Criar mecanismos para integrar a sociedade civil organizada à produção de conteúdo informativo veiculado diariamente pelos meios de comunicação de massa, infelizmente transformou-se em um complexo desafio encarado por entusiastas de tal ideal.
Em cidades interioranas, nas quais a efetiva participação popular nas pautas direcionadas à elaboração de matérias jornalísticas se dá sob uma visão otimista, através de cartas ou diálogos com o proprietário do media, em um encontro informal pelas ruas daquele pequeno município, a realização de conferências municipais e regionais de comunicação dá o sublime passo para o debate sobre os conteúdos veiculados por jornais, rádios e emissoras de televisão locais.
Não é novidade que uma considerável parcela dos veículos de comunicação que compõem a atual mídia brasileira manipula informações públicas disseminadas à população em função de escusos interesses pessoais, como expõe, com maestria, Perseu Abramo em Significado Político da Manipulação na Grande Imprensa:
‘Uma das principais características do jornalismo no Brasil, hoje, praticado pela maioria da grande imprensa, é a manipulação da informação. O principal efeito dessa manipulação é que os órgãos de imprensa não refletem a realidade.
A maior parte do material que a imprensa oferece ao público tem algum tipo de relação com a realidade. Mas essa relação é indireta. É uma referência indireta à realidade, mas que distorce a realidade. Tudo se passa como se a imprensa se referisse à realidade apenas para apresentar outra realidade, irreal, que é a contrafação da realidade real. É uma realidade artificial, não-real, irreal, criada e desenvolvida pela Imprensa e apresentada no lugar da realidade real.
A influência no interior
A relação que existe entre a imprensa e a realidade é parecida com a que existe entre um espelho deformado e um objeto que ele aparentemente reflete: a imagem do espelho tem algo a ver com o objeto, mas não só não é o objeto como também não é a sua imagem: é a imagem de outro objeto que não corresponde ao objeto real.
Assim, o público – a sociedade – é cotidiana e sistematicamente colocado diante de uma realidade artificialmente criada pela Imprensa e que se contradiz, se contrapõe e freqüentemente se superpõe e domina a realidade real que ele vive e conhece’ (ABRAMO, Perseu, 2006).
Em cidades distantes de metrópoles, a manipulação do conteúdo divulgado pelos veículos de comunicação ganha monumentais proporções, como já expus anteriormente no artigo ‘Um caminho para o jornalismo no interior‘, publicado em abril deste ano neste Observatório:
‘Notícias influenciam as decisões políticas, sociais e morais de uma sociedade, especialmente nas cidades do interior. Em municípios com menos de 100 mil habitantes e afastados geograficamente de centros urbanos, os jornais impressos locais influenciam, nitidamente, a sociedade. `Os meios de comunicação transformam de forma fundamental a organização da vida social´’ (CORREIA, João Carlos).
Uma luz no fim do túnel
‘Infelizmente, uma considerável parcela dos `jornais de interior´ limita suas notícias ao bom e velho trinômio: política, sociedade e polícia. Editores estampam freqüentemente nas páginas de seus periódicos notícias de crimes ilustradas com grandes imagens sensacionalistas; notas sobre os bastidores da política sem a devida checagem e fotos posadas de cidadãos que pertencem à classe econômica privilegiada daquela cidade.
Grande parte dos jornalistas, seduzidos pela ascensão social, sente-se honrada em oferecer seus apurados ouvidos às confidências de políticos interessados em autopromoção para vencer as próximas eleições. Os profissionais da comunicação dispendem ainda boa parte de seu tempo a eventos nos quais integrantes da alta casta promovem fúteis badalações que são noticiadas pelas colunas sociais com fotos posadas seguidas por legendas repletas de adjetivos’ (SANTOS, Regiane, 2009).
Diante deste deprimente cenário, temos uma população local ‘amputada’ de boas informações sobre sua comunidade. Mas, após os intensos debates promovidos na I Conferência Regional de Comunicação, realizada no sábado (17/10) em São José da Lapa, município que integra a Região Metropolitana de Belo Horizonte, vejo uma luz no fim do túnel para que a população não figure como marionetes manipuladas pelas impiedosas regras ditadas por políticos e proprietários de empresas que são acatadas sem questionamentos pelos donos dos meios de comunicação local em troca de gordas verbas publicitárias.
O antigo posto de quarto poder
Uma das propostas elaboradas pelos participantes deste encontro foi a criação de conselhos municipais de comunicação. Através da implantação desta imprescindível ferramenta em cidades interioranas, a população, que seria representada neste órgão fiscalizador com poder deliberativo por atuantes membros da sociedade civil organizada, teria sua voz garantida para reivindicar pautas direcionadas ao interesse público.
Além de nortear a mídia local para a produção de matérias equivalentes à sua verdadeira realidade, os conselhos municipais de comunicação terão ainda, conforme proposta estabelecida pelo grupo, o poder de fiscalizar o conteúdo disseminado pelos media em sua cidade.
A relevante proposta, que será levada à Conferência Estadual de Comunicação, a ser realizada na primeira quinzena do próximo mês na capital mineira, certamente será aprovada e encaminhada à Conferência Nacional de Comunicação, promovida no mês subseqüente, em Brasília.
Uma vez transformados em lei federal, os conselhos municipais de comunicação terão de ser implantados em todas as cidades brasileiras, desde as metrópoles até àquelas localizadas nos rincões deste país. Caso esta lei federal vigore, nós, sociedade civil organizada, estaremos, indiretamente, promovendo qualidade de vida à nossa comunidade através do exercício de nossa cidadania ao averiguar, periodicamente, as políticas executadas pelos três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário.
A partir desta iniciativa que desponta na Região Norte Metropolitana de Belo Horizonte, teremos, enfim, a imprensa ocupando seu antigo posto de Quarto Poder, seu verdadeiro lugar que, infelizmente, tem sido relegado a segundo plano.
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Jornalista e blogueira, Pedro Leopoldo, MG