz que a rádio depende financeiramente da publicidade, mas só aceita anúncios que não conflitem com a igreja. Anúncio de preservativo, por exemplo, são vetados.
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TV católica fez 1ª transmissão em cores em 1972
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A primeira transmissão externa em cores da TV brasileira foi feita por uma emissora católica, a Difusora, de Porto Alegre, dos freis capuchinhos, que funcionou até 1980. Em fevereiro de 1972, ela mostrou o então presidente general Emilio Garrastazu Médici na Festa da Uva, em Caxias do Sul, em cores.
‘A igreja demorou a entender a importância do cinema e da TV’ , diz o frei Isaias Borghetti, que dirigiu a TV Difusora. Para ele, um dos motivos do naufrágio da Difusora foi por ela não ter se filiado a nenhuma da redes nacionais de TV em formação. Sozinha, ficou difícil sobreviver. Atolada em dívidas, a emissora foi vendida à Bandeirantes, em 1980.
Os capuchinhos do Rio Grande do Sul se voltaram, então, para as rádios. Eles têm sete emissoras AM e seis FM no Estado, e mais duas concessões de FM esperam licitações do Ministério das Comunicações.