Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Iniciativa segue sem apoio do governo

Continuam sem definição os rumos da Conferência Nacional de Comunicação. O adiamento do evento convocado pelo ministro das Comunicações Hélio Costa, chamado de ‘conferência preparatória’ (antes disso havia sido nomeado de ‘conferência’, ‘congresso’ e ‘seminário internacional’), marcado anteriormente para os dias 14, 15 e 16 de agosto, assim como a indefinição dos diversos atores do governo sobre o tema, ainda geram dúvidas nos movimentos que defendem a democratização das comunicações sobre a real intenção do governo federal em realizar uma Conferência ampla e democrática, nos moldes das iniciativas já realizadas em outros setores. O adiamento foi justificado pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara (CCTCI) – parceira do evento – por problemas de ‘agenda e logística’. A ‘conferência preparatória’, que segundo assessores da CCTCI está prevista para ocorrer em setembro, teria ainda como organizadores a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação, Inovação e Informática do Senado e a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações.

O princípio da polêmica foi a proposta do ministro Hélio Costa de uma Conferência Nacional que, segundo um deputado federal envolvido nos preparativos do evento, deveria definir ‘o marco regulatório das comunicações’. Diferentemente da ocasião em que se precipitou na definição do caráter da nova TV pública nacional e foi imediatamente desautorizado, o ministro agora conta com a conivência de outros setores do governo. O ministro Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) defende que o Ministério das Comunicações (Minicom) tem legitimidade para tratar o evento da maneira que quiser, revelando que a Conferência, que não vinha sendo tratada como política de governo, pode contar com o apoio da Secom, apesar de ainda não haver total convergência dentro do governo sobre a questão.

Por enquanto, o que existe de concreto a respeito é que não há intenção do Minicom em fazer um processo representativo, com etapas municipais e estaduais. ‘Uma iniciativa tomada por um órgão do governo que tem pouca relação com atores da sociedade que militam na área é preocupante e pode atrapalhar muito os processos democráticos’, afirmou à Agência Brasil a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), da CCTCI da Câmara. A realização do Encontro Nacional de Comunicação, iniciativa da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara e da própria CCTCI, em junho passado, parecia ser um indício importante de que haveria engajamento suficiente dos parlamentares e do governo para a realização de uma Conferência ampla e democrática.

No entanto, segundo Bráulio Ribeiro, do Intervozes, a iniciativa do Minicom foi uma tentativa de conter o movimento. ‘O anúncio do evento do Hélio Costa se deu depois da articulação da sociedade civil e da Câmara, que culminou no Encontro Nacional de Comunicação e que foi muito positivo. A proposta do ministro das Comunicações é uma tentativa de abafar o processo que vínhamos construindo. Para nós [da Comissão Pró-Conferência], essa iniciativa é um disparate. Por que chamar de conferência se, na verdade, não passa de um grande seminário sem espaço de discussão, sem plenárias nem propostas. Não tem espaço de deliberação e, portanto, não se sustenta enquanto uma conferência’, afirma Ribeiro.

A Comissão Pró-Conferência Nacional reúne, entre outras, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o Intervozes, a Campanha pela Ética na TV e a CUT. Para Rosane Bertotti, secretária de comunicação da CUT nacional e integrante da comissão, ‘essa conferência do Hélio Costa é uma espécie de ‘desencargo de consciência’. O que ele quer é sair por cima como alguém democrático, tudo o que ele nunca foi. É claro que será garantida a presença de todos os setores, mas apenas para legitimar sua política. O processo, para Hélio Costa, não é importante’.

Possibilidades

Rosane Bertotti explica que a estratégia da Comissão Pró-Conferência deve se pautar em duas prioridades, uma através da pressão ao governo e outra em relação à própria sociedade. No primeiro caso, ainda há alguma expectativa de que as contradições internas do governo possam se resolver a favor do movimento. ‘Existem várias posições dentro do governo Lula. Acho que esse adiamento sugere que Hélio Costa não tem força política dentro do governo e precisa ganhar tempo. Por outro lado, é um ministro que tem sua representatividade. Outros setores não estão no embate por saber disso’, afirma.

Dentro do governo, portanto, o foco de interlocução que ainda existe é o ministro Luiz Dulci, da Secretaria Geral da Presidência, o que não quer dizer que, necessariamente, haverá uma interferência favorável, pois a Secretaria ainda não tem uma posição sobre o assunto e está ‘analisando’ a proposta dos movimentos e organizações da sociedade civil. A reportagem procurou a Secretaria Geral da Presidência, mas, segundo sua assessoria de imprensa, o ministro Dulci não tem subsídios suficientes para comentar o assunto. De qualquer forma, enquanto o governo patina e o ministro Hélio Costa impõe a vontade dos grandes grupos de radiodifusão, a indagação dos movimentos sociais persiste: existe vontade política do governo em realizar uma autêntica Conferência Nacional de Comunicações?

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Do Observatório do Direito à Comunicação