Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Leila Reis

‘Faz tempo que o noticiário da TV não estava tão pesado quanto nesta semana. A violência dos índios cintas-largas contra garimpeiros, dos presidiários do Urso Branco de Rondônia, da guerra de gangues nos morros cariocas, dos ataques sanguinários no Iraque impregnou a programação. E olha que nesse cômputo não foi incluída a exploração da violência cotidiana da metrópole pelos shows policialescos de cada tarde. A realidade tornou a TV meio deprimente.

Nesta semana, também houve uma violência que, ao contrário da mostrada nos telejornais, gerou uma euforia geral na audiência: a surra que Maria Clara (Malu Mader) deu em Laura (Cláudia Abreu). A forra do bem contra o mal estourou no Ibope com 59 pontos de média (na Grande São Paulo). Só para se ter uma idéia do sucesso, esse foi o índice do último capítulo de Mulheres Apaixonadas.

Cenas fortes sempre rendem. A morte da personagem Fernanda (por uma bala perdida) em Mulheres Apaixonadas registrou média de 56 pontos e provocou grande celeuma. Telespectadores se manifestaram contra a violência do capítulo, desnecessária e gratuita na opinião de muitos e o assunto rendeu.

O massacre de Laura, no entanto, não provocou reação alguma contra a violência. Pelo contrário, a platéia adorou a pancadaria, os hematomas, o dente quebrado e tudo mais que caiu sobre a vilã de Celebridade.

Claro que o público tem medidas diferentes para a violência, mesmo a de novela. Fernanda não era má. Tinha um passado condenável (de prostituta), mas estava na batalha por uma vida melhor para si e para a filhinha. Foi vítima da fatalidade e não da punição.

A violência contra Laura foi disciplinadora. O mérito é todo de Gilberto Braga que, ao longo de vários meses, veio urdindo a maldade da arrivista com os maiores emblemas da vilania para pintá-la como uma espécie de inimigo público número um.

Para isso, não economizou. Laura mentiu, enganou, ridicularizou, provocou demissões, incriminou inocentes, provocou suicídio, bancarrotas e, o mais irritante de tudo, gabou-se o tempo todo de cada ato. Gilberto pavimentou o caminho do ódio contra Laura com tanta competência que conseguiu uma adesão incondicional da platéia, que fechou os olhos para as falhas ou exageros, como preferirem.

Nem se desferisse uma centena de tapas a mais, Maria Clara conseguiria fazer tanto estrago no rosto da inimiga. Laura saiu tão machucada que parecia ter sido atropelada por um caminhão, isso antes de obrigar o amante a atropelá-la. (Até nesse momento a bisca não parou de armar: não queria tornar pública a vingança da heroína contra si).

A cafajestice de Laura não tem limites, mostra o autor para continuar ganhando a cumplicidade do público. Mesmo no leito do hospital, o massacre continuou. Quase todos os personagens da novela passaram pelo quarto de Laura para dar uma pisadinha. A vilã agora prova do próprio veneno sendo chantageada pela sua versão masculina, o perigoso Renato Mendes (Fábio Assunção).

Mas muitas coisas ruins ainda vão acontecer. A derrocada da moça apenas começou e vai preencher muitos capítulos. Laura vai pagar por cada maldade cometida com juros para deleite do público que, pelo menos na ficção, vê a justiça sendo feita.’



Ricardo Valladares

‘Maria Bofetão’, copyright Veja, 4/05/04

‘Na segunda-feira passada, 28 tabefes bem aplicados pela heroína Maria Clara (Malu Mader) derrubaram a ignóbil Laura (Cláudia Abreu) e levantaram a audiência de Celebridade, a novela das 8 da Globo. Enquanto a surra transcorria – e a gravação da seqüência deixou as duas atrizes com arranhões nos braços -, o folhetim registrou 63 pontos no Ibope. A média geral do capítulo foi de 58 pontos (ou seja, excelente) e repetiu-se no dia seguinte, quando o espectador descobriu que a humilhação de Laura foi ainda mais profunda, pois ela perdeu um dente em conseqüência da sova. Seria natural que episódios dramáticos como esses atraíssem a atenção do público, mas deve-se reconhecer que o autor Gilberto Braga soube conduzir a trama de maneira hábil em direção a esse clímax. Tanto a mocinha quanto a vilã ganharam nova dimensão nos últimos tempos. Maria Clara, depois de perder sua fortuna, deixou de ser apenas uma patricinha magnânima e insossa, a aborrecida Maria Chata. Ela ganhou fibra e mostrou que não tem sangue de barata. Quanto a Laura, ficou claro que sua maldade tem proporções oceânicas: continuou com suas perfídias mesmo depois de conquistar a fama e o dinheiro que almejava. Por tripudiar tanto assim sobre a inimiga, atraiu o ódio dos noveleiros. ‘A surra foi uma catarse para agradar ao público e a mim mesmo, que também torço. Não gosto de violência, mas a Laura estava merecendo’, diz o autor Gilberto Braga.

A dois meses do final da novela, a sorte de Laura começou a virar. Ela foi chantageada pelo vigarista Renato Mendes (Fábio Assunção), que descobriu que no passado ela teve envolvimento com o tráfico de drogas. Renato a obrigou a casar-se com ele e agora vai torturá-la, cercando-a de seguranças e fazendo com que viva num ‘esquema Big Brother’, vigiada por câmeras o tempo todo. Laura até será privada de seu maior passatempo – fazer sexo e às vezes, ironicamente, levar uns tapinhas do cúmplice Marcos (Márcio Garcia). Apelidada de ‘cachorra’ pelo amante, Laura, enfim, vai viver uma vida de cão. Mas ainda assim conseguirá fazer maldades. Vai esconder um rato morto na geladeira da casa de espetáculos onde Maria Clara agendou um show de Zeca Pagodinho, provocando a interdição do espaço e o cancelamento da apresentação. Segundo Gilberto Braga, contudo, não se deve esperar que, ao revidar, a personagem de Malu Mader assuma novamente a identidade de Maria Bofetão. ‘Não temos outras cenas de pugilato preparadas. E minha intuição indica que não deve haver’, afirma o autor.’



Lauro Lisboa Garcia

‘Quem é o pior ator de ‘Celebridade’?’, copyright O Estado de S. Paulo, 2/05/04

‘O elenco masculino de Celebridade deve estar se corroendo de inveja de Fábio Assunção. Pelo desempenho arrebatador do jornalista Renato Mendes, o galã loiro virou o dono do pedaço. Em pé de igualdade com a soberba Cláudia Abreu (Laura), na semana que passou ele chegou ao pico na seqüência em que a chantageia com um pedido de casamento. Enquanto isso, os reis da canastra cozinham o galo em soluções dignas das Organizações Tabajara, do Casseta & Planeta.

Belos e elegantes, Cláudia e Assunção já levam vantagem por interpretar irresistíveis vilões, tipos sempre propensos a render melhores performances.

Claro que não é só o que conta. Quem sabe usar os trunfos vira o jogo. Vai daí que a relação ingênuo-malandro dos personagens vaza para os respectivos intérpretes. Natália Thimberg e Ana Beatriz Nogueira, por mais secundárias que sejam suas trambiqueiras Yolanda e Ana Paula, dão show a cada aparição.

Do lado oposto, com aquele eterno ar de mãe de miss, Nívea Maria (a desocupada Corina) lidera o campeonato de franzimento de cenho, no qual Henri Castelli (o ripongo Hugo) está em alta posição. Taxa de humor zero.

O caso mais gritante é o de Marcos Palmeira, ex-protagonista da trama. O eterno Guma é sério candidato ao troféu Eric Marmo do ano, pelo papel do surreal Fernando Amorim, o cineasta ‘alfacinha’ na definição de Renato Mendes. A partir dele – e dos núcleos pelos quais transita -, Celebridade tem brindado os telespectadores com seqüências mais involuntariamente cômicas do que em qualquer Maria do Bairro. ‘Módidade’, ‘xivador’, ‘dendágua’: conhece esses termos? Significam maior de idade, estivador e dentro d’água no idioma palmeirês.

Com a sensualidade de um berro de bode e dicção de engole-sílabas, Palmeira parece ter entregado os pontos. Nem a volúpia de Tânia (Lavínia Vlasak) dá conta das picuinhas para lá de bocejantes de Fernando. Só falta sair pelo Andaraí de homem-sanduíche de tanto que se submete a fazer merchandising. E o que é aquele amigo Queiroz? Otávio Muller (caso típico de talento desperdiçado) não merece. Não é à toa que pediu a morte do personagem. Perto disso, até os medianos Márcio Garcia (o michê Marcos) e Taumaturgo Ferreira (o pateta Nelito) ganham ares de agentes de Shakespeare.

Mais hilariante é Bruno Gagliasso, o mosca-morta Inácio, filho do alfacinha.

Mal de família? Firme na disputa com Juliana Knust (a mártir sorridente Sandra), Sérgio Menezes (o fotógrafo multiuso Bruno) e Henri Castelli pelo troféu Cigano Igor, concedido aos aspirantes sem futuro, Gagliasso é um colecionador de pérolas. Difícil escolher em qual situação é mais risível:

1) quando treme os lábios demonstrando nervosismo; 2) quando sai de cena revoltadinho com a mãe, Beatriz (Débora Evelyn); 3) quando joga pelada no campinho do Andaraí; 4) quando chama a pistoleira Darlene (Deborah Secco) de ‘meu amor’, depois da segunda vez que vai para a cama com ela. É uma piada pronta.

Maniqueísta até a raiz, a novela deu cria a um núcleo de justiceiros, para gargalhada geral. A gangue é formada por um jeca-produtor- de- cinema- internacional, um fotógrafo descoladíssimo, um jornalista cultural super-bom-caráter, um bombeiro suburbano e um ripongo cantor de boteco.

Valentões instantâneos para derrotar os poderosos Renata e Laura. É mole? Um dos valentões da ‘cooperativa’ é Cristiano (o bebum), com o qual Alexandre Borges confirma a vocação de eterna sombra de Júlia Lemmertz (a ‘miss auto-estima zero’, no dicionário de Mendes).

Difícil definir onde fica a divisa entre o real e o fictício nessas ‘Coisinhas de Jesus’: pode tocar o ritmo que for, o passo é sempre o mesmo.

É só ver a reprise de Corpo Dourado para comparar em qual papel Marcelo Faria (Vladimir) faz o melhor muxoxo. Além disso, ele estrebucha pendurado em cordas que é uma beleza. Paulo Vilhena (Paulo César) é tão expressivo quanto o guardanapo com que limpa o balcão. Isso sem falar do núcleo dos bobos-alegres, liderado por Salvador (Roberto Bomfim), ‘o dândi do Andaraí’ (obrigado, colega Renato Mendes). Vem cá, se quase todo mundo é amigo do barbeiro, por que raios ninguém corta aqueles cabelos horrendos? Vai ver que, como Sansão, eles podem com isso perder a força interpretativa.’



Laura Mattos

‘‘Celebridade’ terá fim moralista, diz autor’, copyright Folha de S. Paulo, 2/05/04

‘O que será da malvada Laura Prudente da Costa, a vilã mais falada do país, interpretada por Cláudia Abreu em ‘Celebridade’?

Após tantas falcatruas, dará uma ‘banana’ ao Brasil, como fez o criminoso Marco Aurélio (Reginaldo Faria) na clássica cena em que foge de avião impunemente, no final de ‘Vale Tudo’ (1988)?

‘Banana para o Brasil certamente não’, responde à Folha Gilberto Braga, autor das duas novelas das oito da Globo.

‘Não ia querer repetir uma coisa que escrevi eu mesmo. Repito quando não há outro jeito, e esse não é o caso’, afirma Braga.

Para ele, o cenário brasileiro da época pedia a ‘banana’. ‘A situação é totalmente outra. Em 1988, [os autores] Aguinaldo [Silva], Leonor [Bassères] e eu queríamos fazer uma denúncia à impunidade. Agora, estou escrevendo com meus co-autores um novelão bastante fantasioso, que deverá ter um final moralista, acredito.’

Segundo o autor, o desfecho de ‘Celebridade’ ainda não foi resolvido. A novela das oito tem o último capítulo previsto para junho e será substituída por ‘Senhora do Destino’, de Aguinaldo Silva.

Doce

A primeira novela dessa fase de ‘ouro’ a terminar será a das seis, ‘Chocolate com Pimenta’, na próxima semana (a das sete, ‘Da Cor do Pecado’, acaba em agosto). Focada em comédia e romance quase infantil, a trama tirou a Globo de grave crise no horário.

No mês passado, bateu 40 pontos de média no Ibope e foi sintonizada por mais de 2 milhões de domicílios na Grande SP. São quase 800 mil a mais do que os que assistiram à antecessora, ‘Agora É que São Elas’, em abril de 2003. ‘Chocolate’ apostou na idéia de que o telespectador estava cansado da violência e queria mais ‘doçura’. Acertou.

As cenas de comédia pastelão tiveram efeito de bomba na concorrência dos violentos telejornais da tarde. O ‘Brasil Urgente’, de José Luiz Datena (Band), acabou com o ibope cortado ao meio. Dos 6,6 de média em 2003 -dados do mês de abril-, caiu para 3,2 neste ano. Perdeu a audiência de 164 mil domicílios na região metropolitana. O ‘Cidade Alerta’ (Record) passou de 6,9 para 5,9, uma queda de quase 57 mil casas.

O autor, Walcyr Carrasco, prefere não apostar em teses, mas no argumento normalmente usado pelos escritores: ‘Deu certo porque houve afinação de texto, elenco e direção. Todo mundo ‘comprou’ a idéia de uma comédia romântica, não realista, com tom de interpretação diferenciado’.

A próxima das seis, um ‘remake’ da consagrada ‘Cabocla’ (1979), seguirá a linha ‘rural’. A recriação da novela de Benedito Ruy Barbosa terá briga de coronéis e romance com desencontros. Passará também pela questão da disputa por terras. Colaborou Marcio Pinheiro, free-lance para a Folha’