Com o crescente papel que joga o “direito à comunicação” nas democracias, e com a importância que o acesso e a produção de informação tem no desenvolvimento humano, duas recomendações ecoam em documentos internacionais: de um lado, o monitoramento independente e permanente do comportamento editorial dos meios; de outro, o ensino da leitura crítica dos meios de comunicação já nas primeiras séries escolares.
O Brasil tem riqueza de experiências nas duas vertentes.
Se a imprensa é o cão de guarda que morde os calcanhares dos poderes, organizações de defesa de direitos ocupam importante espaço de leitura crítica dos meios jornalísticos. Os “observatórios” não assombram quando denunciam vícios e tendências que ameaçam o exercício ético do jornalismo, a pluralidade da informação e legitimidade de todas as vozes.
Na semana que passou duas dessas análises de mídia tocaram em temas relevantes para a qualidade do jornalismo brasileiro.
Latidos fortes
Realizado pela ONG Intervozes, o relatório “Vozes Silenciadas” acusou o uso pela imprensa de nada menos que 192 termos negativos para referir-se ao MST (o mais comum, claro, é “invasores”); pouca relevância dada às bandeiras do Movimento; e, sua exclusão como fonte de informação mesmo quando o assunto é reforma agrária.
Os resultados podem apontar para desafios de poscionamento do Movimento, mas enfatizam o quanto a maior parte dos principais meios criam (ou alimentam) uma imagem demonizada do MST.
Outra análise revela que mesmo a presença de Dilma e Marina na disputa eleitoral não foi suficiente para que a imprensa aprofundasse o debate sobre as políticas públicas voltadas para as mulheres. Dos textos analisados, publicados ao longo de todo o 2010 por 16 grandes jornais, menos de 2% as mencionam.
Os resultados desta “Análise da Cobertura da Imprensa sobre Mulheres na Política e Espaços de Poder” podem ser acessados nos sites do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero (programa da Secretaria de Políticas para Mulheres), Instituto Patricia Galvão e ANDI.
Na vertente do ensino da leitura crítica, a produção de jornais escolares são uma das mais efetivas maneiras de desenvolver desde cedo uma percepção sobre como informação e opiniões são construídas.
Uma ação de grande escala acontece em escolas públicas de 13 estados onde 790 jornais estão atualmente em produção com protagonismo de 230 mil crianças e adolescentes.
O projeto existe desde 1988 e é coordenado pela ONG Comunicação e Cultura, fruto do sonho do sociólogo argentino-brasileiro Daniel Raviollo (ver aqui).
De olho nos cães de guarda, afinal seus latidos são um quarto poder.
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[Geraldinho Vieira é jornalista]